PROTESTO

Periferia vai às ruas de Campinas pelo impeachment

Mas não é a corrupção na Petrobras o principal motivo da participação, mas o reajuste nos preços, inflação e sentimento de ter sido enganado nas eleições

Cecília Polycarpo
14/03/2015 às 05:00.
Atualizado em 23/04/2022 às 17:58
Danilo: "Dilma disse que tudo ia bem, que não ia mexer nos nossos direitos, mas deu o bote depois" ( César Rodrigues/ AAN)

Danilo: "Dilma disse que tudo ia bem, que não ia mexer nos nossos direitos, mas deu o bote depois" ( César Rodrigues/ AAN)

Rotulada como protesto das elites, a manifestação deste domingo (15) pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) também terá representantes de bairros da periferia em Campinas. Moradores do Campo Belo, Campo Grande e Ouro Verde - única região da cidade em que Dilma teve mais votos que Aécio Neves (PSDB) no segundo turno das eleições - se declararam insatisfeitos com o governo federal. Mas não é a corrupção na Petrobras o principal motivo de queixas: o reajuste no preço da energia elétrica, da gasolina e o aumento de impostos são, para eles, razões mais importantes para indignação.Com menos poder de compra e mais dívidas, muitos disseram que se sentiram "traídos" pelas medidas econômicas adotadas por Dilma. A maioria dos entrevistados não vai às ruas, mas muitos jovens entrevistados confirmaram  presença no evento. Cientistas políticos disseram que a insatisfação da população carente e da classe C é também reflexo da postura de Dilma, que tentaria minimizar o difícil momento econômico do País em seus pronunciamentos e estaria mal assessorada.   Mobilização jovem Jovens em torno dos 20 anos estão mais mobilizados para a marcha de domingo do que a população mais velha. Apesar de a insatisfação estar presente em todas as faixas etárias, nenhum dos moradores entrevistados com mais de 35 anos disse que irá à manifestação no Centro.   O vendedor Bruno Fritiche, de 19 anos, disse que seu protesto será pelos juros altor, valor da gasolina e  inflação. Ele contou ainda que a família inteira vai participar do evento. "Eu chamei todo mundo, convenci pais, primos. Está todo mundo infeliz com o governo. A Dilma tem que sair, e essa é a hora", afirmou o morador do Ouro Verde.   Corrupção e mudanças   Para o auxiliar de RH Danilo Santos, de 22 anos, a corrupção não é o único motivo do movimento de domingo. "O problema não é só eles roubarem. Para mim, é eles falarem que vão fazer uma coisa e fazerem outra. A Dilma disse que tudo ia bem, que não ia mexer nos nossos direitos, mas deu o bote depois". Mãe de duas meninas, a dona de casa Claudivânia de Lira, de 29, disse que sente a profundidade da crise econômica toda vez que vai ao supermercado.   Se há pouco tempo ela conseguia comprar produtos básicos de alimentação e limpeza com R$ 100, hoje ela afirmou que não leva mais que "três sacolas" . "Eu votei na Dilma no ano passado porque tinha esperança que as coisas iam melhorar. Me senti traída. Mas este ano cortei várias verduras e legumes do almoço porque não consigo mais comprar. Os mais pobres sentem mais. Por isso vou na passeata com minha família no domingo" .   A inflação dos alimentos também é a causa da indignação de Genivaldo Alves, 55 anos. Ele afirmou que não vai à manifestação, mas apoia o movimento. "Os preços sobem. Nosso salário não. Não acompanha mais. Estou sentindo mais o peso do aumento hoje do que antes do real. Parece que meu dinheiro rendia mais" .Descontentamento   O cientista político da Universidade Estadual de Campinas, Plínio Dentzien, acredita que a insatisfação com o governo Dilma cresceu em todas as camadas sociais. "Para os mais pobres, pesa o fato de a presidente ter mentido em campanha. Ter dito com todas as letras que não ira mexer no direito dos trabalhadores" .Já para o professor de ciências políticas da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Pedro Rocha Lemos, a insatisfação da população pode ser cíclica, e que diversos governos que enfrentaram grande descontentamento em algum momento, foram reeleitos depois de algum tempo. No entanto, pesam a crise econômica, que deve demorar a passar, e o isolamento político de Dilma no Congresso Nacional."A partir do momento que ela conseguir a estabilidade política dentro de Brasília, voltar a ter diálogo com deputados e senadores, as coisas devem se estabilizar. Mas ela está mal assessorada e para isso vai precisar de uma estratégica muito forte" . Ainda segundo Lemos, o governo precisa se esforçar para que o arrocho nas contas não impacte os programas sociais, que beneficiam a maior parte do eleitorado petista.   Manifestação de apoioEntidades culturais de Campinas fizeram um manifesto nesta sexta-feira (13) de apoio ao protesto de domingo. No texto, disseram que "se sentem afrontadas pela desfaçatez com que o dinheiro público é malversado" . Afirmaram ainda que a manifestação pode provocar mudança no panorama político brasileiro.   A carta é assinada pela Academia Campinense de Letras, Ballet Harmonia, Casa do Poeta de Campinas, Conservatório Carlos Gomes, Clube da Lady, Clube dos 21 Irmãos Amigos, Academia Campineira de Letras, Ciências e Artes das Forças Armadas, Grupo Confraria das Divas, Academia Campineira de Letras e Artes, Associação Brasileira Carlos Gomes de Artistas Líricos (Abal), Fórum Municipal de Cultura, Clube Soroptimistas - Brasil, Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas, Centro de Poesia e Artes de Campinas e Centro Campineiro de Arte e Folclore. Leia o manifesto divulgado pelo grupo: MANIFESTO À NAÇÃO   AS ENTIDADES CULTURAIS DE CAMPINAS, unidas a vários segmentos da população, vêm a público manifestar a pro-funda consternação em que se encontram, diante da afronta que lhe fazem os poderes constituídos da República, que abdicaram da ética e da decência no exercício das funções de estado; DECLARAM que, como dedicados cidadãos, trabalham, permanentemente com recursos escassos, para manter vivo o que há de melhor na produção da Cultura Brasileira e, por tal motivo, se sentem afrontadas pela desfaçatez com que o dinheiro público é malversado; SENTEM que o orgulho da nação se encontra profundamente ferido, na terra de cidadãos que sempre lutaram pelo respeito aos princípios que devem nortear uma sociedade politicamente organizada; CLAMAM à população do país que manifeste, pacífica, firme, continuada e publicamente seu descontentamento, de modo a provocar mudança no perigoso rumo que está a tomar nossa ainda jovem vida democrática. Campinas, 12 de março de 2015

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