Entidades pediram por respeito e tolerância. Manifestações religiosas e culturais atraíram a atenção de quem passava pelo comércio neste feriado.
Marcha Zumbi dos Palmares (Leandro Torres/ AAN)
Respeito e tolerância. Esses foram os assuntos mais discutidos durante a Marcha Zumbi dos Palmares que reuniu centenas de pessoas no Centro de Campinas hoje. O movimento que luta pela criação de políticas públicas para a superação do racismo no Brasil, deu origem ao Dia Nacional da Consciência Negra, que vive um dos períodos de mais intolerância no País. “Nossa sociedade hoje vive um período mais severo de incompreensão e repleto de ódio. A falta de cultura e conhecimento está dando abertura para o aumento do racismo que é a base para outros tipos de intolerância como a religiosa”, explicou Edna Lourenço, responsável pela organização da marcha. “Todas as religiões e raças têm o seu espaço. Pedimos apenas respeito”, completou Fábio de Matos, representante do Terreiro da Vó Benedita. Segundo dados do Disque 100, do Ministério dos Direitos Humanos, de 2015 até junho deste ano, foram aproximadamente 1.500 registros que incluem violações como desrespeito, xingamento, agressão e destruição de templos. O número representa uma denúncia a cada 15 horas no período. As religiões mais afetadas pela intolerância foram umbanda e candomblé. Quando o assunto é morte, os números assustam mais ainda. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a cada 23 minutos um jovem negro é assassinado no Brasil. Ainda segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), de cada mil adolescentes brasileiros, quatro vão ser assassinados antes de completar 19 anos. Se o cenário não mudar, serão 43 mil brasileiros entre os 12 e os 18 anos mortos até 2021, três vezes mais negros do que brancos. “Vivemos um período de retrocesso no País. Todas as políticas que deveriam empoderar o nosso povo estão caindo por terra. Precisamos lutar contra o genocídio da juventude negra que aumenta a cada dia. O número de morte das mulheres brancas vêm diminuindo, enquanto as mulheres negras estão morrendo”, disse Vanessa Dias, coordenadora da Comunidade Jongo Dito Ribeiro. O Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) também marcou presença na Marcha, defendendo a igualdade social. Para o coordenador da subsede de Campinas, Ramedh Mauch Bittar, o Brasil vive um racismo oculto. “Chamar o jovem negro de 'moreninho' e 'escurinho' é a prova de que temos uma sociedade intrinsecamente racista”, disse. “As cotas muito chamadas de clichês, são só o começo de uma reparação que o País deveria ter feito logo após a Abolição da Escravatura. Os prejuízos são tantos para a população negra e o racismo é tão latente que a remuneração do negro só vai se igualar a do branco daqui 80 anos”, avalia. Para Graziele Rodrigues, coordenadora do Coletivo Quilombo Vermelho e do Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT), a luta contra o racismo está diretamente ligada ao capitalismo. “Historicamente os negros estão sendo vítimas do capitalismo no Brasil. As reformas Trabalhista e Previdenciária prejudicarão ainda mais essa relação. Afinal, o capitalismo explora claramente situação do negro no País. Precisamos refletir o significado dessas mudanças pontuais”, falou. As manifestações culturais e religiosas que começaram na Estação Cultura e passaram por todo o Centro da cidade surpreenderam o comércio que estava movimentado. Pai e filha pararam o passeio para acompanhar a Marcha. “Eu não esperava me deparar com uma manifestação tão bonita. Acho extremamente necessário que a sociedade lute contra a intolerância. Esse tipo de protesto está cada vez menor e não podemos perder a nossa essência e muito menos o respeito”, disse o projetista Newton Cossi Lapresa, de 59 anos. A filha, Larissa Lapresa, de 18 anos, estudante de psicologia, manteve o olhar atento a cada ação do grupo. “Eles estão chamando a atenção. E é assim que deve ser. Precisamos acordar para a intolerância no Brasil. Apoiamos a causa e pedimos por mais respeito sim”, falou. A secretária Municipal de Assistência Social e Segurança Alimentar, Eliane Jocelaine Pereira criticou as piadas e brincadeiras racistas tão comuns nos diálogos da sociedade. “É crime. Vivemos um racismo escancarado e tempos muito difíceis. Os negros representam 54% do País, mas são 71% das vítimas de homicídio. Em dez anos o número de brancos assassinados caiu 12%, mas o de negros aumentou 18%. Precisamos mudar essa realidade. A situação não pode continuar neutralizada”, afirmou.