Para professor de filosofia e ética política Roberto Romano, da Unicamp, defende mudanças que permitam maior autonomia de municípios
Roberto Romano: a população da cidade vem de uma onda de indignação própria que teve reflexos no que se viu no domingo (Divulgação/ Unicamp)
Para especialistas consultados de domingo (13) pela reportagem do Correio depois das manifestações por todo o Brasil, há sinais claros de que, além de boa parte do País querer a saída da presidente Dilma Rousseff (PT) do cargo, é preciso agilizar mudanças no atual sistema de administração pública. Além disso, a avaliação é que toda a classe política foi afetada pela presença maciça de pessoas nas ruas contra a corrupção. O professor de filosofia e ética política Roberto Romano, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirma que a manifestação é especialmente interessante para Campinas, que enfrentou recentemente o seu maior escândalo político, com a cassação do ex-prefeito Hélio de Oliveira Santos (PDT), em 2011. Para ele, a população da cidade vem de uma onda de indignação própria que teve reflexos no que se viu no domingo e pode ter fortalecido o movimento. Segundo Romano, a manifestação de rua ajuda a melhorar o clima político no País e agiliza a cobrança de maior responsabilidade dos administradores públicos. Na visão dele, as mudanças realmente importantes e que deveriam acontecer com urgência incluem a reforma política, sem a qual não é possível mudar o cenário atual. Foto: NELSON ALMEIDA O jurista Hélio Bicudo, fundador do PT e que hoje é um critico do partido “As manifestações são apenas passos introdutórios para uma possível mudança estrutural do Estado Brasileiro, que continua antidemocrático, autoritário e centralizado em Brasília”, disse. “Não existe autonomia dos municípios nem dos estados. Há uma supercentralização em Brasília, inclusive de recursos. Os municípios mandam impostos para Brasília e recebem pouco. E aí você está aberto a fábrica da corrupção.” “Eu não diria que as manifestações são fatos históricos absolutos, nem que não tenham importância. Mas que são necessárias uma série de providências, como a democratização dos partidos políticos, por exemplo. Enquanto isso não ocorrer você vai ter esse divórcio entre representantes e representados.” Opinião Para a jornalista Dora Kramer, colunista do jornal O Estado de S. Paulo, o recado que vem das ruas é claro. “Neste domingo, o País não deixou dúvidas de que a paciência se esgotou. Se Lula e o PT ainda achavam que o problema era com Dilma, viram e ouviram que devem colocar as barbas de molho e tirar o cavalo da chuva antes de acreditar que críticas à figura dela, denúncias de golpe e queixas de perseguição política possam sensibilizar a opinião pública”, afirmou. “Pela primeira vez, os protestos tiveram um foco bem definido e incluíram de forma contundente Lula e o PT. Os manifestantes pediram o afastamento da presidente, mas gritaram de forma uníssona em todo o País:”Fora PT”. Descompasso Apesar do engajamento político de milhares de cidadãos por todo o País nas manifestações que se espalharam por mais de 400 cidades, o desejo da população esbarra no descompasso entre o que os manifestantes buscam e o que oferece a legislação política do nosso modelo democrático. "Não há nenhum mecanismo na democracia que possibilite resolver essa situação”, diz Wagner de Melo Romão, professor do Departamento de Ciência Política da Unicamp. Ainda segundo o cientista político, mesmo com o desgaste da Presidência da República e o peso da atual situação econômica do País, não existe nenhum mecanismo institucional que possibilite solucionar, de pronto, a crise política e econômica. “Tenho dúvidas da saída da presidente. Seu estilo e trajetória de vida indicam que não irá renunciar”, acredita. O esforço do governo agora é manter o apoio no Senado, articular forças no Congresso e em diversos setores da sociedade. Prova disso é o ato marcado para a próxima sexta-feira, dia 18. O maior problema agora, na análise de Romão, que acompanhou as manifestações como estudioso político, é a insatisfação generalizada com a classe política. Apesar de o foco estar no PT, Dilma e Lula, há um descontentamento generalizado com os políticos. “Não vimos nenhum tucaninho, nenhum símbolo de partido. Em São Paulo, Aécio Neves, Paulinho da Força e Marta Suplicy foram hostilizados pelos manifestantes. A situação atual está muito parecida com a enfrentada na Argentina em 2001, com os argentinos descontentes com todos os políticos”, compara. O mais preocupante é que, apesar das lideranças das entidades apartidárias já terem estabelecido conexões com políticos oposicionistas, isso não reflete o pensamento de milhares de pessoas que apóiam os movimentos populares. “Está sendo criada uma situação muito difícil. Um descompasso entre o que as ruas desejam, o que as classes políticas defendem, e o que é possível com as instituições políticas da nossa democracia. Nem a comissão de pedido de impeachment foi criada. A primeira foi impugnada”, ressalta. Apesar da necessidade de urgência nas reformas, como pedem os agentes econômicos que buscam a saída da presidente, na opinião do cientista político da Unicamp sua renuncia não resolveria a situação.Na hipótese de Michel Temer assumir o cargo, os problemas também não seriam resolvidos. Mesmo se ele conseguisse o apoio dos oposicionistas, algo que já é discutido nos bastidores, formando um governo de “salvação nacional”, ainda assim o cenário seria complexo. 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