no bairro Chácara Acaraí

Muro divide bairros e gera discórdia entre moradores de Hortolândia

Para alguns, a medida traz segurança, para outros, cria empecilho ao tráfego

Isadora Stentzler/ [email protected]
22/07/2022 às 09:03.
Atualizado em 22/07/2022 às 09:03
Motoboy foi surpreendido ontem ao deparar com o muro reconstruído no bairro Chácara Acaraí, no momento de fazer entregas na região; a alternativa foi retornar e trafegar pela rodovia (Kamá Ribeiro)

Motoboy foi surpreendido ontem ao deparar com o muro reconstruído no bairro Chácara Acaraí, no momento de fazer entregas na região; a alternativa foi retornar e trafegar pela rodovia (Kamá Ribeiro)

A Prefeitura de Hortolândia construiu, há cerca de duas semanas, um muro em cima da Rua Caminho Dois, no bairro Chácara Acaraí, que tem dividido opiniões entre os moradores do entorno. Enquanto para alguns, a medida traz segurança, para outros, ela cria um empecilho ao tráfego. Isso porque o muro bloqueou o acessou a nove bairros, fazendo com que motoristas e motociclistas tenham que recorrer à rodovia para chegar ao outro lado. Na quinta-feira (21), uma câmera de vigilância também foi instalada em um poste da rua, na direção do muro, para monitorar possível vandalismo. 

Segundo a aposentada Eila Orvokki Pykãlãinen, que dos 80 anos de idade, vive há 25 na rua, o muro não é novo. A primeira vez que ele foi erguido foi há quatro anos, a partir de uma iniciativa dos próprios moradores.

Ela conta que, na época, um morador sugeriu a construção do muro para evitar a movimentação de veículos no espaço. Foi feito uma arrecadação entre vizinhos pra pagar o serviço. 

Do outro lado do muro, não havia moradores e o espaço estava vazio. Hoje, o terreno ao lado pertence a uma empresa que abriu um loteamento, mas também não tem ocupação próxima. 

Com o tempo, recorda Eila, o muro começou a ser derrubado por pessoas que trafegavam no local, e que queriam manter o acesso aberto. "Eles abriram uma parte, no lado direito, por onde passavam motos e pedestres. Depois, tiraram tudo e ficou aberto. O problema é que isso causa muito barulho. Eu já sou aposentada e o barulho me impede de descansar. Com o muro aberto, a gente ouve o barulho do movimento até de madrugada, inclusive buzinas. Agora fecharam, há umas duas semanas. Espero que fique assim", defende.

A Associação de Moradores do Bairro Chácara Acaraí, que tem 70 membros que acompanham essa situação, disse que as terras em questão nunca foram públicas e pertencem a uma empresa. 

"Quando o novo proprietário comprou a área, exigiu o fechamento, devido à concessionária Tietê exigir acesso pela rodovia, o que foi endossado por ação pública do Ministério Público e da Prefeitura de Hortolândia. Os moradores não quiseram esperar a Prefeitura executar a obra de fechamento, porque iria levar muito tempo para licitar e tramitar o burocrático para um serviço um tanto barato, e acabaram fazendo em forma de rateio", explica a Associação.

"É evidente e óbvio que moradores não têm essa autonomia, tampouco poder de fazer muros por sua própria vontade em qualquer lugar que seja. É só o cumprimento da decisão da Justiça balizada pelo Ministério Público, Prefeitura de Hortolândia e os proprietários dessas terras", defendeu. Segundo a Associação, quem quebrou o muro, no passado, agiu criminosamente.

O imbróglio é que o muro está construído em um espaço estratégico, usado como acesso dos bairros Jardim São Bento, Jardim São Sebastião, Vila Flora, Parque Figueiras, Novo Cambuí, Remanso Campineiro, Parque Hortolândia, Campo Verde e Jardim Santa Clara para a Chácara Acaraí e Jardim Amanda - lugar com grande concentração de comércios e mercados. 

Devido ao muro, quem vem de algum desses nove bairros precisa dar a volta por um trecho da Rodovia Jornalista Francisco Aguirre Proença (SP-101), conhecida como Campinas-Monte Mor, para acessar o outro lado. 

"Atalho irregular"

Segundo a Prefeitura de Hortolândia, responsável pela obra, a reconstrução do muro foi feita porque o atalho "foi criado irregularmente por pedestres e motoristas sem a garantia de segurança necessária à população". No entanto, imagens do Google Street View mostram que a rua já estava aberta em 2011, inclusive com asfalto. 

"O Plano de Mobilidade Urbana do município não previa aquele acesso", disse, em trecho. "A decisão do fechamento da passagem foi constatada após avaliação que apontou poucas condições de segurança viária no local, sem infraestrutura necessária para garantir a saída segura, tanto de pedestres quanto de motoristas, para a Rodovia Jornalista Francisco Aguirre de Proença (SP-101)." 

A reconstrução foi feita há cerca de duas semanas. O pedreiro José Roberto Ferreira de Souza, de 47 anos, trabalha há dois anos em uma casa, ao lado de onde o muro foi construído. Ele disse que era uma quarta-feira quando foram erguidas quatro fileiras de tijolos para o muro. Mas no mesmo dia, à noite, pessoas em uma van amarraram os tijolos ao veículo e derrubaram o muro.

No dia seguinte, na quinta-feira, a construção foi retomada e Souza disse que viu a Guarda Municipal no local para acompanhar a obra. A construção total, segundo Souza, foi encerrada no sábado daquela semana. 

Questionada, a Prefeitura alegou que a presença de guardas municipais no local, na época, foi para garantir a "determinação da medida e para evitar possíveis ameaças aos trabalhadores que realizavam o serviço".

Trajeto mais longo

Para o pedreito José Souza, no entanto, a obra é um empecilho, já que impede que ele venha ao serviço de forma mais ágil. "Na primeira vez, os motoqueiros quebraram, vieram com uma retroescavadeira, porque o muro impede a passagem deles e eles fazem muitas entregas aqui. Aí, derrubaram o primeiro muro e a Prefeitura veio e jogou um monte de terra. Inventaram de fazer o muro de novo. Não foi um pedido dos moradores para fechar, porque eles mesmo não estão querendo. Para mim, impede a passagem, porque moro no bairro Jardim São Sebastião e venho trabalhar de bicicleta. Hoje, eu tenho que pegar a beira da rodovia e descer até a entrada do Jardim Amanda. Gasto 15 minutos a mais", defende. "Tem que dar uma volta danada."

Na quinta-feira (21), antes da reportagem chegar ao local, uma câmera de monitoramento foi instalada perto da casa onde ele trabalha, em cima de um poste, e voltada para o muro. "Veio um homem instalar. Pelo jeito que ele me falou, quem vai monitorar é a Guarda Municipal", disse Souza.

A Prefeitura, no entanto, negou que tenha enviado algum profissional e instalado a câmera, sendo isso uma iniciativa particular. A reportagem não localizou quem seria o responsável pelo equipamento.

Fechamento gera surpresa 

A reportagem ficou no local por cerca de uma hora. Nesse período, três pessoas - duas em motocicletas e uma numa bicicleta - foram surpreendidas com o trajeto fechado. O ciclista Gabriel Ferreira, de 16 anos, estava do outro lado do muro, no espaço onde já o loteamento. Ele estava pedalando com uma amiga quando viu o muro, bloqueando o acesso. "É muito difícil. Sempre que preciso ir pro Jardim Amanda, eu passo por aqui. Eu moro no São Bento 1. E aqui não estava fechado, tanto que eu ia para a academia e passava por aqui, normalmente. Não tinha nada, nem essa buraqueira. Era só passar e saía direto. Isso dá ódio, porque dificulta a passagem de muita gente. A gente tem que acabar passando pela pista, com perigo de sofrer um acidente", aponta, sobre o trajeto que precisa fazer. 

A buraqueira, a que ele se referiu, é uma fenda aberta no asfalto, ao lado do muro. 

Uma moradora de um condomínio, um pouco mais distante do muro, e que pediu para não ser identificada, disse que vive há 30 anos em Hortolândia e que a rua sempre existiu, constando, inclusive, nos mapas da cidade. Ela entende que a barreira é uma segregação de bairros, sendo que aquele onde mora seria o mais desprezado. 

"Para mim, fica difícil acessar o bairro Jardim Amanda, onde há bancos e os principais comércios. Para voltar ao São Bento, são mais nove quilômetros. Eu não sei o que vai dar isso tudo. O São Bento é um bairro que está abandonado. E as pessoas pagam seus imposto."

Alternativa

Segundo a Prefeitura, estão sendo elaboradas alternativas para sanar o gargalo. Em nota, a Administração Municipal informou que está em andamento um projeto elaborado pela Concessionária Rodovias do Tietê, responsável pela Rodovia Jornalista Francisco Aguirre de Proença (SP-101), para a construção de uma via marginal. A medida, segundo a nota, garantirá a ligação entre os bairros. "Uma nova diretriz viária para a região será realizada pela Concessionária Rodovias do Tietê. As avaliações para a readequação da dinâmica do fluxo do trânsito na cidade acontecem, periodicamente, priorizando a segurança viária."

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Correio Popular© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por