Durante sessão da Câmara Municipal no mês passado, manifestantes pediram a abertura de Comissão Processante de Inquérito (CPI) para apurar suspeitas de corrupção em contratos no Legislativo (Kamá Ribeiro)
O vereador Zé Carlos (PSB) também é alvo do Ministério Público do Estado de São Paulo numa investigação que apura suspeita de prática de rachadinha – ação criminosa em que parte do salário dos assessores é devolvida ao parlamentar. As investigações começaram no início do ano envolvendo dez vereadores. Em julho deste ano, parte delas foi arquivada, restando as investigações contra o presidente da Câmara e contra os vereadores Edison Ribeiro (PSL) e Otto Alejandro (PL), alvos de inquérito civil. Ontem, o MP informou que “as investigações prosseguem e ainda há diligências pendentes para a cabal apuração dos fatos”.
Nesses casos, os inquéritos não foram arquivados por decisão do promotor de Justiça, Ângelo Carvalhaes, do Ministério Público do Estado de São Paulo, por entender existirem indícios de participação dos vereadores nas supostas irregularidades .
No caso de Zé Carlos, Cavalhaes alegou que a decisão pela instauração de um inquérito civil e a continuidade das investigações contra ele ocorreu pelo fato de que quatro assessores parlamentares que trabalham com o político, dois na presidência da Casa e dois no gabinete, se negaram a colaborar com a apuração das denúncias.
Ainda conforme o promotor explicou na época, os quatro assessores do presidente da Câmara se recusaram a entregar, de forma espontânea, os extratos bancários de suas contas à Promotoria. O fato justificou a abertura do inquérito. “Fui obrigado a avançar nas investigações, pois estranhamente houve a recusa dos assessores em fornecer os extratos bancários”, disse Carvalhaes.
No decorrer das apurações envolvendo as supostas práticas de rachadinha na Câmara, o promotor colheu depoimentos de todos os parlamentares e assessores que tiveram o nome envolvido nas denúncias. De acordo com o promotor, todos apresentaram, de forma espontânea, os extratos bancários das contas.
A análise dos extratos das contas dos envolvidos nas denúncias é parte dos procedimentos do trabalho do Ministério Público. Qualquer movimentação suspeita identificada nos extratos pode agravar ou reduzir os indícios da suposta prática ilícita.
Diante da negativa dos comissionados em apresentar os extratos, Carvalhaes recorreu ao próprio vereador Zé Carlos para que ele insistisse junto aos seus subordinados para mostrarem a movimentação bancária ao promotor. No entanto, o pedido foi em vão, dado que os advogados dos assessores se negaram a informar os dados solicitados.
Diante da recusa, Carvalhaes informou que, a partir da instauração de um inquérito civil e da continuidade da apuração, pediria a quebra do sigilo bancário dos comissionados que trabalham para o presidente da Câmara. “Sem a informação dos extratos bancários dos assessores, não há como continuar os trabalhos e verificar se é ou não o caso de arquivamento da denúncia, mesmo o vereador tendo apresentado as suas provas”, disse.
As acusações contra o presidente da Câmara Municipal, Zé Carlos (PSB), afetam a imagem do Legislativo de Campinas e os trabalhos conduzidos pela Casa, que já vinham abaixo do desejado. Um balanço sobre a produção parlamentar da Câmara, divulgado pela reportagem do Correio Popular em 27 de agosto, mostrou que, durante o primeiro semestre deste ano, houve um direcionamento massivo em procedimentos como requerimentos e indicações – instrumentos considerados de menor impacto na vida do cidadão – em relação ao número de projetos de lei. Foram 1.082 requerimentos e 4.833 indicações protocoladas pelos parlamentares nos primeiros seis meses, enquanto o número de projetos de lei totalizou apenas 181.
Com o agravo das acusações, o professor da Pontíficia Universidade Católica de Campinas (PUC) e cientista político Vitor Barletta Machado disse que a atuação do Legislativo deverá ficar comprometida. “No ano de eleições, qualquer tipo de denúncia pode ter impacto no eleitorado. Agora, a questão é qual é o desdobramento dessa denúncia”, avaliou
Em relação ao Legislativo, Machado apontou que o funcionamento da Casa acaba se voltando à denúncia, deixando aquém outros projetos devido à necessidade de investigação e acompanhamento do caso. Já em relação à sociedade, a percepção de casos de corrupção depende da bagagem política de cada indivíduo. “Temos um conjunto de pessoas, um número considerável do eleitorado, que já se coloca meio à margem das questões políticas e, para eles, qualquer escândalo que apareça é só mais um dentro daquilo que imagina que já acontece no cenário da política. Independente do que esteja acontecendo, vão manter essa imagem negativa que já possuem”, explicou.
Desempenho
Pelo balanço da produção da Câmara Municipal, o número de procedimentos realizados no primeiro semestre totalizou 6.776. Entre os procedimentos informados, a maioria é de requerimentos, indicações, moções. Os projetos de lei ordinária, projetos de decreto legislativo e de lei complementar constituem minoria. No primeiro semestre de 2021, o número total de procedimentos foi um pouco maior, 6.852. Desse total, a maioria é ambém de indicações (4.811) e requerimentos (1.030). Os projetos de lei, na ocasião, somaram 239.
Na avaliação sobre o primeiro semestre feita pela Câmara na época, o número expressivo de requerimentos e indicações indica um papel fiscalizatório e questionador do parlamentar diante das ações do Executivo. Em relação aos projetos de lei — 30 por mês em média —, a Câmara avalia que o “trabalho foi satisfatório”. Especialistas, no entanto, questionam os números e chamam atenção ao fato de que quantidade diz pouca coisa, e o que conta ao final é a qualidade dessas proposituras.