CARÊNCIA SISTÊMICA

Onde a vulnerabilidade faz morada

Região Noroeste de Campinas concentra 50 mil pessoas que vivem com um salário mínimo por mês

Raquel Valli/ Correio Popular
25/03/2021 às 17:32.
Atualizado em 21/03/2022 às 23:51
Desempregado, o segurança Sergio Luis Pires, morador do Campo Grande,  vende DVDs para tentar bancar as despesas mensais  (Kamá Ribeiro/ Correio Popular)

Desempregado, o segurança Sergio Luis Pires, morador do Campo Grande, vende DVDs para tentar bancar as despesas mensais (Kamá Ribeiro/ Correio Popular)

O contingente de pessoas em condições de vulnerabilidade econômica na região Noroeste de Campinas cresceu 17% desde 2010, segundo estudo realizado pela professora Vera Plácido, da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). A área é composta pelo distrito do Campo Grande e pelos jardins Londres e Garcia. A pesquisa leva em conta a inclusão no Cadastro Único da Assistência Social, que permite aos inscritos a obtenção de apoios nos programas sociais. Em 2010, havia 42.604 pessoas cadastradas. Hoje, são 50.255 sobrevivendo com um salário mínimo por mês.

De acordo com a docente, o indicador é extremamente preocupante, não só pelo aumento de casos, mas por causa da exclusão social dos marginalizados. Os números foram obtidos com em fontes de dados fornecidas pela Prefeitura, com a Fundação Feac - que presta assistência social - com o Observatório da PUC-Campinas sobre Vulnerabilidade Social e com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

"Se não é possível suprir as necessidades básicas, o que dizer de outras necessidades? Estamos falando de pessoas que não conseguem sequer acessar o serviço público", afirma Vera Plácido.

"É uma região muito nova, de grandes mudanças territoriais que não são acompanhadas pela presença do poder público", acrescenta a professora.

Em relação ao que deve ser feito para enfrentar esse quadro de vulnerabilidade, a especialista aponta a urgência da adoção de políticas públicas integradas. "As pessoas precisam ser assistidas pensando em uma rede de proteção. A vulnerabilidade não é apenas a carência deste ou daquele atributo: não é a renda, a educação ou a saúde. Não são elementos isolados. Estamos falando de uma vulnerabilidade sistêmica. Precisamos nos organizar em uma rede intersetorial, assistindo essas pessoas que estão não apenas marginalizadas, mas verdadeiramente excluídas", observa Vera Plácido.

O estudo foi apresentado esta semana em uma videoconferência realizada pela Câmara Municipal de Campinas. Vai ajudar a compor o diagnóstico da região, que deve estar presente no relatório final do Legislativo sobre da Comissão do Campo Grande. "Não podemos aceitar que as pessoas vivam com menos de um salário mínimo. Temos que fazer a inclusão social e vamos perseguir isso", declara o presidente da comissão, o vereador Cecílio Santos (PT). A vereadora Guida Calixto (PT) também participou da reunião. Ele entende que muitas pessoas em Campinas "foram expulsas dos locais onde estavam atrás da sobrevivência", mas que elas não querem sair de seus bairros, mas "melhorar o local onde estão".

Os parlamentares decidiram realizar mais discussões em três eixos: planejamento urbano, desenvolvimento econômico e políticas públicas. Nos próximos dias, a Comissão divulgará as futuras atividades, o que inclui abrir o debate junto à população do Campo Grande com reuniões remotas à noite. O objetivo é encerrar os trabalhos em junho, para que propostas sejam encaminhadas à Prefeitura. O objetivo é incluí-las no Plano Plurianual, que será finalizado no segundo semestre.

Carências são múltiplas na região Campo Grande

Brenda Tchorny tem 28 anos, e uma filha de ano e dois meses. É auxiliar de produção, mas está desempregada. Sobrevive vendendo bolinhos através das redes sociais e pelo Whatsapp. "Ultimamente, eu tenho andado bem triste. Não tenho dinheiro para comprar as coisas para minha filha, e se eu pudesse sairia à rua para vender os doces", afirma. Brenda mora de favor na casa da avó, de 81 anos, que é aposentada.

O segurança Sergio Luis Pires, de 48 anos, também perdeu o emprego. Estava na Praça da Concórdia, ontem, vendendo algumas mercadorias. "Eu tenho medo de sair de casa, mas eu preciso correr atrás. Pago aluguel e pensão do meu filho, e está tudo muito difícil", lamenta.

O técnico em telefonia Lucas Martins de França, de 27 anos, se sente privilegiado em meio a toda essa situação. "Faz quatro anos que trabalho com carteira assinada. Mas, eu sei como as coisas estão complicadas para o pessoal desempregado. A gente conversa com os amigos, e todo mundo está dizendo que o bicho é feio. Mas, eu me sinto afortunado em meio a tudo isso", reconhece. 

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Correio Popular© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por