O 'guardião das árvores' que nada contra a maré

Seo Sebastião tem na ponta de língua todas as espécies que plantou em 20 anos por todo o bairro Jardim Von Zuben, em Campinas. Mas também lamenta por saber quais árvores que foram arrancadas pela vizinhança ao longo desses anos. “Seu” jardim principal é a Praça das Saúvas, nome que inclusive ele brigou para que não fosse instituído, porque remete à formiga. Mas como sua paixão por plantar não ficou restrita somente à praça, há dois anos ele investe no cultivo de centenas de espécies, frutíferas e muitas delas raras no Brasil, em uma área pertencente a um hipermercado.O local, um barranco enorme de grama, que antes era usado para despejo de lixo, ganhou vida, e o aposentado de 64 anos passa longas horas cultivando e cuidando do seu exclusivo canteiro. O hipermercado não contestou sua investida em área verde, e segundo ele deve estar até agradecendo.Nesse novo local Sebastião Alves Medeiros começou a plantar após perceber os primeiros sinais de boicote de suas mudas, plantadas na praça. Vizinhos igualmente antigos naquele pedaço arrancavam no mesmo dia as mudas que o aposentado plantava. A retaliação, segundo explicou decepcionado, é porque algumas pessoas não querem que uma floresta se erga em frente de suas residências, e torne a praça ainda mais perigosa, principalmente à noite.“Dizem que vai virar uma floresta e ficar perigosa a praça. Mas os que reclamam passam o dia dentro de casa. Tem que fazer igual a mim, passar o dia plantando, ao ar livre”, propõe o ex-metalúrgico. Ele é responsável pelo plantio de 90% das mudas que hoje são frondosas árvores, como eucaliptos, mangueiras, flamboyants e ipês, que deram vida para a enorme Praça das Saúvas.O seu prazer é plantar e falar sobre o que plantou. Na área que ele encontrou para ficar na “paz” com a vizinhança, já são mais de 600 mudas. Com sua carriola e três enxadas diferentes, passa longas horas carpindo, regando e plantando mais mudas. Dentre as espécies frutíferas estão cajueiros, abacateiros, graviolas, araçás, jabuticabeiras e outras tantas. Também estão ali Pau-Brasil, aroeira, sibipiruna, embaúba, pinheiro, paineiras e dezenas de outras que vão formar daqui uns anos um bosque agradável e frutífero. “Cuido para que fique uma área, que antes era degradada, com muita sombra e verde”, disse.Andando depressa entre as espécies, Seo Sebastião encontra um pé de romã trazido de Israel por ele, e que “pegou” bem com o clima de Campinas. Próximo dessa fruta está um jasmim-do-havaí, trazido pela filha que vive naquele estado americano. “Não sei se vou ver crescer tudo o que plantei aqui, mas vou deixar para as próximas gerações, com certeza”, disse o ex-metalúrgico, que fez curso de jardinagem para poder deixar o canteiro mais formoso.Nascido em Canaã, Minas Gerais, até os 19 anos trabalhou na lavoura com a família. Relembra que plantava feijão sob a luz do luar, para seu próprio sustento. Apesar de trabalhar com maquinário pesado durante muitos anos em indústrias, Seo Sebastião nunca deixou a paixão pelas plantas de lado, e avisa: “A vida passa tão rápido. Precisamos fazer alguma coisa que faça a diferença”, finalizou.