Portaria que tenta disciplinar a ação de policiais na internet provoca polêmica
Policial civil em ação nas ruas de Campinas: diretrizes nas redes sociais (Wagner Souza/AAN)
Portaria assinada pelo Delegado-Geral da Polícia Civil, Ruy Torres Fontes, que pretende disciplinar a conduta de policiais no uso das redes sociais, provocou polêmica entre servidores e autoridades ligadas ao setor da segurança pública em São Paulo. Para muitos policiais, a normativa sugere uma espécie de “Lei da Mordaça” – a que funcionários da Secretaria de Segurança estariam sendo submetidos pelo governo do Estado e foi interpretada como uma resposta do governo a setores da corporação mais identificados com o Bolsonarismo. Publicada esta semana, a portaria proíbe a criação de perfil funcional relacionado ao trabalho de natureza policial. A exceção fica por conta apenas de perfis utilizados pela Polícia Civil, os administrados pela Assistência Policial da Comunicação Social da Delegacia Geral de Polícia Adjunta, ou aqueles que forem autorizados pela Delegacia Geral. A portaria define que é livre a criação de perfis pessoais nas redes sociais, mas o policial deve abster-se de usar na identificação pessoal (nome do usuário) o nome da Polícia Civil de São Paulo. Fica proibido também usar o brasão, banner ou qualquer outro símbolo oficial da Polícia Civil de São Paulo, como forma de identificação pessoal. Não pode ainda se registrar usando endereço de e-mail institucional, nem usar elementos visuais ou de texto como forma de identificação pessoal que possam induzir o usuário a acreditar que se trata de perfil funcional. O policial não poderá ainda manter indevida interação virtual com pessoas que sabe ou deveria saber que estejam envolvidas em atividades criminosas, salvo por motivo de serviço. Ou expressar opinião de cunho pessoal que possa ser interpretada como posição oficial da Polícia. A proibição se estende à manifestação de juízos depreciativos a decisões e atos de polícia judiciárias praticadas por delegado de Polícia. Emanar qualquer outra manifestação que desrespeite sua independência funcional também é proibido. O policial ainda não poderá violar sigilo profissional, publicando ou compartilhando quaisquer informações ou documentos dos quais teve conhecimento no exercício do cargo e que não sejam de conhecimento público. A portaria também disciplina aspectos relacionados à disseminação de fake news. O policial não poderá emitir ou compartilhar opinião que caracterize ou demonstre tolerância a discurso discriminatório ou de ódio, ou que expresse preconceitos de qualquer natureza. Está proibido, ainda, de expressar opinião que atente contra os valores consagrados pela Constituição Federal de 1988, em especial, do Estado Democrático de Direito, seus fundamentos e dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Agentes defendem liberdade de expressão com consciência Os Policiais não falam publicamente sobre a medida assinada pelo Delegado-Geral da Polícia Civil, Ruy Torres Fontes, mas o Correio Popular ouviu reclamações de vários deles. “Temos liberdade de expressão e, lógico, quem se exceder, que seja punido. Mas da forma que foi colocado está muito impositivo”, comentou um policial, que pediu para que seu nome fosse preservado. O deputado estadual Bruno Lima, do PSL — o partido pelo qual Jair Bolsonaro foi eleito — disse que pretende convocar o delegado-geral para uma audiência na Assembleia Legislativa a fim de tratar do assunto. “Essa portaria nos pegou de surpresa”, admitiu o deputado. “É claro que tem de ter cuidado com o uso das redes sociais atualmente, mas é através delas que os policiais divulgam seus trabalhos. A Polícia Civil já foi muito malvista, mas os policiais têm orgulho de mostrar o trabalho deles”, disse o deputado. “Conversei com alguns policiais e muitos querem entrar com um mandado de segurança. O delegado-geral foi muito rigoroso”, acrescentou o político. Para o delegado aposentado e hoje especialista em segurança pública, Ruyrillo Pedro de Magalhães, o objetivo da portaria é relevante em função do uso indevido da imagem da polícia judiciária. No entanto, ele acredita que ela deveria ser melhor debatida e analisada com entidades da classe. “Alguns aspectos precisariam de maior clareza”, defende Magalhães. “Vivemos em um estado democrático de direito e o delegado de polícia judiciária é o primeiro garantidor nos casos que lhes são apresentados dos direitos dos cidadãos consagrados na constituição federal e legislação penal, e às vezes até sobre posturas municipais”, finalizou.