EFEITO COLATERAL

Pandemia faz explodir acidentes com álcool

Usado para evitar contágio pela covid, casos de queimaduras aumentam 90%

Gilson Rei/ Correio Popular
19/04/2021 às 11:59.
Atualizado em 21/03/2022 às 22:18
Homem usa álcool em gel em espiriteira: procedimento não é recomendado porque o produto, embora considerado menos perigoso, também pode causar sérios acidentes (Ricardo Lima/ Correio Popular)

Homem usa álcool em gel em espiriteira: procedimento não é recomendado porque o produto, embora considerado menos perigoso, também pode causar sérios acidentes (Ricardo Lima/ Correio Popular)

O uso mais frequente de álcool líquido e em gel, impulsionado pelas regras de prevenção na pandemia por covid-19, resultou em um aumento de 90% nos atendimentos de queimaduras graves causadas por esses produtos no Centro de Tratamento de Queimaduras (CTQ), localizado na Santa Casa, da Irmandade de Misericórdia de Campinas, entre março do ano passado e março deste ano. Somente em 2020, foram registradas 178 internações no Centro de Queimaduras, sendo 160 delas pelo uso do álcool, representando 90% do total.

Nos três meses deste ano, os índices com álcool aumentaram ainda mais. Atualmente, o CTQ está com 100% dos leitos ocupados e todos acolhendo pessoas que sofreram queimaduras com álcool, afirmou Flavio Nadruz Novaes, coordenador do Centro.

Dados do Centro de Queimaduras revelam que, desde o início da pandemia, pacientes com queimaduras por álcool tornaram-se constantes. Novaes afirmou que, entre janeiro e outubro de 2020, houve um aumento médio de 83% nas ocorrências de queimaduras com o produto. "Em 2019, aproximadamente 20% a 30% dos atendimentos eram por conta do álcool e, em outubro, passou a representar 60% dos casos", afirmou. “Atualmente 100% dos casos são provocados por acidentes com álcool", disse.

Os registros de acidentes com o produto aumentaram a partir de dezembro do ano passado e mantiveram-se altos no primeiro trimestre deste ano, quando veio a segunda onda da pandemia. O CTQ conta com 12 leitos e todos estão ocupados desde a última semana de março.

A ocupação de leitos manteve-se com uma média de 84% no ano passado, sendo a menor taxa em abril, com 73% de ocupação. Em julho, chegou a 94%, mas atualmente está em 100%.

O médico coordenador explicou que a permanência dos pacientes nos leitos tem um período médio de 18 dias, mas há casos que chegam a até seis meses. Um dos casos mais graves no ano passado foi de uma pessoa com 70% do corpo queimado em terceiro grau, que passou por infecções e cirurgias.

Novaes alertou sobre os cuidados que as pessoas devem ter no manuseio do álcool. "Os casos de queimaduras graves neste período de pandemia cresceram em todo o País e medidas preventivas simples podem evitá-los", comentou. Dentre as dicas, as pessoas devem deixar o álcool longe do fogo e evitar que crianças acessem com facilidade os frascos ou litros. "A prevenção é sempre melhor que remediar, pois evita danos, dores e sofrimento", alertou.

Novaes destacou a importância do uso racional desse produto. "A pandemia trouxe o álcool de volta para casa por necessidade, mas é muito importante o uso responsável", alertou. "Muita gente está estocando álcool em galões para usar na limpeza, mas deve ter muito cuidado no manuseio. Não deve usar também próximo do fogo", comentou.

Lavar produtos com água e sabão é melhor, mais efetivo e econômico, segundo o médico. "Sempre que puder usar água e sabão, é melhor que o uso do álcool, tanto para as mãos como para limpeza em geral e higiene de produtos de supermercado entre outros", recomendou Novaes.

O médico destacou que o uso de álcool em gel é mais seguro que o uso do líquido, porém é também inflamável, é um risco e deve haver um cuidado sempre. "Quando a pessoa deixa cair um pouco de gel na roupa, por exemplo, deve ter cuidado com faíscas e fogo, pois pode até se queimar com isso", lembrou.

Os acidentes mais frequentes são os domésticos. "Muita gente chega com queimaduras em acidentes próximos ao fogão, pois limpam com álcool para eliminar o vírus na cozinha e, depois vão acender para cozinhar ou esquentar algum alimento. Faíscas também provocam incêndios e queimaduras quando vão utilizar o álcool para limpeza de objetos e para acender churrasqueiras", afirmou o médico. "Uma mulher e sua filha queimaram-se gravemente quando foram acender a boca do fogão, após terem feito limpeza do mesmo com álcool", exemplificou.

Outro tipo de acidente ocorre quando a pessoa vai acender um cigarro e não percebe que tem álcool por perto, ou porque passou álcool em gel nas mãos antes de fumar. "Há casos de queimaduras também de fumantes dentro do carro, com álcool gel em frasco, usado para higiene contra a covid-19", comentou. Muitos acidentes na pandemia estão ocorrendo também com pessoas em situação de rua. O morador de rua está usando o álcool na lata para acender uma espiriteira porque o preço do gás está muito alto. "O centro de queimaduras já atendeu casos graves por conta dessa prática, que aumentou na pandemia", comentou o médico.

O que fazer

Novaes afirmou que, quando uma pessoa se queima, o ideal é interromper o processo, ao extinguir o fogo. Posteriormente, a pessoa deve usar água na pele, sem utilizar qualquer outro produto, pomada, pano etc. Na sequência, deve procurar urgente um médico para avaliar a melhor forma de tratamento.

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