DINHEIRO PÚBLICO

Mesmo com crise, gasto de Câmaras sobe na RMC

Legislativo da Região Metropolitana de Campinas ignora crise econômica e gasta mais de R$ 154 milhões no primeiro semestre

Bruno Bacchetti
02/08/2015 às 09:13.
Atualizado em 28/04/2022 às 17:54
Câmara de Paulínia teve gasto com jardinagem de R$ 46.640,00 no primeiro semestre; presidente diz que o importante não é reduzir despesas, mas utilizar bem os recursos ( César Rodrigues/ AAN)

Câmara de Paulínia teve gasto com jardinagem de R$ 46.640,00 no primeiro semestre; presidente diz que o importante não é reduzir despesas, mas utilizar bem os recursos ( César Rodrigues/ AAN)

No primeiro ano sob a gestão dos novos presidentes e com o País vivendo grave crise financeira, as Câmaras de Vereadores das 20 cidades da Região Metropolitana de Campinas (RMC) gastaram R$ 145,4 milhões no primeiro semestre deste ano em valores empenhados — valor reservado para o pagamento de determinada despesa. O montante é quase R$ 20 milhões superior ao empenhado no mesmo período do ano passado, que totalizou R$ 127,3 milhões, e equivale a uma média de R$ 494,8 mil para cada um dos 294 vereadores da região. Os dados foram divulgados pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE) e consideram despesas gerais das Câmaras, como folha de pagamento de vereadores e funcionários, contas de água, luz, telefone, impostos e gastos diversos. Se a despesa no segundo semestre atingir nível semelhante ao do primeiro semestre, o custeio do Legislativo da RMC será de quase R$ 300 milhões somente em 2015. A maior parte das despesas das Câmaras é com a folha de pagamento de funcionários e vereadores. No entanto, alguns gastos elevados chamam a atenção. No mês passado, a Câmara de Hortolândia empenhou R$ 250 mil despesas com óleo lubrificante, filtro de óleo e combustível. A Câmara de Campinas desembolsou, em maio, R$ 109,8 mil a uma agência de viagens para custear hospedagens e passagens para a ida de servidores e funcionários a cursos, seminários e palestras. O Legislativo de Paulínia empenhou, em abril, R$ 46,6 mil para a contratação de empresa prestadora de serviços de jardinagem. “O Poder Legislativo se tornou um instrumento inútil de representatividade popular e eles vão abusando. Os gastos que eles representam com veículos e funcionários é um verdadeiro escândalo, esse volume de gasto não justifica de maneira nenhuma. Muitas vezes usam como cabide de emprego para cabos eleitorais”, analisa Roberto Romano, professor de Ética e Filosofia da Unicamp. Das despesas totais da região, mais de um terço saiu da Câmara de Campinas, que somou R$ 54,0 milhões, o equivalente a um gasto de R$ 1,6 milhão por vereador. O Legislativo campineiro ampliou em 25% o valor empenhado em relação ao primeiro semestre do ano passado — R$ 43,1 milhões. Segundo o presidente Rafa Zimbaldi (PP), o aumento se deu por causa do concurso realizado ano passado, que elevou de 52 para 180 o número de funcionários efetivos. “Nós estamos cortando custos onde tem que cortar, mas com o concurso público que ocorreu no meio do segundo semestre do ano passado a despesa com a folha de pagamento subiu. Saímos de 52 para 180 funcionários efetivos e vamos chegar a 200 até o final do ano. O TCE e MP determinaram que era necessário o concurso”, justifica. De acordo com Rafa, no segundo semestre será realizada uma reforma no prédio do Legislativo que terá um custo de aproximadamente R$ 3 milhões. “Temos a reforma prevista. O prédio é antigo, tem goteiras e problemas na parte elétrica, inclusive tem várias reportagens do Correio sobre isso. Temos que fazer reforma do forro, que foi determinada pelo MP. São coisas necessárias e urgentes”, acrescenta.Depois de Campinas, as despesas mais elevadas são de Americana (R$ 14 milhões), Hortolândia (R$ 11,6 milhões), Paulínia (R$ 11,2 milhões) e Sumaré (R$ 11,0 milhões). Por outro lado, o município que menos gastou foi Morungaba, cujas despesas somaram R$ 402,2 mil, seguido por Holambra (R$ 844,2 mil), Pedreira (R$ 890,4 mil) e Artur Nogueira (R$ 908,7 milhões). Para o presidente do Legislativo de Paulínia, Sandro Caprino (PRB), o gasto é necessário para oferecer um serviço de qualidade ao cidadão. Ele lembra, ainda, que a cidade conseguiu reduzir em 18,1% a despesa em comparação ao ano passado (de R$ 13,7 milhões para R$ 11,2 milhões). “Às vezes baixar não significa competência, porque a população tem que ser bem atendida e pode trazer uma série de problemas. Mas estamos economizando muito porque agora adotamos o pregão e antes era carta-convite e isso barateou, além de abrir a licitação para mais gente”, explica.Para Rafa Zimbaldi, que também é presidente do Parlamento Metropolitano, entidade que integra as 20 Câmaras da região, a retração da economia exige que todos os vereadores da região economizem ao máximo. Segundo ele, uma das ações é reduzir os cargos de confiança. “O orçamento da Câmara é um valor constitucional e varia de Câmara para Câmara, mas vivemos uma nova realidade e tem que haver consciência não só dos presidentes, mas dos 294 vereadores, que é necessário fazer o corte de gastos. Uma das maneiras de cortar é reduzir os comissionados.”Paulínia lidera na despesa per capitaEmbora tenha sido o Legislativo que mais reduziu as despesas no primeiro semestre deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado (queda de 18,1%), a Câmara de Paulínia tem, disparado, o maior gasto por habitante. Segundo dados do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), o Legislativo paulinense empenhou R$ 11,2 milhões, equivalente a R$ 118,26 por habitante. A população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é de 95.221. O orçamento do Legislativo é repassado pela Prefeitura, que posteriormente recebe de volta os recursos que não foram utilizados.Para o presidente da Câmara de Paulínia, Sandro Caprino (PRB), Paulínia vive uma realidade diferente das demais cidades por conta do orçamento elevado. Embora tenha conseguido reduzir o gasto no primeiro semestre, ele acredita que não é necessário praticar grandes reduções no orçamento, mas utilizar o recurso da maneira correta. “Paulínia é uma cidade que pode ter tudo do melhor, temos esse privilégio. É difícil comparar com outras cidades porque temos orçamento maior. A questão não é baixar, mas administrar bem o dinheiro. O problema de Paulínia é a gestão certa”, avalia Caprino.Roberto Romano, professor de Ética e Filosofia da Unicamp, acredita que a crise da Petrobras vai afetar o orçamento de Paulínia, que tem no polo petroquímico a maior fonte de sua arredação. Por isso, ele avalia que o dinheiro gasto na Câmara poderia ser melhor utilizado. “Por causa da crise da Petrobras não vai ter como manter o padrão de antes. Poderia dar outra utilidade para esse dinheiro, como investir no Festival de Cinema, por exemplo, que movimenta a cidade e o setor”, defende.Valinhos tem o segundo maior gasto per capita, com média de R$ 69,73 por habitante, seguido por Holambra. Apesar de a cidade ter empenhado “somente” R$ 844,2 mil, a média por habitante é de R$ 64,72, uma vez que o município tem uma população de 13 mil pessoas. O presidente da Câmara de Holambra, Petrus Weel (PTB), atribui o resultado justamente à pequena população do município, que acaba tendo de arcar com uma despesa maior para manter a estrutura enxuta. São apenas 10 funcionários concursados e outros três comissionados. “Realmente tinha conhecimento disso sim, mas isso acontece porque a cidade é muito pequena e o TCE exige uma estrutura mínima, não tenho como reduzir, só se despedir o pessoal. Se pegar o valor total, temos o segundo menor orçamento, mas por habitante aumenta por causa do tamanho da cidade”, argumenta. Depois de Holambra vem Americana, que vive a maior crise financeira de sua história, com dívida estimada pela Prefeitura de aproximadamente R$ 1 bilhão. No entanto, a situação não inibiu a Câmara do município de gastar. Nos seis primeiros meses do ano a despesa atingiu R$ 14 milhões. Com uma população estimada em 226 mil habitantes a Câmara de Americana gastou, em média, R$ 62,08 por habitante. O presidente do Legislativo americanense, Pedro Peol (PV), foi procurado pela reportagem em seu celular, mas não foi localizado. Embora Campinas tenha disparado o maior gasto em termos absolutos, com despesas que ultrapassam os R$ 54 milhões, na conta per capita o Legislativo da cidade tem somente o décimo maior gasto por habitante — R$ 46,80, atrás de cidades com população bem menor, como Monte Mor, Engenheiro Coelho e Santo Antonio de Posse.

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