Associações de bairro receberam de forma negativa a proposta da Prefeitura
Medida foi discutida ontem no Salão Vermelho com a presença de técnicos da Secretaria Municipal de Urbanismo (Rodrigo Zanotto)
Representantes de associações de bairro presentes a uma audiência pública realizada na tarde de ontem receberam de forma negativa a proposta da Prefeitura de uma legislação específica para o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) na cidade. A iniciativa da Secretaria Municipal de Urbanismo prevê a flexibilização das regras atualmente vigentes para alguns segmentos, como estabelecimentos comerciais que ofereçam música ambiente ou ao vivo e locais de culto.
Alguns dos campineiros presentes à audiência pública sobre o assunto, realizada no Salão Vermelho do Paço Municipal, alegaram que a flexibilização vai piorar a vida de quem vive ao redor de certos locais, como bares, restaurantes e templos religiosos, por causa do excesso de barulho emitido por alguns esses locais.
O EIV serve para avaliar os impactos de um empreendimento ou atividade na qualidade de vida das pessoas que vivem no entorno desse local. Atualmente, o regramento sobre o Estudo de Impacto de Vizinhança está contido nos artigos 162 a 170 da Lei Complementar de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo, a 208/2018. Segundo os responsáveis pelo projeto, de autoria do Executivo Municipal, uma das perspectivas da nova lei é desburocratizar a legislação vigente. Além disso, a administração quer organizar e deixar mais claras as regras urbanísticas do município.
Entre os pontos existentes na nova legislação, o que mais gerou discussão foi a desobrigação de várias atividades comerciais e de serviços de apresentarem o EIV para obterem o alvará de funcionamento. Pela proposta da Secretaria Municipal de Urbanismo, deverão ficar dispensados de apresentação do estudo os buffets para festas com capacidade de até 250 pessoas; estabelecimentos comerciais que ofereçam música ambiente, música ao vivo com instrumentos acústicos ou pequenos conjuntos musicais, voltados ao entretenimento dos frequentadores, sem que a apresentação artística seja a atividade principal do local, além de instituições de ensino de qualquer modalidade, como creches, escolas, entre outras.
Seguirá sendo obrigatória a apresentação de projeto e laudo acústico e as Anotações de Responsabilidade Técnica (ARTs) dos responsáveis técnicos para a emissão do alvará de uso destes estabelecimentos.
Ainda segundo a proposta da Administração Municipal, também deverão deixar de apresentar o EIV as indústrias do Distrito Industrial de Campinas e os clubes associativos instalados em Loteamentos de Acesso Controlado (LAC). O projeto de lei prevê ainda a revisão dos critérios para exigência de Relatórios de Impacto de Trânsito (RIT), dispensando os pequenos bares, escolas e locais de culto de apresentá-lo. O RIT é um documento técnico exigido para empreendimentos que possam afetar significativamente o tráfego local. Outra revisão na proposta da Secretaria Municipal de Urbanismo é a dos critérios para exigência do Estudo de Impacto de Vizinhança para projetos de construções e ampliações de obras.
RECLAMAÇÕES
A minuta do projeto de lei complementar para o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) foi apresentada pela equipe técnica da Secretaria Municipal de Urbanismo de Campinas, em uma audiência pública realizada no Salão Vermelho, ao lado do saguão principal do Palácio dos Jequitibás, sede da Prefeitura. Na sequência, foi aberto espaço para a manifestação das pessoas presentes.
Uma das munícipes que falou no encontro foi a ambientalista Tereza Penteado, integrante do movimento Resgate Cambuí. Ela contou que sofre com a presença de alguns estabelecimentos comerciais e de templos religiosos nos arredores de onde mora, que abusam da emissão de barulhos muito altos. "Música muito alta incomoda as pessoas. É um fato. Não tem como você dormir enquanto esse excesso de barulho acontece. Temos de ter uma lei que ajude a população, não que atrapalhe. Esse é um projeto contra a população e a favor dos infratores", desabafou.
Quem também criticou a flexibilização da obrigatoriedade de se apresentar o EIV por alguns segmentos foi Markus Nydegger. Morador do Taquaral, ele relatou durante a audiência pública que acha alguns pontos da proposta muito genéricos. "O que seriam pequenos conjuntos musicais, que tocariam música ao vivo em estabelecimentos comerciais? Duas pessoas com instrumentos pequenos? Dependendo do tipo de música e dos instrumentos, o som fica muito alto. E lembrei de uma experiência que eu tive, uma vez fui a um bar de esquina, e a música estava tão alta que não conseguia falar com minha esposa. Que estava ao meu lado. Não tivemos escolha e fomos embora".
Em entrevista ao Correio Popular após o encerramento dos debates, a secretária de Urbanismo de Campinas, Carolina Baracat Lazinho, disse que todas as sugestões e colaborações da população feitas no encontro vão ser analisadas pela Administração Municipal. E que o projeto de lei complementar deverá ser encaminhado para a Câmara de Vereadores no máximo em dois meses. "A participação popular é muito importante, principalmente nas audiências públicas. Agora iremos compilar tudo o que recebemos, inclusive de sugestões feitas via internet, e encaminhar para a análise da Secretaria Municipal de Justiça. Quando estiver tudo em ordem, será a vez de mandarmos o projeto para a avaliação dos vereadores e vereadoras de Campinas", comentou.
Questionada sobre as principais reclamações dos participantes da audiência pública, a secretária negou que a proposta vá proteger os segmentos econômicos em prol da qualidade de vida da população. E um aumento no rigor das fiscalizações dos estabelecimentos que causarem problemas ligados ao excesso de barulho poderá ser possível com uma alteração na Lei de Alvará de Uso. "Essas mudanças estão atualmente em estudo interno aqui na Prefeitura. Mas uma das propostas é dar mais poder para a Administração Municipal fechar um local que desobedeça a legislação, como a ausência do Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB). A lei atual prevê a autuação, mas dá prazo administrativo para que os donos dos locais façam as correções necessárias. E a fiscalização acaba não sendo tão eficaz quanto poderia ser".
BARULHO
A reportagem mostrou em 11 de fevereiro deste ano que o número de denúncias de perturbação do sossego por barulho em Campinas aumentou mais de 8% entre 2023 e 2024. Foram 12.672 reclamações atendidas pela Guarda Municipal no ano passado, contra 11.727 no ano anterior. Considerando os bairros da cidade, o Centro é o local que gera o maior número de queixas por parte da população, com 639 denúncias feitas nos 12 meses de 2024. Como resposta ao aumento das reclamações, a GM colocou equipes específicas nas ruas do município para atender esse tipo de ocorrência aos finais de semana.
Ainda segundo a corporação, o segundo bairro de Campinas com o maior número de denúncias de perturbação do sossego é o Cambuí, com 482 queixas - 22,6% a mais do que em 2023, quando foram registradas 393 reclamações. A região é conhecida por abrigar moradores com alto poder aquisitivo, além de ser sede de vários bares, restaurantes e casas de shows, que funcionam geralmente no período noturno. A Guarda Municipal informou ainda que outros bairros com quantidades elevadas de denúncias sobre o assunto em 2024 foram o Cidade Satélite Íris (317), Jardim do Lago Continuação (265) e o Jardim Novo Campos Elíseos (240), todos em áreas mais periféricas da cidade.
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