Quem pretende viajar para fora do País e as empresas que importam insumos comemoram a baixa. Mas, para alguns setores da indústria e do agronegócio, o recuo é motivo de preocupação
Novas diretrizes do Banco Central tendem a fazer com que a moeda americana não suba muito - nem caia demais (Cedoc/RAC)
O dólar começou o ano acima dos R$ 4,00 e nesta terça já caiu para em torno dos R$ 3,30. Quem pretende viajar para fora do País e as empresas que importam insumos comemoram a baixa. Mas, para alguns setores da indústria e do agronegócio, o recuo é motivo de preocupação - se a queda se acentuar demais, vai acabar prejudicando as exportações. A alta do dólar no começo deste ano deu novo fôlego para essas empresas e elevou os ganhos da balança comercial. Mas agora há uma grande incerteza no câmbio. A avaliação dos especialistas é que as oscilações da moeda americana devem-se ao fatode o mercado ainda estar precificando o valor diante do impacto de fatores internos (como a crise política) e externos (como a saída do Reino Unido da União Europeia). De certeza, apenas uma: ninguém aposta em uma cotação acima dos R$ 4,00 no atual cenário, uma vez que o Banco Central, agora sob comando de Ilan Goldfabj, adotou uma postura de intervir menos no câmbio, deixando ao mercado encontrar seu próprio patamar para o dólar. Mas os especialistas lembram que intervir menos não significa não intervir em hipótese alguma: se a cotação cair abaixo dos R$ 3,20, apostam, o BC certamente adotará uma ação mais agressiva. A cotação menor do dólar, no entanto, já provocou um forte aumento nos negócios nas casas de câmbio, que estão vendendo mais tanto a moeda americana quanto o euro - a ponto de, nos dias de queda mais forte do dólar, a moeda chegar a se esgotar. A razão da procura é óbvia: muita gente está aproveitando a cotação melhor para comprar moeda pensando em uma viagem futura, numa mudança de tática - se antes se comprava pequenos valores de forma mais espaçada sempre que a cotação era um pouco mais favorável para compor um “fundo de viagem”, agora a ordem é aproveitar esses dias de baixa para comprar o máximo possível. As agências de turismo também já começam a sentir a volta do interesse dos turistas pelos pacotes internacionais - mas lembram que as vendas dependem não apenas da cotação das moedas, mas também das promoções das operadoras e das companhias aéreas. “Há mais procura por informações sobre viagens para os Estados Unidos e Europa, mas ainda não é possível mensurar quantas dessas consultas se tornarão de fato em vendas. Além da moeda, os consumidores buscam por promoções”, disse o vice-presidente da Associação das Agências de Viagens Independentes do Interiordo Estado de São Paulo (Aviesp), Marcos Antonio Carvalho Lucas, para quem o setor vai crescer até 10% neste ano. O CEO da Costa Brava Turismo, Rubens Schwartzmann, também acha cedo para falar numa retomada das vendas de pacotes internacionais. “A questão não se resume apenas ao dólar. A crise econômica afetou a renda do brasileiro e é inevitável que as pessoas cortem do orçamento as viagens. No entanto, percebemos alguma melhora na área corporativa em junho. A mudança de humor das empresas está tendo impacto nas viagens”, observou. Indústria Para que atua em outras áreas, porém, a queda do dólar pode não ser uma boa notícia, dependendo de até onde ela vá. O presidente do Sindicato das Indústrias de Tecelagem de Americana, Nova Odessa, Santa Bárbara d’Oeste e Sumaré (Sinditec), Dilézio Ciamarro, por exemplo, afirmou que, por hora, o patamar do dólar em torno dos R$ 3,30 ainda é favorável para a indústria. “Não chega a inviabilizar as exportações. Mas um câmbio abaixo dos R$ 3,00, como já aconteceu no passado, acaba com a competitividade do produto nacional. No entanto, o dólar é só um dos fatores que afetam o setor. Precisamos de uma política que proteja a indústria e fomente o crescimento”, comentou. Já o gerente financeiro da Ceva Saúde Animal, Daniel Smelan, afirmou que o recuo do dólar tem reflexo positivo sobre os custos da empresa. “Nossos insumos são importados e o câmbio atual reduz os custos. Com o dólar elevado, gastamos mais na compra da matéria-prima, mas não conseguimos repassar para os preços”, comentou. A Ceva também tem a vantagem de atuar no setor do agronegócio, cujo crescimento das exportações impulsiona suas próprias vendas. Análise O professor da Fundação Dom Cabral, Geraldo Figueiredo Filho, afirmou que o dólar acima de R$ 3,70 impulsionou alguns setores da indústria e também o agronegócio. Entretanto, a estratégia não foi uma política de governo para alavancar a economia, mas uma reação do mercado à crise política. “O dólar caiu 8% só no último mês, por conta da estratégia atual do Banco Central é de deixar o câmbio flutuar e intervir menos. O dólar está buscando um ponto de acomodação. E a maior preocupação do Banco Central é evitar volatilidade”, ressaltou. O professor da IBE/Fundação Getúlio Vargas (FGV), Paulo Ferreira Barbosa, afirmou que o dólar não tem mais sustentabilidade a R$ 4,00 como no início deste ano. “O mercado ainda está ajustando o valor da moeda, mas não vejo espaço hoje para um patamar acima de R$ 3,50. Os setores da economia terão que trabalhar com esse cenário e as empresas terão que buscar mais eficiência para manter seus negócios”.