DIFICULDADE

Região vive ‘apagão’ de mão de obra em diversos setores

Em áreas como supermercados, logística e construção civil há sobra de vagas

Edimarcio A. Monteiro/[email protected]
15/03/2025 às 11:34.
Atualizado em 15/03/2025 às 11:34
Levantamento feito pela Associação Paulista de Supermercados (Apas) apontou que na região há 5.643 vagas disponíveis em estabelecimentos do setor (Kamá Ribeiro)

Levantamento feito pela Associação Paulista de Supermercados (Apas) apontou que na região há 5.643 vagas disponíveis em estabelecimentos do setor (Kamá Ribeiro)

A região de Campinas vive hoje a situação de apagão de mão de obra em diversos setores. Há ofertas de empregos sobrando, mas dificuldade em encontrar trabalhadores para preenchê-las, uma situação vivida por setores como supermercadista, logística e indústria da construção civil. Ela é gerada, basicamente, pela falta de qualificação para funções que exigem especialização e de interesse das pessoas em ocupar as vagas oferecidas.

Nesse sentido, a região acompanha uma tendência nacional, revelada pela pesquisa "Escassez de Talentos 2025", lançada por uma consultoria internacional de Recursos Humanos, que mostra que oito em cada dez empresas encontram hoje dificuldades para contratar novos funcionários. De acordo com o levantamento, o Brasil ocupou o 7º lugar entre os países onde está mais difícil encontrar mão de obra, com 81% das empresas enfrentando essa situação. A taxa é bem superior à média global, de 74%. 

Um levantamento feito pela Associação Paulista de Supermercados (Apas) apontou que na região há 5.643 vagas disponíveis em estabelecimentos do setor, o segundo maior número do Estado, atrás apenas da cidade de São Paulo, com 8.762 oportunidades. As duas regiões respondem, juntas, por 41,76% das 34,5 mil vagas disponíveis no Estado. No caso dos supermercados, há falta de mão de obra principalmente para operador de caixa, repositor, açougueiro, operador de frios e laticínios e empacotador. 

"Antigamente era difícil recrutar mão de obra especializada. Mas, atualmente, o problema é atrair gente ainda que seja sem expe riência", admitiu o diretor de Recursos Humanos de uma rede, Maurício Echeverria. No caso da especialização, o setor buscar minimizar a dificuldade ao investir na capacitação dos colaboradores, abrindo a oportunidade de promoção, e oferece treinamentos e qualificação, além de buscar parcerias. "Nós estamos buscando uma conexão com bancos de dados de prefeituras e programas sociais para possibilitar a inserção de pessoas em situação de vulnerabilidade no mercado de trabalho", afirmou o presidente da Apas, Erlon Ortega. 

Em relação a outras oportunidades, a situação é mais crítica porque há desinteresse de quem está procurando emprego. Os quatro Feirões de Emprego e Oportunidades realizados este ano pelo Centro Público de Apoio ao Trabalhador (CPAT) de Campinas contaram com vagas para supermercados, atacadistas e varejões. Apenas uma empresa está com 100 vagas abertas para uma loja do setor atacadista que será inaugurada neste semestre no bairro Ouro Verde, em Campinas. 

A construção civil é outro setor que enfrenta dificuldades para preencher todas as vagas de trabalho disponíveis. De acordo com o diretor regional do Sindicato da Indústria da Construção Civil de Grandes Estruturas no Estado de São Paulo (SindusCon-SP), Márcio Benvenutti, a falta de mão de obra é ainda um dos principais problemas, tema que foi discutido na quarta feira passada em sua primeira reunião de conjuntura econômica. A entidade tem feito parcerias com Serviço Nacional da Indústria (Senai) para formar mestre de obras, carpinteiro e pedreiro, atividades básicas para o segmento, As empresas  também têm buscado a qualificação contínua dos seus próprios profissionais, com cursos próprios, e busca retê-los em seus quadros. 

"Tem bastante serviço, a construção civil está contratando muito", comemorou o operador de cremalheira Oziel Leandro Ferreira. Desde 2022, ele atua na construção de um condomínio com 408 apartamentos do Minha Casa, Minha Vida no Jardim Pacaembu, em Campinas. Oziel Ferreira se lembra como foi fácil conseguir uma vaga após deixar o emprego em outra obra. "Deixei o currículo num dia e no outro já me chamaram", contou. 

PESQUISA NACIONAL 

A pesquisa "Escassez de Talentos 2025" foi realizada com mais de 40 mil empregadores em 42 países e territórios, incluindo 1.050 entrevistas no Brasil. Ela colocou o país na situação de escassez mais crítica em toda a América e próximo do líder mundial, a Alemanha, com uma taxa de 86%. Nos Estados Unidos, por exemplo, o índice foi de 71%, enquanto na Argentina ficou em 68%.

De acordo com o levantamento, os sete setores mais impactados pela falta de profissionais no mercado nacional é o de transporte, logística e automotivo (91%). Essa situação facilitar para quem está desempregado voltar ao mercado de trabalho nessa área. "Na área de logística está fácil conseguir uma vaga rápido porque está carente de mão de obra", afirmou Paulo Sérgio da Silva. Ele já trabalhou em quatro empresas, sempre com contrato temporário e desta vez espera conseguir um emprego fixo. "O salário até que é bom", afirmou. Ele se cadastrou no CPAT com a expectativa de conseguir um novo em breve. 

O diretor de Recursos Humanos de uma transportadora, Ramon Vargas, disse que o setor sofre com a falta de especialização dos trabalhadores. "Com a tecnologia em constante avanço, esses profissionais são obrigados a usar aplicativos e GPS, mas muitas vezes encontram dificuldades com as ferramentas", explicou. Segundo a pesquisa Escassez de Talentos, outros setores com dificuldades para preencher as vagas são finanças e imobiliário (86%),  energia e serviços de utilidade pública (85%), tecnologia da informação (84%), indústria e materiais (80%), bens de consumo e serviços (78%), saúde e ciências da vida (77%) e serviços de comunicação (69%). 

FALTA MOTIVAÇÃO 

Porém, é difícil encontrar quem queira trabalhar com apenas um dia de folga por semana, jornada noturna, finais de semana e feriados. A explicação para isso é que está mais fácil encontrar um emprego, e as pessoas passam a ser mais seletivas. Após enfrentar o desemprego em um passado recente, com interessados fazendo filas para as oportunidades que surgiam, o Brasil entrou na fase de pleno emprego. É o conceito usado pelos economistas para a fase em que o desemprego não está nem tão alto a ponto de afetar a economia com capacidade ociosa, nem tão baixo ao ponto de gerar inflação. 

No país, essa situação é calculada quando a taxa de desemprego está entre 6% e 7%. Ele fechou 2024 com um índice de 6,6%, o mais baixo desde que começou a ser calculado em 20212, apontou a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua. No Estado de São Paulo, é inferior, 6,2%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pelo levantamento. Isso resulta em um tempo menor para conseguir uma recolocação.

O prazo é calculado hoje em 6 meses, contra até 1 ano e 5 meses em 2021, quando o país atingiu a taxa de desemprego recorde de 14%. "O desemprego começa a deixar de ser por falta de vagas e passa a ser por questões pontuais, como a busca do trabalhador por melhores postos de trabalho e melhores remunerações", explicou o Felipe Cordeiro. É nessa condição que se enquadra o ajudante de limpeza Alexandre Balieiro. Ele deixou o trabalho em uma escola particular por não pagarem as horas extras que fazia, buscar uma remuneração melhor e já com uma nova oportunidade em vista. "Faz um mês que sai e já vou fazer uma entrevista", comemorou. 

O diretor do CPAT, Guilherme Damasceno, já sentiu no dia a dia essa maior exigência em relação às condições de trabalho. "As pessoas que estão buscando uma nova colocação profissional, diante dessa grande oferta, estão mais seletivas. A gente percebe que as vagas que têm uma jornada de trabalho maior, um horário não tão atrativo, uma vaga que tem uma jornada 6 por 1, horário de trabalho noturno e nos finais de semana acabam sendo prete ridas", afirmou.

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