CORRIDA PARA ENCHER O TANQUE

Motoristas de Campinas fazem filas atrás de combustível sem aumento

Preços nos postos da cidade apresentavam na última segunda-feira grandes variações

Edimarcio A. Monteiro/ [email protected]
21/06/2022 às 09:36.
Atualizado em 21/06/2022 às 09:42
Depois de percorrerem vários postos de combustíveis da cidade, proprietários de veículos se depararam com filas nos estabelecimentos que vendiam gasolina a preços mais baixos (Ricardo Lima)

Depois de percorrerem vários postos de combustíveis da cidade, proprietários de veículos se depararam com filas nos estabelecimentos que vendiam gasolina a preços mais baixos (Ricardo Lima)

Os proprietários de veículos promoveram na segunda-feira (20) uma corrida atrás de combustíveis mais baratos, formando filas em postos que ainda trabalhavam sem reajustar os preços, três dias após o último aumento anunciado pela Petrobras — de 14,26% no diesel e de 5,18% na gasolina. O governo estadual anunciou na segunda-feira a formação de uma força-tarefa do Procon para a fiscalização dos preços em mais de mil estabelecimentos em todas as regiões do Estado para acompanhar se a redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) chegará até o consumidor final. 

A manutenção dos preços em alguns postos provocou uma grande variação nos valores cobrados em Campinas, chegando a 19,6% na gasolina e a 29,08% no caso do diesel aditivado no que se refere à diferença identificada entre os menores e maiores preços praticados. 

“Eu já vi hoje a gasolina a mais de R$ 7”, afirmou a representante comercial Rosana Silva, que saiu do Parque Itália e percorreu 4 quilômetros para abastecer o carro em um posto no Centro, que vendia o produto a R$ 6,43 o litro. “Compensa rodar um pouco mais para economizar”, disse Rosana, que ia encher o tanque do veículo. Levando-se em consideração que a consumidora passou por outros estabelecimentos que vendiam a gasolina a R$ 7,19, a economia dela chegou a R$ 40,28. O valor gasto ficou em R$ 340,79 contra R$ 381,07 se tivesse abastecido onde o combustível já era vendido com o reajuste. A diferença é suficiente para a compra de 6,26 litros de gasolina, o que daria para percorrer em torno de 60 quilômetros a mais.

Após o novo aumento, encher o tanque de um carro popular com motor 1.0 já requer quase um terço do valor do salário mínimo, que hoje é de R$ 1.212. É o caso do hatch mais vendido do mercado, cujo custo para ser abastecido é de R$ 359,50, o que equivale a 29,66% do mínimo.

Reação dos postos

O gerente do posto, Artur dos Reis Santos, recebeu na segunda-feira (20) combustíveis da distribuidora com preços novos, mas ainda não havia repassado para os clientes. “Nós preferimos cortar na carne e trabalhar com margem de lucro menor para ganhar no volume vendido”, disse. Na última sexta-feira, a Petrobras anunciou reajuste no preço da gasolina em 5,18% e do diesel em 14,26%.

Porém, Santos não garante a manutenção da tabela sem aumento. “Nós vamos acompanhar a movimentação do mercado e depois vamos definir como ficarão os preços”, explicou. 

No Taquaral, outro estabelecimento também não havia repassado o novo aumento e tinha movimento de clientes. A gasolina era vendida a R$ 6,47, enquanto o litro do óleo diesel aditivado estava sendo comercializado a R$ 6,19. 

Por outro lado, os postos que já operavam com novos preços registraram movimento fraco, com as pistas das bombas passando o maior tempo vazias. O gerente de um estabelecimento admitiu que os reajustes prejudicam as vendas, mas sem fazer uma estimativa da queda. Ele justifica que as vendas naturalmente caem por ser final do mês e o primeiro dia útil após um final de semana prolongado, em virtude do feriado da última quinta-feira.

Apesar do aumento nos preços, o reajuste nos postos ficou abaixo do praticado pela Petrobras. Os estabelecimentos que vendiam a gasolina a R$ 6,89 elevaram o valor para R$ 7,09, alta de 2,9%. Um posto na Chácara Primavera passou a praticar o aumento já no sábado. “A margem de lucro é pequena, não tem como segurar o aumento por menor que seja”, explicou o gerente. De acordo com ele, a distribuidora já não havia repassado o aumento integral em março, quando a Petrobras também reajustou os combustíveis.

Consumidores 

Os constantes aumentos dos combustíveis levaram os donos de veículos a retomar a prática de percorrer os postos em busca do menor preço. O controlador de acesso Ianildo Araújo reclama do valor. “A R$ 6,43, a gasolina já está cara”, diz. Ele afirma que usa o carro apenas para trabalhar, tendo hoje dois empregos para conseguir arcar com as despesas domésticas e pessoais.

O motorista de aplicativo Davi Borges optou por usar etanol para trabalhar após o recente aumento da gasolina. “Eu estou pagando R$ 4,13, mas encontrei por R$ 4,50”, afirma. No seu caso, buscar o menor preço reflete em uma remuneração maior após um dia de trabalho. Mas o preço do etanol comum já chega a R$ 5,29 no mercado. No caso do aditivado, o valor sobe para R$ 5,39.

O agente de relacionamento Antonio Luiz Cassiano trocou o automóvel, que deixa na garagem, pela motocicleta, que é mais econômica. “Carro agora só quando chove”, disse. Ele pagou a gasolina a R$ 7,69, o preço mais alto encontrado em Campinas. “Eu abasteço sempre no mesmo posto, que tem bandeira. Acho que é mais seguro. Em outros postos, o carro e a moto já saem tossindo”, justificou.

A motorista de aplicativo Rosana Silva também prioriza postos com bandeira. “Eu até pago mais caro, mas prefiro”, afirmou. 

Antes, ela usava o cartão de crédito para pagar os combustíveis, mas agora abandonou essa prática. "Já fiquei com uma dívida de R$ 3 mil. Agora, abasteço mais vezes no dia, mas somente pago com dinheiro”, explicou. Ontem (200 pela manhã, ela fazia a segunda parada no posto.

Defasagem continua

Apesar do recente aumento, especialistas do setor apontam que os combustíveis continuam com defasagem de preço em relação às cotações internacionais. De acordo com a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), a diferença no caso da gasolina é de R$ 0,37 por litro, enquanto que para o diesel é de R$ 0,22. A entidade alerta que a manutenção de preços abaixo do mercado internacional gera risco de desabastecimento, uma vez que as empresas privadas não importarão produtos com prejuízo. Cerca de 25% do diesel vendido no País vem de outros países. 

Ao justificar o novo reajuste, a Petrobras divulgou, em nota, que “evita o repasse das variações temporárias que podem ser revertidas no curto prazo”. Porém, defendeu que o equilíbrio com o mercado internacional é necessário para a “continuidade do suprimento do mercado brasileiro, sem riscos de desabastecimento”.

Com os aumentos, as refinarias da empresa passaram a vender a gasolina ao preço médio de R$ 4,06 por litro, enquanto o óleo diesel passou a custar R$ 5,61. Até chegar ao consumidor final, esses valores ainda sobem por conta da margem de lucro das distribuidoras, postos, frete e impostos.

“Esse novo aumento frustra o consumidor que esperava redução dos preços com a mudança no ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços)”, disse o gerente de posto João Carlos Evangelista. Ele evita, porém, fazer previsão de como ficará o mercado dos combustíveis a curto prazo. “Nós dependemos das distribuidoras. Se elas sobem os preços, nós acompanhamos”, justificou. 

Uma empresa de transferência de pagamento aponta que, em apenas três meses, o brasileiro gastou quase R$ 40 a mais com transporte. Ela divulgou na segunda-feira que o gasto médio com esse serviço subiu de R$ 271 em dezembro para R$ 310 em março, diferença de 14%. “A alta pode ser explicada pelo aumento dos combustíveis no mesmo período”, divulgou a empresa de carteira eletrônica. Além do gasto com abastecimento, a categoria de transporte também inclui custos com aplicativos de mobilidade, pedágio e transporte público. 

Por outro lado, o levantamento revela que os brasileiros economizaram R$ 103 (-14%) com alimentação, item de maior peso no orçamento e que abrange o consumo em bares, restaurantes e supermercados. Em dezembro, foram gastos R$ 731; enquanto que em março, R$ 628. “O comportamento pode ser uma tentativa de equilibrar as contas diante da alta da inflação no período, o efeito sazonal ou uma consequência da perda do poder de compra”, diz a empresa. 

DIFERENÇAS DE VALORES 

COMBUSTÍVEL               PREÇO          MAIS BAIXO       PREÇO MAIS ALTO VARIAÇÃO 

Gasolina                          R$ 6,43             R$ 7,69                                   19,6% 

Gasolina aditivada         R$ 6,69              R$ 7,99                                 19,43% 

Etanol                              R$ 4,13             R$ 5,29                                  28,09% 

Etanol aditivado             R$ 4,29             R$ 5,39                                  25,64% 

Diesel                              R$ 6,34             R$ 7,39                                  16,56% 

Diesel aditivado             R$ 6,19             R$ 7,99                                  29,08%

Governo anuncia força-tarefa do Procon para fiscalizar valores

O governo estadual anunciou na segunda-feira (20) a formação de uma força-tarefa da Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon) para acompanhar os preços nas bombas em mais de mil estabelecimentos em todo o Estado e garantir que a redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) chegue até o consumidor final. A previsão é que alterações na arrecadação do tributo aprovadas pelo Congresso e determinadas em decisão provisória do Supremo Tribunal Federal (STF) sejam aplicadas nesta semana.

“Vou fazer isso regularmente para que, no momento em que os impostos forem reduzidos, avaliar se essa redução chegou na bomba, porque muitas vezes ela fica na margem de lucro das distribuidoras e também de donos de postos”, disse o governador Rodrigo Garcia (PSDB). “O objetivo é que a gente consiga alguma redução final para o consumidor de combustível aqui em São Paulo”, acrescentou. 

No ano passado, o governo já tomou medidas unilaterais para tentar frear o impacto do aumento dos combustíveis. O valor do ICMS foi congelado a R$ 0,63 o litro para o óleo diesel, que na época era vendido a R$ 4,90. Passados sete meses, o tributo continua o mesmo, enquanto o combustível já se aproximava de R$ 7, antes mesmo do novo aumento da Petrobras. Para o governo estadual, a manutenção da política de preços da Petrobras atrelada ao mercado internacional praticamente elimina a efetividade das medidas estaduais. “O vilão não é o ICMS, estão querendo reformar a casa começando pelo lugar errado. O grande problema é a política de preços da Petrobras, que tem uma margem de lucro enorme comparativamente a outras petroleiras do mundo e isso não é justo com o cidadão”, criticou.

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