FALSIFICAÇÃO, CONTRABANDO E SONEGAÇÃO

Prejuízos com pirataria superam orçamentos das cidades na RMC

Com perdas de R$ 26,1 bi em 2021, 20 municípios totalizam orçamento de R$ 16,5 bi

Edimarcio A. Monteiro
31/03/2022 às 11:18.
Atualizado em 31/03/2022 às 11:18
Tênis e roupas estão entre os 10 segmentos do comércio mais afetados no País pelas falsificações, contrabando e sonegação de impostos, gerando perdas de R$ 10 bilhões anuais (Kamá Ribeiro)

Tênis e roupas estão entre os 10 segmentos do comércio mais afetados no País pelas falsificações, contrabando e sonegação de impostos, gerando perdas de R$ 10 bilhões anuais (Kamá Ribeiro)

A Região Metropolitana de Campinas (RMC) registrou em 2021 prejuízos de R$ 26,1 bilhões com sonegação fiscal, falsificação e contrabando de produtos, que a coloca em 7º lugar no ranking nacional da pirataria. Esse valor é maior do que a soma do orçamento para este ano de todos os 20 municípios que formam a RMC — R$ 16,5 bilhões — e representa 9% dos R$ 290 bilhões das perdas nacionais provocadas por esses crimes, de acordo como balanço divulgado ontem pela Associação Brasileira de Combate à Falsificação (ABCF).

Isso coloca a Região Metropolitana de Campinas atrás apenas de seis capitais: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Recife (PE) e Goiânia (GO). "A falsificação aumenta o desemprego, causa perda de arrecadação de impostos e traz riscos à saúde e à segurança dos consumidores", alerta o diretor de Comunicação da ABCF, Rodolpho Ramazzini.

O próprio Correio Popular é vítima da pirataria, uma vez que arquivos em pdf do jornal circulam em 1.035 grupos de Whatsapp, apesar de não serem assinantes.

Para Ramazzini, a alta carga tributária no País, a falta de investimentos em mecanismos de repressão à pirataria e a perda do poder aquisitivo da população em virtude da crise econômica favorecem a proliferação da falsificação. "A alta carga tributária que incide sobre os produtos legais e originais fabricados no Brasil é um convite às quadrilhas e falsificadores tanto aqui como nos países limítrofes. Somente com uma revisão da carga tributária da indústria brasileira, aliada com um controle mais efetivo de nossos portos e fronteiras, poderemos alcançar grandes resultados no combate às quadrilhas de contrabandistas e falsificadores", afirma o diretor da ABCF. Ramazzini aponta vários fatores que contribuem para a Região Metropolitana de Campinas se destacar no mercado da pirataria. Entre eles, o poder aquisitivo da população, a existência do Aeroporto Internacional de Viracopos, ser um importante entroncamento rodoviário, que facilita o escoamento das mercadorias para várias regiões do País, a alta concentração de galpões industriais usados para essa logística e até mesmo a liderança na reciclagem nacional de vidro, o que leva ao desvio de muitas garrafas para uso nas bebidas falsificadas.

Apreensões na região

Esse último ponto é confirmado pelas estatísticas policiais. No ano passado, as Polícias Civil e Militar fizeram oito apreensões de bebidas falsificadas na região de Campinas. Em uma delas, em julho, foram encontrados 14 tanques com mil litros de bebidas adulteradas, além de 2.832 garrafas de uísque e vodca em dois barracões no Campos dos Amarais, em Campinas.

Também foram apreendidos 11 mil tampas, cinco mil dosadores, 9.743 caixas para bebidas, 97 vasilhames vazios e 52 mil rótulos. Segundo os policiais, o produto falsificado seria comercializado em adegas, mercados, bares, festas e boates da cidade e região. Um homem preso no local responde a inquérito por falsificação de produto alimentício, crime com pena prevista de quatro a oito anos de prisão.

Em fevereiro, outra apreensão de bebida falsificada ocorreu em Campinas. A Polícia Militar encontrou 300 caixas de bebidas falsificadas que estavam em um barracão na Rua José Ismael Camargo, no bairro Chácara Campos Elíseos. As garrafas de cerveja estavam com os rótulos trocados e seriam comercializadas como se fossem de outra marca. A substituição era feita de forma manual no local, onde foram apreendidos tampas metálicas e rótulos de marcas diferentes.

Na operação, quatro homens foram presos e um adolescente apreendido. Um dos acusados tentou subornar os PMs com a quantia de R$ 16,5 mil. Além de falsificação de produto, ele também responderá inquérito por corrupção ativa.

Riscos à saúde

Mas a pirataria na região envolve outros produtos. A maior apreensão de perfumes pirateados já feita no País ocorreu em Limeira em junho passado. A Polícia Civil fechou uma fábrica clandestina no Parque Hipólito, onde eram falsificados produtos de grifes francesas. O que levantou a suspeita de irregularidade foi que o proprietário dificultava o acesso da Vigilância Sanitária ao local.

Cerca de 1,2 milhão de frascos foram apreendidos. A mercadoria falsa seria comercializada em todo o País. Nessa ação, 27 pessoas foram presas. Entre eles, o dono da fábrica, que já havia sido detido por falsificação de produtos em 2019.

Enquanto os perfumes originais são vendidos a partir de R$ 300 por frasco, os falsificados eram vendidos no atacado por R$ 6 a R$ 8.

O valor mais em conta dos produtos falsificados é o principal fator a atrair os consumidores.

Os especialistas alertam para os riscos à saúde no consumo de produtos falsificados. "Eu busco o que é mais barato. Há produtos que tem uma qualidade razoável", diz a dona de casa Ana Maria Gonçalves. Os reflexos dessa atitude vão do impacto econômico aos riscos à saúde. "Esse comportamento afeta o crescimento econômico e a geração de postos de trabalho na região e no País. A questão é o barato que pode sair caro", afirma o economista Laerte Martins, da Associação Comercial e Industrial de Campinas (Acic).

Se o uso de uma camiseta ou tênis pirata não coloca em risco a vida dos consumidores, o quadro muda quando se fala em itens como bebidas, medicamentos, fios, autopeças e outros. "No caso das bebidas, por exemplo, não há controle do teor de álcool. Além disso, eles podem estar contaminados com produtos que provocam cegueira, afetar o sistema nervoso e causar até a morte, como o metanol e metais pesados", diz o médico Carlos Barroso Andrade.

Situação no País

De acordo com a ABCF, o País teve um prejuízo de cerca R$ 290 bilhões no Brasil em 2021 com a falsificação, contrabando e sonegação fiscal que esses crimes envolvem, o que representou um aumento de 12% em comparação ao ano anterior. O produto que ocupa o topo nas perdas causadas ao País são os combustíveis. Foram R$ 26 bilhões no ano passado, dos quais 80% em sonegação e 20% em adulteração.

Entre janeiro de 2021 e o mesmo mês deste ano, foram realizadas no País 945 operações das Polícias Civil, Federal, Rodoviária Federal e da Receita Federal para combater a pirataria, que tiveram o apoio da associação ou foram realizadas a partir de denúncias feitas pela entidade.

Com 214 ações, as apreensões de autopeças lideraram esse ranking. Em segundo lugar, aparecem os cigarros contrabandeados (185), seguidos por apreensões de bebidas (184). Para a ABCF, os cortes nos orçamentos das Polícias Federal, Rodoviária e Receita prejudicam o combate à pirataria.

Migração para o e-commerce

O Estado de São Paulo é o principal mercado consumidor de produtos piratas do País, sendo responsável por 45% de todo o volume comercializado. Em segundo lugar está o Paraná, seguido pelo Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Goiás e Rio de Janeiro. Segundo a ABCF, 65% dos produtos falsificados vendidos no mercado nacional são fabricados na Ásia e os outros 35%, produzidos no Brasil.

De acordo com a empresa de consultoria RM Consulting, as plataformas de e-commerce e mídias sociais respondem hoje por cerca de 35% das vendas de mercadorias falsificadas no País. "Isso demonstra que houve uma adaptação ou migração das quadrilhas de falsários e contrabandistas para o meio virtual, o que torna ainda maior o desafio de combater as quadrilhas organizadas", diz Ramazzini.

"Temos que combater com mais força e seriedade, aliar essas ações com outras, como rever os tributos dos setores mais atingidos, e, principalmente, instituir a rastreabilidade de produção no Brasil. Isso permitirá que tenhamos controle do que é produzido e comercializado no País para que tenhamos controle do contrabando", afirma o diretor da ABCF.

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