LEGISLATIVO

Produção reduz relevância da Câmara

Dos 506 projetos protocolados entre janeiro e a última 4ª, quase 60% eram nome de rua e honraria

Maria Teresa Costa
05/10/2019 às 20:52.
Atualizado em 30/03/2022 às 15:04

Mais da metade dos projetos apresentados pelos vereadores este ano na Câmara de Campinas não tem qualquer impacto na vida da cidade. Dos 506 projetos protocolados entre janeiro e a última quarta-feira, 57,5% dão nomes a praças, ruas, prédios, criam datas comemorativas ou concedem honrarias. Esse perfil se reflete também nas leis que entraram em vigor no período: dos 77 projetos dos parlamentares sancionados pelo prefeito Jonas Donizette (PSDB), 67,1% deles são homenagens a anônimos ou personalidades. O menu das novas leis é bastante variado. A Câmara aprovou e Jonas sancionou a instituição do CarnaRock no calendário festivo e cultural de Campinas a ser comemorado no Carnaval. Por proposta do Legislativo, a comemoração do Dia do Criador de Pássaros mudou do terceiro domingo de outubro para o terceiro domingo de junho e a data de 2 de agosto passou a ser o Dia Municipal dos Rosacruzes. Neste ano, o vereador Carmo Luiz (PSC) é o campeão de projetos para denominar praças, ruas, prédios. De 31 projetos de lei apresentados, sete são para nomear locais públicos. Segundo ele, essas propostas surgem de demandas da população e são parte da atividade legislativa do parlamentar. “O que temos hoje é pouca margem para trabalhar projetos de impacto na cidade. Quando discutimos com a comunidade uma demanda e elaboramos um projeto de lei, muitas vezes já existe lei a respeito, ou a proposta é inconstitucional ou ilegal e acaba barrada na Comissão de Constituição e Legalidade”, afirmou. Ele lembra que vereadores não podem apresentar muitos projetos que desejariam porque podem incorrer no chamado vício de iniciativa. Ou seja, a competência, especialmente em assuntos que envolvem questões tributárias, é do prefeito. “Tentamos melhorar a vida da cidade por meio de indicações, mas o atendimento depende do Executivo”, disse. Na outra ponta está o vereador Antônio Flores (PSB), que este ano não apresentou qualquer projeto. Ele disse que pela quantidade de propostas que protocolou em cinco mandatos e de leis que foram sancionadas, prefere atualmente trabalhar em propostas mais qualificadas, que possam fazer de fato diferença na vida da cidade. Nesses cinco mandatos, disse, apresentou 130 projetos e 70 deles foram transformados em lei. Ele disse que trabalha atualmente em dois projetos que serão apresentados nas próximas semanas. “Prefiro ter um ou dois projetos qualificados do que um caminhão deles que não tem resultados práticos na vida da cidade”, comentou. Flores informou que tem preferido dedicar mais tempo ao trabalho de corregedor da Câmara, atividade responsável pelo cumprimento da manutenção do decoro, da ordem e da disciplina no Legislativo. É parte das atribuições da Corregedoria, supervisionar a proibição e porte de arma, com poderes para fazer revistas e desarmar. O parlamentar também preside duas comissões permanentes, a de Cultura e de Honrarias. O número de indicações para tapar buraco, cortar mato, podar árvores, construir guias, implantar sinalização apresentadas este ano já é 32% maior do que no mesmo período do ano passado. Em 2019, o vereador Edison Ribeiro (PSL) é o campeão delas, com 745, enquanto no ano passado, Filipe Marchesi liderou, com 577. As indicações são dedicadas a mostrar, ao reduto eleitoral, que o parlamentar está trabalhando por ele. Os vereadores dedicaram a maior parte do tempo à função de intermediação de interesses paroquiais e clientelistas - além de inútil, porque o prefeito não tem obrigação de atender ao pedido. O vereador Luiz Cirilo (PSDB) liderou, este ano, o número de projetos sancionados pelo prefeito Jonas Donizette. Doze novas leis foram originadas de projetos apresentados por ele na Câmara. Já os vereadores Nelson Hossri (Podemos) e Tenente Santini e Marcelo Silva, ambos do PSD, não tiveram projetos sancionados. Até a atribuição para dar nome de rua é questionada A competência de vereadores para dar nomes a praças, ruas, prédios é controversa. Nos últimos anos, o Ministério Público ingressou com várias ações direta de inconstitucionalidade (Adin) questionando a constitucionalidade das leis orgânicas de municípios que elencam, entre as atribuições do Legislativo, a de legislar sobre a denominação e sua alteração de próprios, bairros, vias e logradouros públicos. Em algumas decisões, a Justiça julgou procedente a demanda ministerial, com o entendimento de que somente prefeitos podem tomar essa iniciativa. Caberia aos parlamentares apenas estabelecer leis que disciplinem critérios as denominações. Presidente Prudente, Marília, Sorocaba são algumas das cidades onde há a discussão da constitucionalidade da lei orgânica. No ano passado, o Tribunal de Justiça julgou procedente a Adin da Procuradoria Geral de Justiça e derrubou trecho da lei orgânica de Taubaté que permitia que vereadores apresentassem projetos para dar nomes a vias e prédios públicos. A Secretaria de Assuntos Jurídicos informou que a ação dos vereadores está respaldada pela Lei Orgânica do Município e que todas as propostas da Câmara nesse sentido são respaldadas pela instrução das secretarias municipais, que opinam sobre sua viabilidade técnica, razão pela qual, a Pasta entende não há invasão de competência e nem violação ao princípio da separação de poderes. Para o especialista em direito público, Valdemir Reis, não há vício de iniciativa e vereadores podem denominar locais. “Embora haja ações direta de inconstitucionalidade discutindo o assunto, até que entendimento do STF seja pacificado, não há inconstitucionalidade”, afirmou. O advogado Gustavo Bovi também não vê vício de iniciativa nos projetos propostos pelos parlamentares. A Lei Orgânica, afirmou, prevê essa atribuição à Câmara. “A Constituição não seria tão restritiva. Ela trata da competência dos municípios para legislar e cada cidade define suas regras”, disse.

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