ENTREVISTA

Rigacci destaca parcerias para internacionalização da PUC-Campinas

Reitor da universidade revela que interesse é ampliar cooperação com instituições de ensino de cinco continentes

Manuel Alves Filho/ manu.alvesfilho@uol.com.br
17/12/2023 às 10:19.
Atualizado em 17/12/2023 às 10:19

Em visita ao Correio Popular, reitor da PUC-Campinas avaliou os novos cursos e discorreu sobre projetos de ensino e pesquisa (Alessandro Torres)

A Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas) registrou importantes avanços nas áreas de ensino, pesquisa e extensão em 2023. Os programas e projetos implantados ou elaborados no período contribuirão para que a instituição esteja preparada para continuar trilhando o caminho em busca pela excelência, condição indispensável para que consiga superar os desafios impostos pelo futuro. A análise é do reitor da universidade, Germano Rigacci Júnior. Na última semana, o dirigente, que é mestre em Filosofia e doutor em Educação, visitou o Correio Popular, onde foi recebido pelo presidente-executivo do jornal, Ítalo Hamilton Barioni, e concedeu a entrevista que segue. Na oportunidade, o reitor falou sobre educação, ciência e tecnologia, internacionalização, relação com o setor produtivo e acerca do compromisso da PUC-Campinas com as camadas mais vulneráveis da população, como os moradores de rua.

Final de ano sempre é época de se fazer balanços. Nesse sentido, gostaria que o senhor fizesse uma avaliação de como foi 2023 para a PUC-Campinas.

O ano de 2023 foi importante para a universidade, porque nós avançamos em diversos aspectos. Primeiro, é importante destacar que nós tivemos um desempenho muito bom nas avaliações externas, tanto em âmbito nacional quanto internacional. Em relação à avaliação institucional, feita pelo Ministério da Educação, que ocorre a cada dez anos, nós ficamos na faixa 5, que é o maior índice. Esse é um dado importante para toda a comunidade universitária. Nós também tivemos um desempenho acima do alcançado no ano anterior, tanto no QS Internacional quanto no QS Latin America. E também tivemos uma colocação importante no ranking na Times Higher Education. Nas últimas avaliações da revista nossa instituição não havia aparecido. Tudo isso é muito significativo para a universidade e mostra a importância do trabalho que vem sendo feito.

Quanto a outras avaliações nacionais?

Fomos bem avaliados no ranking do Estadão (Guia da Faculdade do jornal O Estado de São Paulo) e também no RUF (Ranking Universitário Folha, organizado pelo jornal Folha de S. Paulo), no qual aparecemos entre as melhores universidades privadas do Brasil. Para a universidade, isso é algo marcante.

A universidade também executou diversos projetos ao longo do ano, não?

Sim, avançamos em relação a alguns projetos internos, que começam a ser instalados. O programa Mescla, por exemplo, já apresenta resultados significativos. Contamos com oito startups criadas por nossos alunos. Isso é resultado de ações internas, como os programas MOTIV.SE e CRIA. Essas empresas já estão em fase de aceleração. Também fizemos parcerias com outras empresas, na perspectiva de levar inovação para além das dependências da universidade. Estabelecemos uma parceria muito interessante com o CPQD e com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, por meio da qual apresentamos uma proposta conjunta de residência tecnológica. Fomos selecionados e o programa já começou a ser implementado no primeiro semestre deste ano. A segunda fase já está em andamento. Nós começamos outra parceria que vai permitir que inauguremos um espaço de IoT junto com um grupo de empresas que atuam na área. O espaço servirá para o desenvolvimento de pesquisa, para formação de recursos humanos e para a busca de soluções inovadoras nessa área. No começo do ano que vem, vamos inaugurar um laboratório de inteligência artificial. E vamos iniciar uma parceria com a Escola de Negócios da Universidade Nova de Lisboa. Vamos desenvolver pesquisas cooperadas nas áreas de ciências de dados e inteligência artificial. A Escola de Negócios é uma das melhores do gênero na Europa. Ela tem atuado junto à Prefeitura de Lisboa no Planejamento Urbano. A ideia é que essa parceria permita que possamos gerar conhecimento que facilite o emprego da ciência de dados tanto pelo setor público quanto pela iniciativa privada.

A questão tecnológica vai merecer cada vez mais atenção por parte da instituição, não?

Sim, no começo de 2024 vamos inaugurar o Espaço Manacás, que permitirá a imersão tecnológica para formação de professores em novas metodologias ativas e também o emprego de tecnologias e desenvolvimento de conteúdos digitais que facilitem o aprendizado de disciplinas de forma, digamos, mais amigável. A ideia é investigar como nós podemos ensinar Física e Matemática usando, por exemplo, o metaverso. Tudo isso relacionado à educação básica. Mas nós também vamos usar isso em relação à qualificação de nossos professores.

Em que estágio está o processo de internacionalização da universidade?

Essa parceria com a Universidade Nova de Lisboa dá início a uma nova fase da internacionalização da PUC-Campinas. Além disso, nós temos ampliado o trânsito de professores e estudantes com instituições estrangeiras. Nós avançamos este ano em relação ao COIL (Programa de Colaboração de Estudos Internacionais). Estamos atuando em parceria com instituições de vários países espalhados por cinco continentes, como Filipinas, Angola, Portugal, Estados Unidos, México, Colômbia, Chile e Argentina. O COIL é interessante porque, em dado momento, estudantes de uma disciplina de um determinado curso nosso se ligam aos estudantes de curso semelhante de uma universidade estrangeira e a aula acontece em conjunto, via remota. Essa é uma nova estratégia de internacionalização que não requer a mobilidade física. O programa conta com a participação de 500 estudantes.

Trata-se de uma cooperação não apenas com países centrais, mas também com nações da África, Ásia e América do Sul. Qual a importância desse tipo de relação?

Sim, essas parcerias são importantes. Temos grande interesse, por exemplo, em estabelecer parcerias com outros países africanos, como Angola, Moçambique e Cabo Verde. Esses três países têm língua portuguesa, o que facilita a cooperação. Claro que é importante que nossos estudantes e professores frequentem instituições europeias e norte-americanas, mas nosso interesse é ampliar o escopo. Estamos fazendo um caminho de aproximação com universidades chinesas. Tivemos uma primeira conversa nesse sentido e esperamos avançar com esse objetivo. Temos um projeto interno que denominamos de “Conexão Ásia”. Esse projeto já levou à abertura na universidade de um espaço para a divulgação da cultura sul-coreana. É uma iniciativa apoiada pelo consulado daquele país. É o segundo existente em São Paulo. O outro está instalado na USP. Também vamos abrir uma frente de negociação comum grupo de universidades japonesas, de modo a avançar nessa conexão com a Ásia.

Para além do campo acadêmico, como anda o diálogo entre a PUC-Campinas e o setor produtivo?

Estamos trabalhando nos últimos anos com o conceito de governança de tríplice hélice. Nesse conceito, você tem a universidade, o setor produtivo e o setor público. Os três se encontram para identificar interesses comuns. Nessa direção, fizemos uma aproximação do setor produtivo. O programa Mescla nasce desse movimento. A abertura de uma linha dentro do Mescla, que é a pesquisa aplicada, tem permitido desenvolver projetos voltados para as demandas do setor produtivo. A universidade começa a dar passos significativos nessa direção. Nós criamos um conselho de empresários, com 27 integrantes. Na última reunião foram apresentadas sugestões de como melhorar a formação voltada para as demandas produtivas e de como captar recursos para novos projetos. Nessa perspectiva, já começamos a trabalhar dois projetos. Um é oferecer uma disciplina de empreendedorismo em todos os cursos da universidade. O outro segue na linha de fazer a aproximação de alguns eixos de pesquisa da universidade. Vamos apresentar essas duas propostas na reunião agendada para março.

Dentro desse contexto, a universidade criou novos cursos, não?

Nós construímos este ano, em parceria com o IAC (Instituto Agronômico de Campinas), o curso de Engenharia Agronômica. É um curso que oferecerá aos alunos a oportunidade de desenvolver parte da formação nos laboratórios e com os especialistas do IAC, o que dará um sentido diferente para a formação desses jovens. O Instituto tem 136 anos de história e detém uma memória genética extraordinária. Penso que essa iniciativa também vai ressignificar a importância do IAC. Já estamos com a primeira turma matriculada. As aulas começam agora em 2024. Também lançamos o curso de Engenharia de Alimentos, este em parceria com o Ital (Instituto de Tecnologia de Alimentos), muito semelhante com o que fizemos com o IAC. E também lançamos um curso de cibersegurança, que será o segundo no Brasil. É um curso muito bem desenhado, que terá início também no começo do próximo ano.

Germano Rigacci Júnior à frente dos retratos de Papa Franciso (à esquerda) e Dom João Inácio Müller, arcebispo metropolitano de Campinas e grão-chanceler da universidade (Divulgação/ PUC-Campinas)

Um curso recente da PUC-Campinas é o de Gastronomia. Que avaliação o senhor faz do primeiro ano de atividade?

O curso está indo muito bem. A estrutura é muito boa. Este ano nós oferecemos um curso em parceria com a Ceasa voltado para 20 senhoras. As alunas são moradoras do Parque Shalon, na divisa de Campinas com Hortolândia. Elas ficaram muito felizes com a oportunidade de estudar na universidade. Elas aprenderam técnicas de panificação e confeitaria. É um curso que dá condições para elas iniciarem um negócio que possa garantir renda para suas famílias. Foi emocionante. Uma ação social que está dentro do contexto do Hub Gastronômico. Também estamos buscando parceria com empresas, na perspectiva de oferecermos mais cursos. Queremos oferecer trilhas de formação em alguns nichos na área de gastronomia e cursos de curta duração, como cozinha francesa e italiana.

A PUC-Campinas de hoje é muito diferente daquela de 10 ou 20 anos atrás. O perfil do estudante também mudou com o decorrer do tempo?

O perfil dos nossos alunos é bem diversificado do ponto de visto socioeconômico. Vejo que os estudantes da PUC estão interessados em uma instituição que está se renovando, não somente do ponto de vista da estrutura física, mas também do ponto de vista dos projetos pedagógicos. A universidade está avançando também nesse aspecto. Nos últimos dois anos, nós fizemos a reforma de quase todos os projetos pedagógicos. O foco foi pensar a formação por competência. Isso traz perspectivas diferentes para a formação. Ou seja, o estudante vem em busca de uma universidade de excelência e é isso que proporcionamos a ele.

Quais são os números da PUC-Campinas em termos de cursos e estudantes?

Nós temos aproximadamente 15 mil alunos, distribuídos por 65 cursos de graduação. Também temos cerca de 50 cursos de educação continuada (MBA e especialização) e algumas centenas de cursos rápidos, também de educação continuada. Na pós-graduação stricto sensu, nós recebemos recentemente autorização para oferecer o doutorado em Ciência da Religião. E também vamos oferecer doutorado em Ciências da Saúde.

A Prefeitura deve realizar amanhã, segunda-feira, a sanção do projeto que cria o Polo de Inovação e Desenvolvimento Sustentável (PIDS). Como o senhor analisa o projeto, que contribuirá para a criação do Hub Internacional para o Desenvolvimento Sustentável (HIDS), do qual a PUC-Campinas é integrante?

O PIDS resulta da proposta do HIDS, do qual a PUC participa desde 2018. O polo compreende cerca de 12 milhões de metros quadrados. O HIDS está sustentado nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela ONU. A ideia é promover a articulação do ecossistema de pesquisa, inovação e empreendedorismo que nós temos naquela área. A Prefeitura, especialmente na atual gestão, se envolveu intensamente nesse projeto. Sob o patrocínio do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), foi feito um masterplan por um escritório coreano, que também é inspirador para o PIDS. É a oportunidade que Campinas terá, com essa legislação, de garantir segurança jurídica para a efetivação das propostas na perspectiva do HIDS naquela área. Esse ecossistema vai fazer com que Campinas recupere essa identidade de cidade inovadora, de geração de conhecimento avançado. Além disso, o PIDS dará condições para que tenhamos novas diretrizes viárias e urbanísticas para aquela área. Isso dará oportunidade para que Campinas se destaque no Brasil e no exterior.

O HIDS pode ser considerado um elemento consolidador de uma cultura de trabalho cooperado em relação às atividades de pesquisa e inovação?

Olha, nós temos trabalhado de forma cooperativa na construção da proposta do HIDS. O relacionamento entre os dirigentes das instituições envolvidas é ótimo. Há o entendimento de que é preciso fazer a articulação desse ecossistema em Campinas. Sem isso, cada um fica atuando isoladamente. Agora, precisamos caminhar na direção da concretização das propostas. A Prefeitura, e especialmente a secretária Adriana Flosi, está muito empenhada em contribuir para esse objetivo. Esse é um projeto para a cidade e não para as entidades. E há outros agentes que estão se aproximando. Os proprietários de terras, por exemplo, estão percebendo que é possível desenvolver projetos imobiliários rentáveis naquela área.

São 65 cursos de graduação que contam com, aproximadamente, 15 mil alunos; PUC-Campinas também dispõe de cursos de educação continuada e, recentemente, recebeu a autorização paa oferecer doutorado em Ciência da Religião (Divulgação/ PUC-Campinas)

Na última semana, foi divulgado o resultado do Pisa. Os dados são dramáticos. Mais da metade dos estudantes do ensino médio não tem bom nível de compreensão em Matemática e Ciências. Como a PUC-Campinas tem trabalhado os seus cursos de Licenciatura, de modo a formar bons professores?

É importante destacar que somos, fora as universidades públicas, a única instituição privada a oferecer cursos de Licenciatura. Nosso esforço é sempre para formar professores de qualidade. Mas o que está acontecendo é que não tem mais jovem querendo ser professor. Tem curso de Licenciatura que não tem número de candidato suficiente para montar uma turma. Alguém há de perguntar, não tem bolsa de estudo? Tem. O ProUni, por exemplo, dá 100%. O que não temos é jovens interessados em serem professores. O problema central é prestigiar a docência, não apenas em termos salariais, mas também em função da importância do ofício para o país. Penso que esta é uma discussão que precisa ocorrer em âmbito federativo e que vai exigir uma grande concertação nacional.

Temos alguma novidade em relação ao Solar do Barão de Itapura, popularmente conhecido como Pátio dos Leões?

Nós fomos cadastrados recentemente no Pronac (Programa Nacional de Apoio à Cultura). Nós temos dois anos para fazer a captação de recursos para financiar o projeto de restauração do imóvel. Vamos trabalhar forte nesse sentido no próximo ano. Depois de restaurado, o solar receberá o Museu da Universidade e o Museu Arquidiocesano. Também temos planos para desenvolver no local oficinas culturais, na medida do possível gratuitas, em parceria com a Prefeitura.

É um projeto que é complementar ao plano da Prefeitura de requalificar a região central...

Sim, penso que vai ajudar a recuperar o Centro que está muito degradado.

Há uma questão social relacionada ao Centro, que é a população de rua...

A PUC vai desenvolver no ano que vem um projeto voltado para as pessoas em situação de rua. Trata-se de um problema complexo, que merece atenção. A ideia é trazer alunos dos cursos de Psicologia, Serviço Social e Direito para dar algum nível de atendimento a essas pessoas. Tem gente que vai para a rua e, depois de alguns dias, é roubado. Perde os documentos e, com isso, perde a identidade. Se ele for de outra cidade, sequer conseguirá comprar uma passagem de ônibus sem um documento. Vamos ver no que podemos ajudar, oferecendo orientações por parte da nossa equipe. Não vamos resolver o problema, mas estamos dispostos a ajudar no que for possível. Esse não é um problema de Campinas ou do Brasil. É um problema mundial.

O senhor tem mais dois anos de mandato pela frente. Como o senhor espera entregar a instituição ao seu sucessor?

Além dos projetos que já mencionei, nós estamos fazendo uma reforma administrativa. Avançamos muito este ano, executando a primeira e a segunda fase. Estamos implementando uma cultura de compromisso de meta e resultado. É um processo em construção. Penso em entregar a PUC preparada para o futuro.

Dentro da missão de uma instituição confessional, não é?

O papa Francisco recebeu este ano os reitores da América Latina. Antes, participei de uma conferência com o cardeal Tolenino (José Tolentino de Mendonça) e com o cardeal Vicencio Paglia, que lançaram um manifesto mundial que estimula as universidades a pensar a inteligência artificial numa perspectiva ética. Nós assinamos esse documento. Nós também avançamos em relação à nossa missão com a inauguração do Centro de Estudos Africanos e Afro-brasileiros. É um espaço que construímos conjuntamente com a comunidade negra de Campinas. Em 2024, vamos desenvolver estudos e pesquisas nessa área. Importante destacar também as atividades desenvolvidas pelo Vitalità (Centro de Envelhecimento e Longevidade) destinadas às pessoas da terceira idade. Isso tudo vai ao encontro da nossa missão. Além disso, vamos colocar em operação em 2024 o Laboratório Nacional para o Desenvolvimento Sustentável (Lands), que vai envolver outras instituições e universidades. Vamos discutir economia circular, economia verde, carbono zero e outros temas, que são importantes tanto do ponto de vista científico quanto pedagógico. Tudo isso somente é possível porque temos o estímulo do nosso grão-chanceler, o arcebispo metropolitano Dom João Inácio Müller.

Ao final do mandato, o senhor volta à sala de aula?

Sim, volto a dar aulas.

Qual o seu hobby?

Música e leitura estão entre as minhas preferências.

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Anuncie
(19) 3736-3085
comercial@rac.com.br
Fale Conosco
(19) 3772-8000
Central do Assinante
(19) 3736-3200
WhatsApp
(19) 9 9998-9902
Correio Popular© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por