editorial

Omitir dados em plena era da informação

Informação é commodity preciosa que norteia políticas públicas e salva vidas. Faltar com a transparência é jogar contra o interesse público

Do Correio Popular
Do Correio Popular
10/06/2020 às 11:22.
Atualizado em 29/03/2022 às 09:31

Se já não bastasse a sucessão de desacertos do governo Bolsonaro na condução da pandemia — a lista é extensa, mas vale lembrar das trocas dos ministros da Saúde, da insistência na discutível cloroquina, do negacionismo da doença, do desprezo ao sofrimento, da relativização das mortes e dos impropérios com governadores e prefeitos, dificultando o alinhamento das ações de combate à Covid-19 —, o Brasil encerrou a semana passada criando mais uma polêmica de repercussão internacional: a mudança no protocolo de divulgação dos números da pandemia, sob o argumento de que passaria a compilar, de forma diferente, os dados de mortos, infectados e curados. A reação dos especialistas foi de espanto, pois estava em curso uma tentativa óbvia de alinhar os números da tragédia à visão palaciana de minimização da emergência sanitária, como se isso fosse possível. Tudo começou com a mal-sucedida decisão de adiar a divulgação — antes ocorria por volta das 19h, passando depois para as 22h — para evitar que os principais telejornais brasileiros noticiassem os dados. O tiro saiu pela culatra, pois, em plena era da informação, os veículos têm meios, recursos e agilidade para checar e oferecer a informação ao público praticamente em tempo real. Além disso, imediatamente o conselho que reúne os secretários estaduais de Saúde avocou para si a tarefa de somar os dados dos estados e passar para os veículos, o que continuará sendo feito. Bolsonaro não escondeu seu desejo de vingar a Globo (“acabou Jornal Nacional”, disse, em tom de deboche), sob a visão de que a TV seria o arauto do negativismo e do morticínio. Os maiores veículos do País, inclusive, se reuniram em consórcio para oferecer à população os dados da pandemia. É sabido que o momento da cobertura impôs ao conjunto dos veículos de comunicação, incluindo este Correio, um tom mais cinza. A emergência sanitária tem mobilizado a maioria dos profissionais de todas as redações que praticam o jornalismo profissional no Brasil e nos países atingidos pela pandemia. É natural que o resultado seja, infelizmente, uma média negativa. Isso não significa que os veículos não estejam se esforçando para trazer notícias positivas e relatos de solidariedade e esperança. Vale o convite para os que repudiam a cobertura que observem esses pontos de escape ao longo das edições impressas, digitais e eletrônicas. Mudar a plataforma de divulgação embute o desejo de interferência num modelo que vinha sendo utilizado. Informação é commodity preciosa que norteia políticas públicas e salva vidas. Faltar com a transparência é jogar contra o interesse público.

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