AÇÃO CIVIL PÚBLICA

MP investiga ex-secretário de habitação de Hortolândia por suposta fraude no Minha Casa, Minha Vida

Grupo formado por Jonas Pereira de Lima e mais oito pessoas teria recebido comissões indevidamente e feito esquema para burlar fila de espera

Paulo Medina/ [email protected]
21/03/2024 às 08:36.
Atualizado em 21/03/2024 às 08:36
Promotoria afirma que 36 unidades teriam sido negociadas por cerca de R$ 100 mil, em valores atualizados; caso começou após denúncias de moradores, e o Condomínio das Bromélias I foi apontado como um dos locais em que houve negociações ilegais (Rodrigo Zanotto)

Promotoria afirma que 36 unidades teriam sido negociadas por cerca de R$ 100 mil, em valores atualizados; caso começou após denúncias de moradores, e o Condomínio das Bromélias I foi apontado como um dos locais em que houve negociações ilegais (Rodrigo Zanotto)

O ex-secretário de Habitação de Hortolândia, Jonas Pereira de Lima, e mais oito pessoas, inclusive ex-assessores, são alvo de uma ação civil pública de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) em uma investigação de fraudes na gestão do programa "Minha Casa, Minha Vida" na cidade. A Promotoria afirma na denúncia que o grupo recolheu indevidamente comissões de corretagem para a distribuição de apartamentos populares e acusa o grupo ainda de furar a fila da Habitação do município para beneficiar pessoas que pagavam para obter vantagens e, enfim, conseguir imóveis. A ação é de R$ 3,6 milhões e abrange oito condomínios residenciais de Hortolândia. A denúncia foi oferecida em janeiro deste ano pelo MP e foi aceita pela Justiça na quinta-feira passada, 14 de março.

O MP afirma que os casos ocorreram entre 2018 e 2019, quando Lima era secretário de Habitação do município. O promotor de Justiça Pedro dos Reis Campos afirma no processo que 36 unidades habitacionais teriam sido negociadas pelo grupo por um valor que girava em torno de R$ 60 mil na época e que hoje, atualizado, é de cerca de R$ 100 mil cada. A apuração do caso começou depois que a Promotoria recebeu denúncias de moradores. Instalado na região do Jardim Amanda, o Condomínio das Bromélias 1 foi apontado como um dos locais das negociações ilegais, assim como os condomínios Itália, França, Bertioga, Portugal, Suíça, Estrela 1 e Praia Grande.

Campos sustenta que o grupo tinha poder para administrar o programa federal e atuou de maneira “escusa” na venda de unidades habitacionais, alterando a fila de espera e inserindo moradores sem cadastros na fila para obter os imóveis. O promotor argumenta que o grupo recebia pagamentos de corretagem para beneficiar pessoas e aponta ter havido “suborno” para selecionar proprietários de unidades após “pagamentos ilícitos”.

A investigação indica ainda que um dos acusados era síndico do Condomínio Bromélias 1 e atuou “ativamente nos atos”, permitindo inclusive a entrada do então secretário e “seus asseclas” para retirar pertences de um legítimo morador da unidade para que o imóvel fosse “apossado” por terceiros.

O esquema, conforme o MP, ocorria de maneiras diversas. Uma delas é que em situações em que havia interesse financeiro entre morador e o adquirente, obtinha-se a anuência do legítimo beneficiário para ceder-lhes a posse do imóvel. Os acusados prometiam pagar aluguel social até que fosse realizada a construção de outra unidade habitacional, com a “garantia” de que o beneficiário teria uma nova moradia, “melhor e mais valorizada”.

“A outros moradores, os réus aproveitavam-se de débitos condominiais ou da parcela do financiamento e, aliados aos síndicos de alguns prédios, expulsavam-lhes, alocando novas pessoas, sob a mera alegação de inadimplemento”, afirma.

O MP cita ainda que após a confirmação da “proposta de compra” por terceiros que estavam “alheios à fila de espera”, os acusados inseriam os então “proponentes” na fila, “furando-a” e “privilegiando os pagadores em detrimento daqueles que já estavam aguardando, segundo critérios legais, a disponibilização de unidades habitacionais.”

As operações, atesta o MP, contavam com a assinatura, aval e ação do então secretário de Habitação, bem como a aproximação de compradores e expulsão de moradores.

A apuração também aponta que uma então assessora da Secretaria de Habitação recebia os documentos de desistentes e dos novos compradores da mesma unidade, ajudava na elaboração das autorizações como se os mesmos "fossem beneficiários regulares e prévios no cadastro, inserindo seus nomes nas listas prévias do PMCMV na frente de outros beneficiários que aguardavam a contemplação das unidades".

Desta forma, o falso beneficiário conseguia os documentos para obter a subvenção do financiamento junto à Caixa Econômica Federal via Minha Casa, Minha Vida. Também há relatos de pagamentos em dinheiro entregues a ex-assessores.

Na ação, a Promotoria requer que o ex-secretário e as outras oito pessoas acusadas sejam condenadas por improbidade administrativa.

 “Demonstrar que os réus, aproveitando-se da condição de responsáveis pela gestão do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), passaram a negociar ilicitamente unidades habitacionais vinculadas ao Programa, ganhando comissões de corretagem nas transações comerciais durante os anos de 2018 e 2019 (...) Valendo-se das posições de Secretário de Habitação do Município (no caso de Jonas) e assessores (no caso dos demais réus) que lhes davam pleno domínio sobre a gestão do PMCMV, os réus passaram a negociar de forma escusa a compra de unidades habitacionais a serem feitas por pessoas que não estavam cadastradas previamente nas filas do Programa. Dito de outro modo: aproveitaram-se da condição de servidores públicos para faturar vultosos numerários como se fossem corretores de imóveis do setor privado em cima de espertos que, por sua vez, furaram a fila do PMCMV em detrimento dos legítimos beneficiários”, destaca o promotor na ação.

O programa tem como regra que para ter direito às moradias é proibido que beneficiários emprestem, aluguem, vendam ou façam qualquer negociação que descaracterize o objeto da concessão das unidades. Em resposta ao promotor, a Prefeitura de Hortolândia informou que há duas maneiras de inserção no programa federal. Uma pela inscrição de famílias do Cadastro Único e a segunda é o cadastramento de pessoas inscritas na fila para sorteio, sendo 50% da demanda preenchida desta forma.

OUTRO LADO

O ex-secretário de Habitação disse que se manifestará nos autos através de seu advogado ao ser notificado. A Prefeitura de Hortolândia informou que todas as reclamações e denúncias recebidas foram acolhidas pela Secretaria de Habitação e protocoladas. A partir dos protocolos, foram abertos processos administrativos para apurar os fatos.

“Os processos administrativos foram encaminhados ao Departamento Jurídico da Prefeitura para análise e, se necessário, abertura de sindicância. O relatório final dos processos foi encaminhado ao Ministério Público para que sejam tomadas as medidas cabíveis. A Administração Municipal fica à disposição para quaisquer esclarecimentos necessários, mas o município ainda não recebeu a notificação referente à ação judicial. Tão logo a receba oficialmente, serão analisadas as medidas a serem adotadas”, conclui a Prefeitura.

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