FORÇA FEMININA

Metade das MEIs da região de Campinas é capitaneada por mulheres

Para muitas delas, empreender é uma alternativa viável diante da dificuldade de ingressar ou se manter no mercado formal de trabalho

Edimarcio A. Monteiro/ edimarcio.augusto@rac.com.br
08/03/2023 às 08:42.
Atualizado em 08/03/2023 às 08:42

A comerciante Marli Aparecida Matheus de Oliveira: "Eu vi o que a concorrência tinha de bom, o que tinha de ruim e busquei reunir os pontos positivos na minha loja" (Rodrigo Zanotto)

A abertura do próprio negócio é a alternativa buscada por muitas mulheres para garantir uma renda. Na região de Campinas, elas representam 46,5% dos Microempreendedores Individuais (MEIs) ativos, de acordo com pesquisa realizada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) São Paulo. Entretanto, em algumas cidades elas respondem por mais da metade dos empreendedores iniciais, com até 3,5 anos de mercado. Dos 22 municípios analisados, a liderança da participação feminina ocorre em Paulínia, com 52,5%, seguido por Cosmópolis (51,1%) e Holambra (50%).

A menor participação das mulheres no mundo dos negócios se dá em Monte Mor, com 42,7%. Em Campinas, elas são responsáveis por 46,3% das MEIs. Uma delas é a comerciante Marli Aparecida Matheus de Oliveira, proprietária de uma loja de roupas infantis novas e usadas, localizada na Vila Padre Anchieta. Ela começou a atuar como MEI há dez anos ao se aposentar depois de trabalhar por 25 anos como secretária executiva. Inicialmente, a empresária atuou com a realização de eventos, mas há seis anos abriu a loja.

"Levei um choque de realidade", conta ela, ao analisar a mudança de ramo de atividade. O primeiro desafio foi buscar informações de como montar o novo negócio. Depois, conhecer o que já havia em funcionamento no mercado. "Eu vi o que a concorrência tinha de bom, o que tinha de ruim e busquei reunir os pontos positivos na minha loja", explica Marli. O cuidado foi para evitar as falhas que os outros já haviam cometido, de modo a aumentar as chances de sucesso.

"Não vejo muita diferença entre homens e mulheres. É difícil para ambos", afirma a microempreendedora. Ela está à frente da loja desde 2016 e se diz satisfeita com o resultado. A empresária conta com a ajuda da mãe e do marido para tocar o negócio. "Meu marido não sabia nem dobrar uma camiseta, mas agora já sabe", brinca Marli.

NECESSIDADE

Para a economista e pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas (Cesit/Unicamp), Marilane Teixeira, a ampliação feminina na abertura de negócios é resultado das dificuldades que as mulheres encontram para entrar ou se manter no mercado de trabalho. Os dados de 2022 do levantamento da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que o taxa de desemprego no país é de 7,9%, o que se traduz em 8,6 milhões de desempregados. Porém, a taxa entre os homens é de 6,5%, enquanto das mulheres chega a 9,8%, ou seja, o desemprego é 50,77% maior entre elas.

"O empreendedorismo é a alternativa diante das dificuldades de se manter no mercado de trabalho formal", diz Marilane. Para ela, esse quadro somente se alterará com a retomada de forma consistente e sustentável da economia, o que gerará empregos para absorver a mão de obra parada. No caso das mulheres, acrescenta a pesquisadora do Cesit, é preciso ainda uma política pública de ampliação de meios que permitam a esse segmento trabalhar, seja fora de casa ou no negócio próprio, com maior número de vagas em creches.

O empreendedorismo por necessidade também é identificado pelo Sebrae Campinas. "A criação da MEI permitiu algo que é essencial para as mulheres, que é a seguridade social", diz Taís Camargo, consultora de negócios da entidade. "São trabalhadoras que estavam no mercado informal. Uma faxineira pode ser MEI, por exemplo. Antes, ela não tinha direito a aposentadoria, auxílio-maternidade e auxílio doença, caso se machucasse. Como MEI, ela tem", esclarece.

O público feminino representou 51% dos atendimentos no ano passado do Sebrae Campinas. No entanto, essa demanda quase igualitária com os homens se refere apenas ao primeiro atendimento. Normalmente, as mulheres voltam outras vezes para se preparar melhor para enfrentar os desafios do mercado, com a participação em cursos, consultoria e outros eventos.

REINCIDENTE

É o caso da dentista Patrícia Alessandra Rampazzo Ferreira. Após as experiências de trabalhar com carteira registrada e concursada pública, passou a atuar exclusivamente no consultório. Para isso, fez curso de gestão, formação de preço, administração financeira e de como usar as redes sociais para divulgar a atividade. Foi assim que aprendeu a criar ações especiais, como reservar a agenda exclusivamente para o público feminino.

O resultado foi um aumento de 86% no movimento, o que a fez procurar um consultório maior e fazer cursos rotineiramente, inclusive de aprimoramento técnico-profissional. "Agora estou fazendo um curso de harmonização orofacial, que está em alta", afirma Patrícia. Também garantiu tempo para participar do "Mulheres Inspiradores e seus Negócios", evento do Sebrae Campinas no qual empreendedoras falam de suas experiências. "Queremos mostrar que o empreendedorismo feminino não é só uma realidade, mas uma oportunidade de transformação de vida. Temos muitas mulheres com potencial empreendedor na cidade e queremos ajudá-las a começar ou potencializar seus resultados", diz a consultora de negócios Taís Camargo.

EXPANSÃO

O crescimento da participação feminina também ocorre em outras formas de negócio. De acordo com o Instituto Rede Mulher, o Brasil ocupa a sétima posição no ranking mundial de empreendedorismo. Em 2021, último ano com dados consolidados, elas estavam à frente de 34% dos negócios no país, gerindo 10,1 milhões de empreendimentos. Segundo pesquisa da Rede Mulher Empreendedora (RME), o desemprego e a falta de renda estimularam 26% das brasileiras a iniciar seu negócio.

Segundo o levantamento, 77% das mulheres se autodenominam parcialmente ou totalmente independentes financeiramente. Porém, a dupla jornada e o preconceito implicam em consequências diretas no retorno financeiro. De acordo com o levantamento, 50% dos homens recebem valores superiores a R$ 10 mil, enquanto 63% das mulheres empreendedoras têm retorno de até R$ 2,5 mil por mês.

Essa é uma realidade que também se repete no mercado de trabalho. Pesquisa do IBGE, de forma geral e sem recortes por níveis, aponta que as trabalhadoras brasileiras recebem, em média, 20,5% menos que os homens. Outro levantamento da International Stress Management Association no Brasil (Isma-BR) mostra dificuldade de equilíbrio entre a vida pessoal e profissional.

Segundo o estudo, 62% das brasileiras afirmam que a saúde emocional piorou ou piorou muito durante a pandemia de covid-19. Entre os homens, o índice dos que se disseram mais abalados com a experiência foi de 43%. Com isso, é grande o número de mulheres que negligenciam a vida pessoal, porque se dedicam mais ao campo profissional por medo de demissão ou de ficar para trás em promoções.

O resultado é a exaustão emocional, despersonalização e baixo sentimento de realização pessoal. Outros reflexos são ansiedade e transtornos mentais, como depressão e síndrome do pânico e exaustão acumulada. "O medo é, sim, uma emoção válida, mas às vezes ele se torna tão intenso que pode ser incapacitante. Além disso, quando estamos em um nível elevado de estresse, acabamos tendo reações mais intensas às coisas", diz a presidente do Isma-BR, a psicóloga Ana Maria Rossi.

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