Carolina Sandroni, diretora da Associação Pestalozi: “a necessidade de inclusão só existe porque há a exclusão" (Diogo Zacarias/ Correio Popular)
A decisão do Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo de condenar o diretor de uma escola particular de Paulínia a dois anos e oito meses de prisão em regime aberto e ao pagamento de multa, por ter recusado a matrícula de uma criança com paralisia cerebral, é vista como algo incomum por Carolina Sellin Sandroni, diretora da Associação Pestalozi Campinas. Ela enfatiza que nunca viu acontecer algo semelhante. Para Carolina, a decisão traz um alerta, referente à conscientização por parte da sociedade da necessidade de proporcionar uma escola aberta, que tenha como objetivo ensinar a todos, e não restringir o acesso a pessoas com deficiência.
Devido aos anos de convívio e trabalho com famílias de pessoas com deficiência, Carolina conta que este tipo de situação é comum. Normalmente, diante da recusa de atendimento em escolas, os responsáveis não vão até a Justiça. Segundo ela, são poucos os casos em que isso ocorre. As famílias ficam com receio de que, com essa ação, acabem expondo ainda mais o aluno a uma situação vexatória ou de constrangimento. Em paralelo, também há problemas nas instituições de ensino, que não têm estrutura e recursos humanos adequados para o atendimento das pessoas com deficiência. "É difícil fazer a inclusão acontecer. O direito da pessoa com deficiência ingressar na escola regular é garantido pela legislação, mas nem sempre é cumprido. A necessidade de inclusão só existe porque há a exclusão", analisa.
Jaqueline Gachet de Oliveira, presidente da Comissão dos Direitos da Criança e da Adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Campinas, também reforça que a recusa em realizar matrícula em razão da deficiência é crime. "Muitas vezes, a negativa da matrícula ou outras condutas que visam impedir o acesso à educação de pessoas com deficiência não ocorrem de forma explícita, mas sim velada. Por isso é importante que essas ações sejam de conhecimento da sociedade, para que denúncias possam ser feitas em casos semelhantes, e as penalidades sejam impostas", enfatiza.
Em nota, o Ministério Público de São Paulo (MPSP) afirmou que a denúncia do caso de Paulínia foi oferecida pelo promotor André Perche Lucke. Segundo o relato apresentado pela Promotoria, em 2016 o aluno frequentava o 6° ano na unidade privada de ensino após obter na Justiça o direito à matrícula. Mas, em setembro daquele ano, a mãe do estudante foi chamada à direção da escola e informada que, para garantir a vaga no ano seguinte, precisaria assinar um aditamento ao contrato, se comprometendo a contratar um tutor que acompanhasse o filho nas aulas. Diante da recusa da mãe em assinar o documento, o diretor da escola informou que o aluno não poderia seguir estudando no estabelecimento de ensino.
O MPSP entendeu que diretor da escola particular de Paulínia tentou repassar à família a obrigação e a responsabilidade das despesas decorrentes do atendimento educacional especializado que a criança necessitava. O réu teve recurso negado na segunda instância, e foi condenado com base na lei 7.853/1989, que dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, na sua integração social.
Odisseia
A diretora da Associação Pestalozi Campinas, Carolina Sandroni explica que, frequentemente, as famílias com um integrante portador de necessidades especiais enfrentam uma longa jornada para fazer cumprir o direito do familiar à educação. A entidade tem mais de 40 anos de atividades e foi formada por um grupo de professores de educação especial da Pontifícia Universidade Católica (PUC) Campinas, para trabalhar com pessoas com deficiência grave, que não são atendidas pela sociedade. Hoje, a instituição atende pessoas com deficiências múltiplas, intelectual e com transtorno do espectro autista (Tea). Carolina relata que a Diretoria de Ensino do Estado encaminha à Pestalozi, para a obtenção do ensino formal, os estudantes que esgotaram todas as possibilidades de obter vagas em outras unidades de ensino.