NO BOSQUE DOS JEQUITIBÁS

Poda preventiva de árvores em Campinas é criticada por ambientalistas

Secretário Paulella garante que o procedimento adotado é o mais adequado

Ronnie Romanini/ [email protected]
05/01/2023 às 09:14.
Atualizado em 05/01/2023 às 09:14
Poda da copa das árvores que ficam nos limites do Bosque dos Jequitibás: medida foi tomada pela Prefeitura para evitar a queda de exemplares em decorrência das fortes chuvas (Kamá Ribeiro)

Poda da copa das árvores que ficam nos limites do Bosque dos Jequitibás: medida foi tomada pela Prefeitura para evitar a queda de exemplares em decorrência das fortes chuvas (Kamá Ribeiro)

As fortes chuvas que castigaram Campinas nas últimas semanas, provocando dezenas de quedas de árvores e um óbito decorrente da queda de uma figueira branca do Bosque dos Jequitibás, suscitaram ações da Prefeitura para evitar novas ocorrências graves. A Secretaria Municipal de Serviços Públicos de Campinas anunciou o início de mais duas medidas de caráter preventivo: a poda das copas de árvores que ficam nos limites do Bosque dos Jequitibás e um estudo das condições de toda a mata. A ação, entretanto, não obteve aprovação unânime entre ambientalistas e especialistas da área florestal. 

"Qualquer intervenção que é realizada em árvore urbana tem que ser muito bem pensada e planejada. Essas intervenções teriam que passar por avaliação técnica de um profissional habilitado, um engenheiro florestal, agrônomo ou biólogo. Comprovada a necessidade, e após aprovada, precisam ser acompanhadas pelo engenheiro e pelo responsável técnico. Ao que tudo indica, não houve tempo hábil para um laudo ser elaborado e uma avaliação correta ser feita", opinou o engenheiro florestal e agrônomo, além de mestre em arborização urbana, José Hamilton de Aguirre Junior.

Ele acrescentou que ao se tomar uma medida apressada - ou sem o procedimento e técnica corretos - há um risco de desbalancear ainda mais as árvores, que podem já estar com problemas nas raízes. 

O secretário de Serviços Públicos de Campinas, Ernesto Paulella, rebateu a análise dos ambientalistas que criticam a ação da Prefeitura. Ele afirmou que a decisão de realizar a poda nas copas das árvores foi técnica. "Com o excesso de chuva que está ocorrendo esse ano, o solo no Bosque dos Jequitibás ficou saturado. Encharcado. Isso tira a resistência de fixação das raízes. O motivo de realizarmos a poda periférica é diminuir o peso da copa das árvores para que essa poda possa contribuir para evitar a queda de novas árvores", explicou Paulella.

Membro do coletivo ambiental SOS Piçarrão, o tecnólogo em Segurança do Trabalho e Meio Ambiente, Paulinho Olivieri, foi fazer uma inspeção no Bosque para ver as condições das árvores na manhã de quarta-feira (4) e junto a outros integrantes do coletivo. Eles foram surpreendidos com o portão fechado e a poda acontecendo no lado externo, na Rua General Marcondes Salgado.

Ele disse não acreditar na versão da Prefeitura, de que a queda aconteceu por uma saturação do solo provocada pela chuva, pois "árvore saudável não cai sozinha". Olivieri também manifestou preocupação com a suposta falta de critérios técnicos para o trabalho, que pode ser destrutiva às arvores, adoecendo-as e colocando em risco as pessoas que moram e transitam na região. 

O coletivo acionou o Ministério Público pedindo para que a perícia realizada pela Polícia Civil seja enviada ao MP-SP e compartilhada com eles. Além disso, pede que a ação seja suspensa até uma análise criteriosa feita por um profissional habilitado para tal. 

O engenheiro florestal Aguirre Junior criticou o baixo número de profissionais da área na Prefeitura de Campinas e as condições de trabalho em que os poucos engenheiros e biólogos atuam. "A questão principal é que a Prefeitura precisa de engenheiros florestais, agrônomos, biólogos. O foco do trabalho do florestal é a árvore. Precisa aumentar muito o número de profissionais e dar condições de trabalho para que se possa evitar esses impactos tão grandes com as chuvas. A arborização é para ser útil, cumprir funções nobres, principalmente nas mudanças climáticas que vivemos. Então, quando não há acompanhamento técnico, quando há açodamento, acontece de se tomar medidas desesperadas, sendo que se houvesse planejamento e um corpo técnico suficiente, com condições de trabalho, essa agenda seria cumprida."

Para Aguirre Junior, falta também uma espécie de estudo, um censo arbóreo, árvore por árvore, para conhecê-las melhor e saber, por exemplo, se alguma requer medidas de manejo, remoção de ramo seco, se alguma está doente. Ele avaliou por meio de imagens e vídeos que a figueira branca que caiu e matou uma pessoa no dia 28 de dezembro estava com a raiz comprometida. Na opinião do engenheiro, isso foi provocado por alguma pessoa que realizou uma poda na raiz da árvore. Sendo assim, ela não teve condições de se sustentar, de aguentar o próprio peso.

"O que eu soube é que tudo o que estiver rente ao alambrado está sendo podado. Isso não é medida de manejo, não é medida preventiva. Você está gerando novas árvores de risco."

Mais uma vez, a alegação foi rebatida pelo secretário Paulella. Sobre a falta de profissionais especializados, ele argumentou que são cinco engenheiros, quatro agrônomos e um florestal, que fazem parte do corpo técnico do Departamento de Parques e Jardins, o que seria "absolutamente suficiente para atender às necessidades da cidade".

O prefeito Dário Saadi (Republicanos) disse achar natural o questionamento dos ambientalistas. Ele afirmou que a poda está sendo feita com todo o cuidado possível e que a Prefeitura encaminhou raízes da figueira branca, cuja queda vitimou um homem de 36 anos na semana passada, para que o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e o Instituto Biológico possam fazer um estudo independente. 

Dário disse que a poda emergencial tem como intuito evitar novos acidentes e que por isso houve também a adoção da medida de inverter o sentido de uma faixa da Rua Coronel Quirino. "A árvore que caiu era uma árvore totalmente saudável. No dia do acidente eu fui lá e verifiquei que todo os galhos que foram serrados eram saudáveis, verdes. A árvore não tinha um galho seco, aparentemente não tinha nenhuma doença."

A equipe de cinco engenheiros da Pasta está realizando uma inspeção no Bosque dos Jequitibás para avaliar as condições de todas as árvores do fragmento de Mata Atlântica. O bosque foi dividido em quatro quartis e os técnicos vão inspecionar cada um dos indivíduos adultos do local, algo que pode levar mais de quatro meses - o que, na visão da Administração, justificaria a ação emergencial que pretende evitar novas quedas de árvores.

A Prefeitura antecipou que o mesmo trabalho de poda será feito nas ruas Pedro Álvares Cabral e Uruguaiana.

Estado de atenção

Até quarta-feira, dia 4, quatro cidades estavam em estado de atenção e outras 46 em observação devido às chuvas que atingem a macrorregião de Campinas. Os dados foram divulgados pelo Sistema Integrado de Defesa Civil (Sidec) do Estado no final da manhã.

Entre as quatro cidades em atenção, Socorro acumulava 158,3 mm; seguida de Paulínia com 113,2 mm; Campinas, com 98,9 mm; e Pedreira com 81,1 mm. Segundo a Defesa Civil estadual, o estado de atenção ocorre quando o município registra ao menos 80 mm (milímetros) de chuva em três dias. A classificação indica risco de deslizamentos de terra, quedas de muros, além de eventual inundação.

Em Campinas, a chuva que atingiu a cidade na tarde e início da noite de segunda-feira provocou a queda de árvores, alagamento de oito imóveis, duas quedas de muro e a erosão de via pública em três locais (Jardim Bonfim, Ponte Preta e Vila Industrial), além de um imóvel e um muro com risco de queda. Não há desabrigados.

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