PANDEMIA

Médico do Mário Gatti conta como é viver 12 meses de frente com a covid

No período de dez meses de 2020 ocorreram 21.313 atendimentos covid-19; um número já elevadíssimo. Uma média de 2.131 atendimentos por mês, ou 71 por dia

Rodrigo Piomonte/ Correio Popular
rodrigo.piomonte@rac.com.br
03/04/2021 às 12:16.
Atualizado em 22/03/2022 às 02:29

Com sua inseparável bengala, o Dr. Sérgio, como é conhecido no Hospital Mário Gatti, nunca passou por um período tão devastador nesses 34 anos de atividade (Diogo Zacarias/ Correio Popular)

A covid-19 fez o atendimento no Hospital Municipal Mário Gatti disparar. A média de atendimento mensal este ano subiu 64% na comparação com a média mensal de março a dezembro do ano passado. No período de dez meses de 2020 ocorreram 21.313 atendimentos covid-19. Um número já elevadíssimo. Uma média de 2.131 atendimentos por mês, ou 71 por dia.

Do início de janeiro até a primeira quinzena de março de 2021 já ocorreram 8.817 atendimentos, uma média de 3.500 por mês, superior à média mensal do ano passado. Os atendimentos passaram para 117 por dia. E todo esse volume ainda sem contabilizar os atendimentos de casos não covid-19, que em média, conforme os dados da Prefeitura, são de 250 por mês desde o início da pandemia.

E no "olho" desse furacão estavam médicos como o clínico geral Sérgio Luiz da Costa Dias, 58 anos, sendo 34 deles dedicados à medicina exercida dentro dos corredores do Pronto Atendimento do hospital de Campinas. O dr. Sérgio, como é conhecido, é o médico mais antigo em atividade no hospital, inaugurado em 1974, há 46 anos. Para ele, como para outros profissionais de saúde e toda a população campineira, os últimos 12 meses jamais serão esquecidos.

O início

A chegada da covid-19 mudou a vida de todos. Muitos perderam empregos, amigos, parentes e tiveram que se reinventar. Outros ainda passam por tudo isso e ainda não sabem quando vão poder descansar. Desde a chegada da doença na cidade, o dr. Sérgio Dias e toda a equipe do hospital enfrentam diariamente uma rotina intensa de dores e conquistas. São jornadas imensas de trabalho e milhares de pessoas em busca de assistência. A maioria se recupera. Outros, não tem a mesma sorte e vão à óbito.

Segundo o médico, em todos os anos de profissão, ele jamais havia imaginado combater um inimigo tão poderoso. A complexidade dos casos, a sobrecarga profissional e a tensão exigiram um esforço que chegou a custar a saúde. Como aprendizado, ele destaca a necessidade de treinamentos e de mais planejamento para evitar o colapso no enfrentamento de futuras catástrofes como esta da covid-19.

"Quando a doença chegou em meados de março do ano passado, nós médicos tínhamos muito medo. Com o passar do tempo aprendemos a trabalhar, descobrindo maneiras de diagnosticá-la rapidamente e resolvê-la. Mas tem sido uma catástrofe viver tudo isso. Precisamos estar sempre preparados para o pior", disse.

Em pouco tempo, conta ele, o hospital que já é acostumado a grandes demandas precisou passar por um verdadeiro remanejamento. Novos profissionais e protocolos tiveram que ser criados para dar vazão às centenas de atendimentos trazidos pela covid-19 e que se acumulavam na porta do Pronto Socorro.

"O hospital precisou ser todo adaptado. Passamos a lidar com o consumo nunca antes visto de insumos, remédios e oxigênio. A mão de obra também precisou ser aumentada. Tudo isso em meio às incertezas e a uma demanda crescente de pacientes, sem contar a exaustão profissional e psicológica das equipes", disse.

A tensão

Entre os momentos mais difíceis no enfrentamento da doença até aqui, o médico destaca a dificuldade de encontrar leitos para receber os pacientes. Ver o avanço da doença dizimando famílias e acometendo colegas de profissão foi muito impactante, segundo ele. O próprio médico adoeceu em meados de agosto.

"Até a chegada da pandemia na rede Mário Gatti, em março de 2020, nosso maior enfrentamento havia sido contra a dengue. Mas depois que chegou o coronavírus o desafio foi conseguir, no dia a dia, leitos para internar os pacientes. Isso ocorreu na primeira grande onda entre julho e agosto do ano passado e tem ocorrido agora novamente", diz.

O médico lembra que quando o vírus parecia dar sinais de trégua, tudo recomeçava em um 'looping' de stress e pressão extremas que se espera estar chegando ao fim.

"Tem sido muito difícil manter a motivação das equipes. Estamos esgotados física e mentalmente. Mas um ajuda o outro. Às vezes o que nos conforta é saber que podemos salvar as pessoas através do nosso trabalho", disse.

Dias não esconde a emoção ao lembrar das mortes presenciadas no Mário Gatti. "Acompanhar pais e filhos morrendo, casais morrendo. E diferentemente da primeira onda, agora pessoas mais jovens também morrem. Isto para nós é muito triste", disse.

A esperança

Nesse período de enfrentamento da pandemia, a rotina tem sido de trabalho oito horas por dia de segunda a segunda. Ele conta que atuou no hospital nesses meses de forma ininterrupta. Mas confia que tudo isso vai acabar.

Olhando para trás, o médico diz perceber que muito se avançou, mas, ao mesmo tempo, diz lamentar por ainda o momento ideal parecer tão distante. "Temos a vacina, mas ainda precisamos de calma".

Segundo ele, a máscara, o álcool em gel e o distanciamento devem continuar fazendo parte do cotidiano das pessoas por um bom tempo, "Só assim a cidade vai ter chances de conseguir vencer essa batalha", conclui.

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