NO JD. CAMPOS ELÍSEOS

Mulher cobre calçada com vidros para evitar os moradores de rua

Além da falta de humanidade da ação, autora da ‘obra’ cometeu um crime e poderá responder por ele

Isadora Stentzler
07/04/2022 às 08:44.
Atualizado em 07/04/2022 às 08:44
A "obra" da vizinha; o gerente da empresa, Renato Correia, definiu a situação como "inaceitável" (Kamá Ribeiro)

A "obra" da vizinha; o gerente da empresa, Renato Correia, definiu a situação como "inaceitável" (Kamá Ribeiro)

Uma moradora da Avenida Justiniano de Melo Franco, no bairro Jardim Campos Elíseos, em Campinas, concretou cacos de vidro na calçada ao lado de sua resiência, com a finalidade de evitar que moradores em situação de rua parem ou durmam por ali. O espaço, no entanto, não pertence a ela e sim a uma empresa, cujo gerente registrou um boletim de ocorrência sobre o ocorrido. A ação praticada pela vizinha do estabelecimento é considerada crime pelo Código Penal e pode render de três meses a um ano de detenção. 

Ontem, o espaço estava com fitas de isolamento e cartazes que avisavam sobre a “obra irregular”. O isolamento do local foi realizado pelos próprios vizinhos, contrários à iniciativa, porque temiam que crianças, animais ou outras pessoas chegassem a se ferir ao passar por ali. 

Segundo o pintor Ezequiel Aparecido Fidelis, de 59 anos, a mulher que mora na casa ao lado do local onde hoje estão os cacos de vidro, estava incomodada com a presença de moradores em situação de rua que ocupavam o espaço para dormir e mandou uma pessoa, entre sábado e domingo, concretar os cacos de vidro no local.

O espaço tem quatro de comprimento por três de largura e está ao lado do galpão que pertence à empresa. O gerente do local, Renato Correia, de 57 anos, disse que somente percebeu os cacos de vidro por volta do meio-dia da segunda-feira (4), quando um funcionário o avisou. “Nós ficamos indignados, porque isso é crime. Não se faz isso de forma alguma. Pode ferir uma criança, um animal, uma pessoa. É algo inaceitável”, definiu o gerente da empresa.

“Já registramos um boletim de ocorrência para ver o que pode ser feito. E ela (a vizinha) fez tudo isso e sumiu, simplesmente desapareceu. E ainda realizou esse “serviço” sem qualquer autorização nossa, a gente não estava sabendo de nada.”

A reportagem do Correio Popular tentou contato com a mulher em frente à residência dela, mas a equipe também não foi atendida. 

Pelas redes sociais, o padre Julio Lancellotti, de São Paulo, lamentou o ocorrido. Ele é conhecido por combater a chamada aporofobia, termo que designa a pessoa que tem aversão a pobres, reação que pode ser percebida, sobretudo, em arquiteturas hostis de construções ou proibição da presença de pessoas em situação de rua, seja pela colocação de pedras, grades, lanças ou cacos de vidro em sua estrutura. 

Crime 

De acordo com o delegado titular do Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo Interior 2 (Deinter 2), José Henrique Ventura, o ato se configura como crime e é previsto no artigo 132 do Código Penal, podendo render de três meses a um ano de detenção. “Aquilo não pode ser feito por ninguém e nem em lugar nenhum. Muito menos na calçada dos outros. Até porque, trata-se de um passeio público, então é crime, na medida em que expõe a vida e a saúde do outros a risco iminente. E aquilo é perigo contra a saúde e contra a vida das pessoas”, alertou.

Sobre o boletim de ocorrência registrado, o delegado informou que a acusada deverá responder criminalmente pelo fato. “Ela vai e deve responder. É uma coisa absurda, porque não é apenas um caquinho de vidro, são cacos de vidro enormes e pontiagudos, com potencial de atentar contra a vida de uma pessoa, se a mesma cair em cima daquilo. Por ora, trata-se de um crime de perigo, ao expor a vida e a saúde de outro a risco iminente. Sem contar que, se acontecer alguma coisa, ela responderá pela gravidade daquilo que resultar da sua ação.”

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