ACIMA DO LIMITE

Ocupação de UTI neonatal atinge 114% em Campinas

Situação é considerada “muito preocupante” pela Secretaria Municipal de Saúde

Ronnie Romanini
13/04/2022 às 08:31.
Atualizado em 13/04/2022 às 08:31
Das 26 crianças hospitalizadas em leitos de UTI neonatal no Hospital Maternidade ontem, duas possuíam o Vírus Sincicial Respiratório (VSR); as demais são casos de prematuridade (Gustavo Tílio)

Das 26 crianças hospitalizadas em leitos de UTI neonatal no Hospital Maternidade ontem, duas possuíam o Vírus Sincicial Respiratório (VSR); as demais são casos de prematuridade (Gustavo Tílio)

Campinas está com mais de 100% de ocupação dos leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal e nos de terapia semi-intensiva. A superlotação, que atinge 114%, fez com que o secretário municipal de Saúde, Lair Zambon, solicitasse uma reunião com a Secretaria Estadual de Saúde para discutir o fortalecimento da rede de UTI neonatal do município e da região. Isso porque 35% de todos os internados seriam de outras cidades encaminhados a Campinas, o que causou a situação de ocupação acima da capacidade máxima há dias. 

De acordo com a Prefeitura, normalmente, o número de hospitalizações de bebês de fora da cidade fica em torno de 15%. "Os dados são extremamente preocupantes, pois o município não consegue absorver uma demanda tão alta da região", explicou o secretário. 

Campinas conta com 34 leitos de UTI neonatal e 21 de terapia semi-intensiva, porém, até ontem, eram 39 pacientes em UTI e 24 nas semi-intensivas. Com 22 leitos de UTI e 17 de semi-intensiva, a Maternidade de Campinas tinha 26 e 20 pacientes, respectivamente, acima da capacidade total. O Hospital PUC-Campinas, com 12 leitos de UTI e 4 de semi-intensiva, tem 17 pacientes, um a mais que o limite suportado.

Segundo a diretora do Departamento de Gestão e Desenvolvimento Organizacional (DGDO) da Secretaria de Saúde, Erika Guimarães, alguns fatores ajudam a explicar a superlotação, como o fato de o Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism) estar em reforma e o início do outono, período em que há mais casos de doenças respiratórias em crianças. Ela também citou o alto número de ocorrências de prematuridade.

"Boa parte delas está vinculada a condições preexistentes da mãe. São casos de infecção urinária e corrimentos vaginais não tratados que levam a mulher a ter um parto prematuro. Fazemos o apelo para que as gestantes valorizem o seu pré-natal, a realização dos exames, sigam os tratamentos indicados e, em diante de alguma queixa de dor ou ardor para urinar, algum corrimento diferente, com cheiro forte, procure rapidamente as unidades para que seja feito o diagnóstico o mais precoce possível, evitando-se o trabalho de parto prematuro".

Segundo a diretora, a região já registrava um déficit de leitos de UTI neonatal e a reforma no Caism causou uma restrição de acesso, o que acabou impactando os serviços sob gestão municipal. “Temos outros hospitais na região, como o Hospital Estadual de Sumaré, outras referências... Entendemos que eles também estão sobrecarregados e precisamos de uma força-tarefa para ampliar esses leitos de forma emergencial", completou Erika.

De acordo com a Pasta de Saúde de Campinas, "todos os bebês que necessitam de tratamento intensivo estão sendo atendidos e acompanhados". Os leitos de UTI e semi-intensiva são destinados a crianças com até 28 dias que nasceram prematuras ou com doenças graves. 

Na nota enviada ao Correio, a Prefeitura afirmou que Campinas não transfere pacientes para outras cidades e que "os leitos são dimensionados para atender à demanda do município".

Maternidade de Campinas

O médico ginecologista e obstetra e também presidente da Maternidade de Campinas, Marcos Miele da Ponte, afirmou que a situação dos leitos excedidos na sua total capacidade é bem complicada. Além da superlotação, que obriga o hospital a realocar e locar novos equipamentos e a redirecionar a equipe médica e de enfermagem, ele mencionou que, atualmente, há três gestantes na enfermaria de gestação de alto risco aguardando resolução do parto, ou seja, que uma cesárea seja feita para evitar o sofrimento fetal. 

"São gestações prematuras. Não são crianças de trabalho de parto, são gestantes acompanhadas de perto, com quadro clínico instável. Pelo tempo de gravidez, de seis para sete meses, com certeza essas crianças quando nascerem vão para a UTI neonatal", vaticinou.

Ele também reportou a situação de superlotação que perdura desde janeiro na Maternidade, cuja ocupação oscilou entre 22 - a capacidade máxima de UTIs - e 28 assistidos no dia a dia. "O que atrapalha um pouco a nossa assistência é que, sistematicamente, esses leitos são regulados pela Central de Regulação de Ofertas e Serviços de Saúde (Cross) do Estado de São Paulo, em conjunto com o sistema de regulação do município. O sistema do Estado encaminha continuamente pacientes para cá mesmo sem termos vagas. Eles praticam o que é chamado de 'vaga zero'. Ou seja, eles priorizam a ida do paciente de um lugar que tem menos recursos para outro com mais. Entretanto, esses locais com mais recursos, como a Maternidade e outros hospitais de Campinas, estão trabalhando acima da capacidade e nós temos que redimensionar os leitos para esses recém-nascidos que necessitam de assistência".

O obstetra comentou ainda que, embora a população esteja aumentando nos últimos anos, na última década, o mesmo não aconteceu com os leitos de UTI neonatal. Ele lembrou que no início do século o total de leitos na Maternidade saltou de 18 para 22, porém, depois disso não houve um aumento real de leitos em nenhum dos principais hospitais. "É necessário ter uma política de redistribuição dessas vagas, novos investimentos em saúde e a colocação de mais leitos à disposição da população. Em paralelo a isso, a assistência pré-natal precisa ser melhor desenvolvida. Existe um grau de desenvolvimento, principalmente em Campinas, mas talvez se precise de uma avaliação melhor dos fatores de risco que podem desencadear o parto prematuro", justificou.

Das 26 crianças hospitalizadas em leitos de UTI neonatal na Maternidade ontem, duas possuíam o Vírus Sincicial Respiratório (VSR) e o restante, são casos de prematuridade. Embora a Maternidade afirme que nenhuma criança está sendo desassistida neste momento, a capacidade é limitada. Além disso, com o VSR tendo uma incidência maior a partir do outono, a preocupação - e a projeção - é a de que a situação ainda pode piorar.

Saúde estadual

Questionada sobre a situação em Campinas, a Secretaria Estadual de Saúde informou que "segue acompanhando o cenário e mantém diálogo com gestores regionais para análises técnicas e definição das estratégias assistenciais e reforça que, durante o monitoramento permanente que realiza, pode haver ampliação de leitos. Atualmente, a região de Campinas conta com 77 leitos de UTI neonatal. Importante ressaltar que a abertura de leitos não é prerrogativa exclusiva do Estado, cabendo também aos municípios e à União."

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