jair bolsonaro

No caminho de Campos Sales

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) viveu a primeira infância em Campinas. Morou em uma casa de estilo colonial que ainda está de pé

Rogério Verzignasse
30/10/2018 às 08:35.
Atualizado em 05/04/2022 às 23:06

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) viveu a primeira infância em Campinas. Morou em uma casa de estilo colonial que ainda está de pé, bem de frente à histórica Fábrica de Chapéus Cury, na Vila Itapura. Ele passou a adolescência no Vale do Ribeira, mas voltou à cidade para estudar na Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx).  Mas a passagem foi rápida. Ele ingressou na instituição em 19 de março de 1973, conforme registro na página 324 do Boletim Interno. Saiu no dia 28 de fevereiro de 1974, um ano depois, às vésperas de completar 19 anos. Justamente por ter sido aprovado no concurso de admissão da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). No Rio, onde se formou, ele também começou sua carreira política, no final da década de 1980. O próprio Bolsonaro, duas semanas antes da vitória nas urnas, gravou um vídeo declarando seu amor à cidade, e se autodenominando “campineiro genérico”. Ele arrebanhou por aqui nada menos que 401.284 votos (68,82% do total) — índice percentual bem maior que os 55% alcançados a nível nacional —, o que comprovou a identificação entre o que pensa o eleito e os eleitores. Outro fato curioso é que, 120 anos depois, o Brasil elege um presidente que começou a vida em Campinas. Como Campos Sales em 1898, Bolsonaro assume com o propósito de cortar gastos públicos. No passado Manuel Ferraz de Campos Sales herdou um governo quebrado. Para conseguir um empréstimo de 10 milhões de libras junto a credores ingleses, ele assumiu compromissos duros: reduziu drasticamente as despesas do governo e adotou uma política austera em relação aos salários dos trabalhadores. Claro, não foram medidas populares. Mas Campos Sales, que começou o governo com um rombo de 44 mil contos nos caixas públicos, o entregou com sobras de 43 mil contos em dinheiro e 23 mil em reservas de ouro. Ele também foi o primeiro presidente a defender abertamente a privatização, como forma de sanear contas públicas. A mesma pauta Coincidência. O déficit público é exatamente o maior desafio do presidente eleito. Paulo Guedes — que deve assumir a Fazenda e já é considerado o homem forte do novo governo — afirmou que cortar despesas é prioridade. Mais. O vice-presidente eleito, o general da reserva Hamilton Mourão, chegou a afirmar que o 13º salário — direito legal dos trabalhadores — é um peso carregado pelos empresários do Brasil. A afirmação gerou um mal-estar tremendo na campanha. Tanto é que o general foi desautorizado pelo próprio Bolsonaro a falar sobre o assunto. As lideranças políticas de oposição — como o derrotado PT — imediatamente associaram a candidatura rival ao corte de direitos trabalhistas. Como fez Campos Sales. Resta à sociedade saber se Bolsonaro, no Executivo, vai conseguir sanear as contas públicas como fez, no passado, o ícone do movimento republicano nacional. É bom lembrar, por sinal, que o campineiro Campos Sales deixou o governo, em 1902, debaixo de uma chuva de críticas e índices baixíssimos de aprovação popular. Pais do capitão nasceram em Campinas O protético Percy Geraldo Bolsonaro e a mulher dele, Olinda, nasceram em Campinas. Se casaram na Catedral Metropolitana. Depois, se mudaram para a pequena Glicério, na região de Araçatuba, onde o marido trabalhou em um consultório odontológico. Lá Jair nasceu, em março de 1955. Mas o menino só foi registrado em Campinas no dia 23 de outubro, quando a família estava de volta. No Cartório Santa Cruz, o registro afirma que a família morava no número 151 da Rua Barão Geraldo de Rezende, na Vila Itapura. Casinha antiga, com fachada de blocos vermelhos e detalhes arquitetônicos do período colonial. Mas a história do clã na cidade vinha de longe. O bisavô materno do capitão da reserva Jair Bolsonaro, Carl Hintze, nascido na Alemanha, trabalhou vendendo anúncios e assinaturas do jornal. O Getulino, que publicava reportagens em defesa da comunidade negra, no começo do século passado. O próprio presidente do PSL em Campinas, André Ribeiro, conta que a família chegou a ser proprietária de um imóvel na Rua Saldanha Marinho, ponto hoje tomado por botecos que servem à prostituição. “A história de Bolsonaro em Campinas surpreendeu até a gente. Não tínhamos ideia de que a ligação dele com a cidade era tão forte. Como não tínhamos ideia desse fenômeno eleitoral que tomou conta do País. Tudo aconteceu muito rápido”, fala. Apesar da primeira infância em Campinas, Jair Bolsonaro passou a adolescência em Eldorado Paulista, no Vale do Ribeira, e só voltou para cá quando começou a estudar na EsPCEx. Mas se mudou para o Rio de Janeiro, onde seguiu carreira militar e iniciou a trajetória política. O QUARTO PRESIDENTE DA HISTÓRIA DO PAÍS CAMPOS SALES Manuel Ferraz de Campos Sales, nascido em Campinas em fevereiro de 1841, foi advogado e quarto presidente da República (1898-1902). Ele fez história ao integrar o grupo político que fundou o movimento republicano. Chegou a governar São Paulo antes de renunciar e se candidatar à Presidência da República. Ele foi eleito com 91% dos votos. No poder, enfrentou rebeliões dos imigrantes italianos que trabalhavam na lavoura de café e denunciavam a exploração a que eram submetidos pelos fazendeiros. Assassinatos foram registrados durante tais protestos. No poder, Campos Sales ficou conhecido por sanear as contas do governo, com forte corte nos investimentos públicos. Mas na época fábricas fecharam e a economia estagnou. Ele morreu em 1913, em grave situação financeira pessoal. PERFIL Jair Messias Bolsonaro nasceu em 21 de março de 1955 em Glicério, região de Araçatuba, mas se mudou ainda bebê para Campinas. Militar, ele começou a carreira política no Rio. Ele se tornou conhecido do público em 1986, quando escreveu um artigo para a revista Veja, onde criticava salários de oficiais militares. Por causa disso, foi preso por quinze dias, apesar de ter recebido cartas de apoio de colegas do Exército. Foi absolvido dois anos depois. Bolsonaro ingressou na reserva em 1988, com o posto de capitão, e começou a carreira política. Foi vereador e deputado federal por sete mandatos. Ficou famoso pela personalidade controversa, pelos elogios ao regime militar e à prática de tortura contra “terroristas”. Ele foi eleito presidente pelo PSL, nono partido da trajetória política.

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