Registro de armas cresce 100% no 1º semestre em Campinas

O número de pessoas que conseguiram o registro de posse de armas em Campinas cresceu quase 100% neste semestre, comparado ao mesmo período de 2020. De acordo com o Sistema Nacional de Armas (Sinarm), da Polícia Federal, somente em 2022, 860 novos cidadãos obtiveram o direito a ter algum tipo de armamento em casa ou no trabalho.

No primeiro semestre de 2020, este número era de 439 pessoas - o que representou um aumento de 95,89%. O acesso a armas era uma das bases do plano de governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) desde a sua eleição em 2018. O futuro ministro da Justiça do governo Lula, senador Flávio Dino, afirmou que a nova gestão federal deve proibir posse de fuzil e metralhadora.

A posse de armas é o registro e autorização para adquirir e manter armas de fogo e munição em casa ou no local de trabalho, desde que o dono dela seja o responsável pelo estabelecimento. Ter a posse não autoriza a pessoa a andar com a arma - para isso existe o porte.

O advogado Marcos Zborowski Pollon, fundador e presidente do movimento Proarmas, que tem como propósito produzir conteúdo sobre questões políticas, filosóficas, jurídicas e técnicas a respeito do acesso a armas de fogo, defende que a população não é obrigada a ter uma arma, mas sim ter direito a essa escolha. "Quando você toma a decisão de comprar uma arma, antes mesmo de tocar nela, você tomou uma decisão irrevogável. Você não vai mais ser uma vítima e, a partir daquele momento, qualquer injustiça calará fundo em seu peito, resultando em uma reação. Se nós não nos levantarmos agora, não reagirmos agora, nada sobrará", acredita.

O porte de armas é a autorização para que o cidadão ande armado fora de sua casa ou local de trabalho. Isso é permitido aos agentes de segurança pública, membros das Forças Armadas, policiais e agentes de segurança privada. O uso de armas foi flexibilizado por meio de um decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro em maio de 2019, mas ele é motivo de debate no Supremo Tribunal Federal (STF) até hoje.

Dados obtidos pelos institutos Sou da Paz e Igarapé mostram que, no Brasil, o número de armas de fogo nas mãos dos caçadores, atiradores e colecionadores (CACs) chegou a 1 milhão em julho deste ano. Essas categorias têm sido as mais beneficiadas pelas normas editadas durante o governo Bolsonaro, que facilitaram o armamento da população.

A diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, analisou que a arma de fogo tem sido o principal instrumento empregado nos assassinatos de mulheres no Brasil. "Em 2019, a proporção de mortes de mulheres por armas de fogo no país foi de 49%. Os números ajudam a demonstrar que a presença da arma de fogo em casa é um fator de risco para as mulheres, tanto ao considerarmos as violências físicas e letais quanto as psicológicas e sexuais", comentou.

No Brasil, existem dois tipos de registros de armas de fogo. Um deles é feito pelo Exército, por meio do Sistema de Gerenciamento Militar de Armas de Fogo (Sigma). Esse sistema reúne dados de armas de Forças Armadas, policiais militares estaduais, Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e as usadas pelos chamados Colecionadores, Atiradores desportivos e Caçadores (CACs). No Sistema Nacional de Armas (Sinarm), da Polícia Federal, estão as armas da própria PF e as usadas por polícias civis estaduais, Polícia Rodoviária Federal, guardas municipais, órgãos como Ministério Público e Poder Judiciário e por cidadãos que tenham direito à posse ou porte.

A pessoa que deseja solicitar a posse de arma deverá atender a alguns requisitos, como ter ao menos 25 anos, comprovar a necessidade efetiva de ter uma arma e a inexistência de inquérito policial ou processo criminal por meio das certidões de antecedentes criminais, dispor de aptidão técnica para manusear a arma de fogo e a psicológica, a qual deve ser atestada mediante laudo fornecido por psicólogo da Polícia Federal ou credenciado.

Em tramitação

Na Câmara de Campinas, tramita um Projeto de Lei (PL) que institui o Dia Municipal dos Colecionadores de Armas, Atiradores Desportivos e Caçadores no 9 de julho. De autoria do vereador Major Jaime (PP), a data municipal deverá ser comemorada com a realização de workshops, feiras, atividades desportivas, reuniões, palestras e seminários, entre outros eventos relacionados aos CACs. "O projeto visa a reconhecer e valorizar a categoria dos colecionadores, atiradores desportivos e caçadores - os chamados CACs -, com uma data em sua homenagem. Importante ressaltar que esses apaixonados por armas de fogo já ultrapassam 1 milhão em todo o Brasil, sendo, em sua maioria atletas que disputam campeonatos regionais e defendem o país em competições internacionais em busca de medalhas, além de colecionadores apaixonados por armas novas ou antigas e caçadores autorizados na forma da lei vigente para o exercício da caça legalizada", disse Major Jaime.

Comércio

Há mais de 27 anos trabalhando como representante comercial na área de armas e munições, Jefferson Teixeira decidiu, há cerca de um ano, abrir o seu próprio negócio. A justificativa do empresário foi a de que a burocracia de trabalhar com armas não letais era praticamente a mesma exigida para armas de fogo. Assim, resolveu juntar os dois comércios em um só e, hoje, considera que sua loja tem um movimento grande para um setor segmentado como esse.

Para conseguir o Certificado de Registro, documento emitido pelo poder público, Teixeira teve de cumprir uma série de exigências, incluindo a de, até mesmo, dispor de um local adequado para armazenar as armas não letais de forma segura. "Ou seja, eu tinha que reunir todas as condições de quem tem um espaço físico sem ter o espaço físico. Então, decidi montar minha própria loja. Isso ocorreu no final do ano passado, quando realizei um evento de inauguração", explicou o comerciante.

O local é gerido em família, com Jefferson trabalhando ao lado da esposa e filho, além de outros funcionários. Eles avaliam que a clientela é robusta para um segmento restrito como o da venda de armas, entretanto, o tamanho do negócio se torna irrisório quando se considera a população e porte de Campinas. "Estamos em um município de 1,2 milhão de habitantes, portanto, era para ter muito mais clientes. Ao mesmo tempo, Campinas tem mais três ou quatro lojas que trabalham com isso, então avaliamos que temos um bom movimento por aqui", comentou.

Teixeira avalia que armas não devem ser utilizadas com foco na violência. "Armas não são violentas e sim as pessoas. As armas são para proteger a sua propriedade e na defesa de sua família.

Nos últimos anos, mesmo com o aumento de liberação de licença de armas, houve uma queda nos casos de homicídios. Costumo fazer o comparativo com o carro. Se você andar certinho e dentro da lei, nada de errado vai acontecer. O mesmo vale para as armas", finalizou.

Novo governo

Um dos braços direitos do presidente eleito Luís Inácio Lula da Silva (PT), Flávio Dino, prevê que armamentos de grosso calibre poderão ser recolhidos. Dino é integrante do governo de transição e um dos coordenadores do grupo técnico responsável pelas áreas de Justiça e Segurança Pública. "Daqui para frente, o conceito fundamental é o da lei de 2003, do Estatuto do Desarmamento. E o sobre o que já está em circulação, provavelmente, haverá uma modulação, no sentido de que, aquilo que for de grosso calibre, por exemplo, deve ser devolvido. Existe direito adquirido para o faroeste? Não. Existe direito adquirido para andar com fuzil, uma metralhadora? Não!”, defendeu.