O montante transferido aos municípios, referente à quota-parte a quem têm direito, foi de R$ 5,372 bilhões, apenas R$ 8,34 milhões a mais que em 2022
Os repasses da quota-parte dos impostos estaduais aos municípios não foram maiores porque a indústria, setor que paga a maior fatia dos tributos, permaneceu praticamente estagnada no ano passado (Divulgação)
A Região Metropolitana de Campinas (RMC) registrou em 2023, pelo segundo ano consecutivo, recorde no recebimento de repasses da quota-parte dos impostos estaduais, totalizando R$ 5,372 bilhões. O valor superou em R$ 8,34 milhões as transferências feitas ano anterior, o que representou uma alta tímida de 0,15% em comparação aos R$ 5,36 bilhões de 2022, indicando uma estabilidade, de acordo com levantamento feito pelo Correio Popular com base em dados divulgados pela Secretaria Estadual da Fazenda e Planejamento.
Os repasses feitos para as cidades representam a quotaparte a que têm direito nos impostos sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), Produtos Industrializados (IPI) de itens exportados e Compensação Financeira sobre Exploração de Gás, Óleo Bruto e Xisto Betuminoso. Para o economista Felipe Salto, o recorde tem o aspecto positivo dos repasses terem ficando no azul, mas acendeu um alerta sobre o desempenho da atividade econômica por não acompanhar nem mesmo a evolução da inflação no passado, que até novembro último estava acumulada em 4,68%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
"O resultado não acarretou aumento na arrecadação porque a indústria, setor que paga a maior fatia dos impostos, permaneceu estagnada", disse o economista. Como esse segmento é a principal atividade econômica da RMC, as dificuldades enfrentadas tiveram reflexo nas contas e no desempenho. O Produto Interno Bruto (PIB) do Estado de São Paulo, que é a soma de todos os bens e serviços finais produzidos em uma determinada região, recuou 0,2% no terceiro trimestre de 2023 na comparação com o trimestre anterior, já descontados os efeitos sazonais, de acordo com estudo da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade).
A indústria registrou estabilidade (0,0%) e houve retração nos setores de serviços (-0,3%) e agropecuária (-1,4%). O resultado de julho a setembro passados fez a Seade reduzir as projeções do PIB paulista em 2023, estimando uma alta mínima de 0,9% e máxima de 1,8%. Antes, a estimativa era de crescimento do Produto Interno Bruto nacional entre 2% e 2,7%. Segundo a fundação, o resultado paulista positivo será garantido porque o desempenho nos meses anteriores foi melhor.
A taxa anual (últimos 12 meses) mostrou alta de 1,6% do PIB e todos os setores registraram crescimento. O resultado foi puxado principalmente pelo aumento de 2,3% dos serviços, enquanto a agropecuária registrou alta de 1,4% e a indústria, 0,6%. Para a Seade, o segmento que liderou o crescimento não conseguiu manter o fôlego. "Essa acomodação da demanda, pode-se dizer, tem se agravado com as taxas de juros elevadas, especialmente nos segmentos mais dependentes de crédito, como passagens aéreas, hotelaria e procedimentos estéticos", analisou a fundação.
Entre os 20 municípios da RMC, Holambra foi, proporcionalmente, o que apresentou o maior crescimento no recebimento de repasses de quota-parte dos impostos estaduais, refletindo a evolução do PIB paulista. A alta em 2023 foi de 7,1%. A cidade, que tem cerca de cerca de 15 mil habitantes, recebeu transferências que somaram R$ 38,69 milhões. No ano anterior, o valor foi de R$ 36,12 milhões. O PIB do município é de aproximadamente R$ 1,5 bilhão, com 38,6% sendo gerados pela agropecuária, enquanto os serviços têm participação de 37,8% e a indústria, 17,3%.
Já Sumaré, que tem uma economia fortemente baseada em serviços e indústrias, sofreu a maior queda na transferência de tributos, 8,72%. A cidade recebeu no ano passado R$ 305,21 milhões, contra R$ 334,35 milhões de 2022. Os serviços representam em torno de 54,2% da atividade econômica local, com o setor industrial aparecendo em segundo lugar (34,6%), administração pública em terceiro (8,8%) e depois agropecuária (2,5%).
Apesar do resultado negativo nos repasses relacionados aos tributos estaduais, a cidade prevê uma situação melhor este ano. A prefeitura estima um orçamento em 2024 de R$ R$ 1,34 bilhão, aumento de 10,41% em relação ao R$ 1,21 bilhão do ano passado, conforme consta na Lei Orçamentária Anual (LOA) aprovada pela Câmara Municipal no mês passado.
CAMPINAS
Entre as 20 cidades que formam a RMC, dez apresentaram queda nos repasses de tributos, o que contribuiu para a estabilidade. Campinas, que é o maior município, teve queda de 1,97%, recebendo R$ 1,39 bilhão no ano passado, contra R$ 1,42 bilhão em 2022. O resultado fez a Prefeitura ser cautelosa na elaboração do orçamento para este ano, prevendo R$ 9,3 bilhões em receitas, praticamente repetindo o valor de 2023 - variação de 0,3%.
De acordo com o secretário de Finanças de Campinas, Aurílio Caiado, o principal motivo da redução nos repasses da quota-parte foi a queda na arrecadação de ICMS, a terceira principal fonte de receita municipal. A Prefeitura recebeu no ano passado como quota-parte desse imposto o valor de R$ 921,75 milhões, queda de 9,76% em comparação ao R$ 1,021 bilhão de 2022. Ou seja, apenas naquele ano deixaram de entrar nos cofres da Administração R$ 99,62 milhões. Segundo Caiado, a queda potencial foi muito maior, chegando a R$ 188 milhões, considerando que a projeção inicial era de crescimento de 8,7%.
O índice estava previsto no Orçamento de 2023 e levava em conta a soma de projeção de inflação (5,59%) e de crescimento de PIB (2,9%). "Além dos R$ 99 milhões que perdemos, isso significa que deixamos de arrecadar quase R$ 100 milhões a mais, que era o potencial previsto com base em indicadores econômicos factíveis", explicou o secretário de Finanças.
Para evitar déficit orçamentário no ano passado, ele disse que a Prefeitura fez cortes de despesas internas para equilibrar as contas. "Eu não posso começar o ano com déficit. É como usar o cheque especial, que você já começa 2024 tendo que cobrir esse saldo negativo e depois tem que correr para cobrir a diferença", explicou Caiado.
De acordo com o secretário de Finanças, a queda na transferência da quota-parte se deu por conta da crise econômica que continuou em 2023 e da redução e unificação em 17% da alíquota do ICMS sobre combustíveis, eletricidade e comunicação adotada pelo governo federal no final de 2022 para forçar a redução do preço desses itens. Antes cada Estado e o Distrito Federal tinham alíquotas diferentes, que acabaram sendo restituídas ao longo do ano passado. Em junho, São Paulo passou a cobrar o valor fixo de R$ 1,22 por litro de gasolina e aumentou o valor para R$ 1,3721 em outubro, quando também aumentou o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços do etanol de 9,57% para 12%.
O governo paulista estimou uma queda de 7,21% na arrecadação desse tributo no 1º semestre de 2023 por conta da redução. A arrecadação do ICMS sobre os combustíveis no país teve queda real de 8,73% (corrigida pela inflação) no primeiro semestre do ano passado, ficando em R$ 330 bilhões, contra R$ 350 bilhões de igual período de 2022, segundo dados do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), do Ministério da Fazenda.
De acordo com Aurílio Caiado, a queda ocorrida em 2023 acabou refletindo também no Orçamento de 2024, que praticamente repetiu o do ano anterior. "Eu não podia projetar um aumento diante de um cenário de queda de arrecadação de ICMS", explicou o secretário. "A gente espera que isso não se repita em 2024. Esperamos que, com a recomposição da alíquota do ICMS, as coisas voltem ao patamar normal e Campinas não sofra o que sofreu no ano passado", afirmou Caiado.
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