Ação, que contou com a participação de alunos, pais, professores e voluntários, recuperou área do quiosque e banheiros da EE Residencial São José
Uma das iniciativas dos voluntários que participaram da ação de ontem foi escrever frases motivadoras nos espaços revitalizados, como "Unidos venceremos; desunidos cairemos" (Rodrigo Zanotto)
Um espaço fechado há quatro anos, esquecido no fundo do corredor, onde as portas o separavam do restante da agitação natural da escola, voltou a "ganhar vida" ontem. Cores, muitas cores, tomaram conta de suas paredes. Frases e desenhos com mensagens de identidade, igualdade e respeito foram escritas por mão agitadas, que trabalharam com lixas, pincéis e rolos. O trabalho ficava mais leve entre sorrisos e brincadeiras de adolescentes e jovens. Muitos já se conheciam, pois se veem todos os dias, se esbarram no pátio e salas de aulas. Outros rostos eram novos, estavam ali pela primeira vez, mas com a mesma energia e alegria. Graças a essa ação comunitária, promovida pelo Projeto Oásis, vinculado à Fundação Educar, o quiosque da Escola Estadual Residencial São José ficou pronto para receber novamente os 1.232 estudantes.
"Vais ser legal para ler, estudar. O que estamos fazendo aqui vai beneficiar toda a comunidade", avaliou Maria Eduarda Aguiar, de 16 anos, aluna da escola. Ela foi uma das cerca de 200 pessoas que trocaram o sábado de folga para dar uma nova cara ao espaço. Eram estudantes, seus pais e voluntários querendo mudar aquela realidade. Ali estavam João, Paula, Pedro, Cláudia, Lorenzo e tantos outros movidos pelo lema da fundação: "Os incomodados que mudem o mundo".
A Fundação Educar é uma organização sem fins lucrativos surgida há 36 anos, em Campinas, com a proposta de transformar a realidade pelo protagonismo, leitura, contação de história, voluntariado e empreendedorismo social. "Eles (os participantes) passam a atuar como agentes de mudança. É um sonho construído junto", disse Cristiane Stefanelli, gestora da fundação. Maria Eduarda é um deles. Participante das oficinas mantidas pela Fundação Educar e estudante da EE Residencial São José, ela e sua equipe fizeram um vídeo sobre como a escola estava, projeto aprovado em assembleia para receber a nova edição do Oásis.
MÃO NA MASSA
Dado o primeiro passo, o seguinte foi ir atrás de doações do material a ser usado na reforma do quiosque da escola entre os moradores e comerciantes da região. A semente plantada não é apenas a mudança de um espaço físico, mas de toda uma vida. Maria Eduarda está no 1º ano do ensino médio. Ainda faltam dois anos para encarar o vestibular, mas já está decidida quanto à faculdade que irá cursar: Pedagogia. "A Educar despertou esse senso de mudança, e o mundo somente vai mudar através da educação", afirmou a adolescente, enquanto pintava uma das paredes.
A camiseta branca trazia várias mãos coloridas entrelaçadas, marcas deixadas pelas amigas durante os momentos de descontração em meio à atividade. Mais do que sinais de uma "bagunça divertida", os traços comunicavam a união em torno de uma proposta. Muita gente se dedicou para transformar aquele quiosque.
A parede maior ganhou o desenho de faces multicoloridas. Eram rostos amarelos, marrons, azuis, lilases, representando que todos são iguais, não importa a cor, religião, nível social. Todos fazem parte de um mesmo mundo e devem agir para torná-lo melhor, inclusivo e acolhedor. Isso é possível quando as pessoas deixam de ficar voltadas para elas e passam a enxergar o próximo. "Eu espero que, com que a minha ajuda, esse espaço fique confortável e todos fiquem felizes", disse Ana Alícia Araújo, de 13 anos. Ela é uma agente multiplicadora dessa proposta. A unidade onde estuda, a Escola Municipal de Educação Infantil (Emef) Maria de Fátima Área, no Jardim Bandeira II, recebeu o Oásis no ano passado. Ana Alícia participou do trabalho, gostou e foi picada pelo "bichinho da solidariedade". "Este ano estou aqui e no próximo vou estar em outro lugar", prometeu.
MÃOS FORTES
Atitudes como essa fizeram o projeto mudar a realidade em cerca de 100 escolas públicas desde que surgiu, em 2009. O trabalho já ultrapassou os limites de Campinas. Participantes das ações na cidade já replicaram o modelo em cidades de outros estados, como em Goiânia (GO) e Patrocínio (MG). Ana Alícia e dezenas de outros adolescentes deixaram na parede o desenho de punhos cerrados erguidos, um símbolo de resistência e enfrentamento, frequentemente usado em movimentos sociais e protestos. É um gesto que expressa força, unidade e oposição a causas como racismo, xenofobia e desigualdade. Do outro lado do espaço da escola, o pedagogo social Lucas Bussola Amorim dava forma à frase "Juntos, venceremos; Desunidos, cairemos". Ele é namorado de uma funcionária da Fundação Educar e também foi um dos voluntários da reforma na escola. "Quando ela me disse que isso iria acontecer, eu disse que queria participar", contou. Lucas Amorim trabalha em uma organização social que atua com crianças, adolescentes, adultos e idosos através de práticas esportivas. "Tem criança a partir de 6 anos. O nosso participante mais velho tem 93", contou o pedagogo, sem esconder a felicidade com o trabalho desenvolvido. "É um trabalho legal esse de pintar a escola. Aproxima as famílias e cria um ambiente que é melhor para todos", disse Yuri Paladino, monitor juvenil da Fundação Educar. Ele estava ao lado de uma parede onde pássaros eram pintados, um toque de felicidade e de evocação de liberdade. Com tantas pessoas atuando e material doado obtido, outras equipes foram montadas para das novas cores aos banheiros (masculino e feminino) localizados próximos ao pátio. Mais frases e desenhos substituíram as pichações existentes.
NA COZINHA
Rosimeire Macedo, mãe de uma aluna da escola, também se voluntariou para a reforma. "Eu vejo isso como superpositivo, porque coloca os alunos em ação. É algo que não é só para eles, mas ficará para os novos que vierem depois", afirmou. Ela foi para a cozinha para ajudar a fazer o almoço para a turma envolvida na repaginação dos espaços escolares. O cardápio do dia foi arroz, feijão, macarrão, salsicha no molho e purê. "Eu tenho 23 anos de magistério e esse é o projeto mais importante, a parceria mais forte que vi dentro de uma escola", afirmou a vice-diretora da EE Residencial São José, Patrícia Martins.
"Esse trabalho estimula o protagonismo juvenil. Ficamos felizes e orgulhosos por receber esse projeto da Fundação Educar", completou a educadora. Durante a ação, ela reencontrou um ex-aluno, alguém para quem havia dado aula há 12 anos. Hoje, ele está envolvido com a parte de vídeo e mídia da fundação.
"O Oásis é uma jornada transformadora que inspira cada participante a oferecer o seu melhor na concretização de um sonho coletivo para escolas públicas", explicou a gestora da Fundação Educar, Cristiane Stefanelli. Esse projeto é um dos trabalhos realizados pela organização. Os seus eixos de atuação são voltados para a educação, formação de protagonistas sociais, incentivo à leitura, empreendedorismo social e cooperação. Ela também oferece bolsas de estudos para dependentes químicos atendidos pelo Instituto Padre Haroldo, contribui com a fundação Todos pela Educação e é parceira da Bett Educar, maior evento de educação e tecnologia da América Latina. Ao longo de sua história, a Educar também distribuiu mais de 40 milhões de livros em todo o Brasil, além de publicar aproximadamente 200 títulos.
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