Presidente almeja promover a transparência e a participação popular
Rossini já saiu candidato a prefeito, mas reconhece que é imprescindível ter estrutura e apoio robusto, além de muita vontade; hoje, ele diz não ver essa possibilidade em sua missão política (Rodrigo Zanotto)
Nascido em São Paulo (SP), o vereador Luiz Carlos Rossini é uma das figuras mais conhecidas no cenário político das últimas décadas em Campinas. Eleito presidente da Câmara Municipal para o biênio 2023-2024, veio para Campinas junto com a CPFL, empresa em que trabalhava. Foi aqui que o parlamentar começou a sua trajetória na política, contaminado pela efervescência que dominava o Brasil nos anos finais da Ditadura Militar e no período de redemocratização que se seguiria.
Filiado ao PMDB, Rossini foi vereador por três mandatos, entre as décadas de 80 e 90. Em 2000, buscou uma candidatura a prefeito de Campinas na mesma eleição que foi vencida por Antônio da Costa Santos, o Toninho do PT, assassinado com menos de um ano de mandato. Durante a gestão do prefeito petista, o atual presidente da Câmara Municipal foi diretor de esportes.
Nessa mesma época,Rossini se filiou ao Partido Verde (PV), onde permanece até hoje. Ele afirma que a sustentabilidade e preservação do meio ambiente são temas relevantes para ele pessoalmente, que é o único vereador de Campinas pelo partido. Mesmo sem correligionários, a capacidade diplomática e experiência como agente público do município o levaram à liderança de governo na Câmara durante a primeira parte da legislatura e, agora, à presidência da Câmara, vencendo a eleição em dezembro do ano passado, com 21 dos 33 votos dos vereadores.
Com uma CPI em andamento para apurar denúncias de suposta cobrança de vantagens indevidas em contratos de terceirizadas na Câmara, Rossini enfrentará missões ainda mais árduas, como a de recuperar parte da credibilidade perdida.
Além de ser o líder da Câmara na segunda metade do mandato do prefeito Dário Saadi (Republicanos) - quando se espera que sejam aprovadas leis que garantam a requalificação do Centro e a resolução dos problemas das enchentes -, o presidente almeja aproximar a Casa da população, promover transparência nas atividades e decisões e incentivar a participação de especialistas e dos próprios parlamentares em diversos temas que estarão em debate na Câmara - tudo dentro do decoro e fora da radicalização que tomou conta do cenário brasileiro e também do Legislativo campineiro nos últimos anos.
Para ele, a Casa precisa atuar como uma caixa de ressonância da sociedade. A partir de projetos ambiciosos, ele pretende iniciar uma nova fase e, ao mesmo tempo, retomar bons programas já criados, como o Parlamento Jovem. Confira a seguir, os principais trechos da entrevista concedida na quinta-feira (19) por Luiz Rossini, em visita ao Correio Popular, a convite do presidente-executivo do jornal, Ítalo Hamilton Barioni.
Conte-nos sobre a sua trajetória, trabalho e militância antes mesmo da experiência política partidária.
Nasci em São Paulo, na Freguesia do Ó, e vim para Campinas junto com a CPFL. Sou administrador de formação e fazia estágio lá no meu último ano. A sede da CPFL ainda era na Avenida Angélica, em São Paulo. Fui efetivado logo que entrei como estagiário e, em 1979, a companhia veio para Campinas. Acabei desenvolvendo uma carreira aqui e cheguei a gerente de departamento. Por intermédio da CPFL, assumi a Diretoria Financeiro das Centrais Elétricas de Rondônia. Foi em 1983, quando vivíamos aquela época da redemocratização, Diretas Já, uma efervescência política da qual comecei a participar e me interessar. Decidi então me filiar ao, na época, PMDB. Havia um núcleo do partido entre os empregados da CPFL. Comecei a militar e assumi a coordenação desee núcleo. Em 1988, Manoel Moreira foi candidato a prefeito pelo PMDB e o núcleo obteve o direito de indicar um candidato a vereador. Nunca planejei isso para a minha vida, mas me convenceram de que levava jeito. Era presidente do clube dos empregados da CPFL e saí candidato, elegendo-me já na primeira tentativa. Fiquei três mandatos pelo PMDB. Em 2000, fui candidato a prefeito na mesma eleição que o Toninho do PT venceu. Ele me convidou e fui seu diretor de esportes. Depois da morte dele, saí e fui convidado a ir para o Partido Verde. Claudio Di Mauro era o prefeito de Rio Claro na época. Ele agendou e estive em uma reunião com a cúpula do PV. Tinha o [José Luiz] Penna, que é presidente até hoje, o Domingos Fernandes... Para ser sincero, estava meio... não sei se desiludido ou frustrado dentro do PMDB, mas a visão de política e sociedade que aquela cúpula me passou despertou-me. Fui para o PV e decidi fazer um mestrado em meio ambiente na Unicamp. Em seguida, em 2012, saí candidato novamente. Estou no terceiro mandato seguido agora pelo Partido Verde.
Entrar no PV foi ao encontro das questões ambientais que lhe eram importantes?
A minha entrada no PV, permitiu-me direcionar o mandato para essas questões que já eram importantes para mim. Tanto, que sou vereador constituinte, porque ajudei a elaborar a Lei Orgânica do Município de 1989. É da minha autoria o artigo que obrigava o município a tratar 100% do esgoto no prazo de dez anos. Passada uma década, em 1999, o prefeito era Chico Amaral e o promotor José Roberto C. Albejante entrou com uma ação porque Campinas tratava apenas 5% do seu esgoto. Isso levou a Prefeitura e Sanasa a firmarem um Termo de Ajuste de Conduta (TAC), que previa a apresentação de um plano de saneamento. Tratamento de esgoto é algo que não se faz da noite para o dia. É um plano de no mínimo 15 anos. Foi aí que se iniciou esse programa encerrado há alguns anos com a última Estação de Tratamento de Esgoto. Então, de fato, eu já tinha essa preocupação e, no PV, pude me dedicar um pouco mais a essa causa tão importante. Estamos sofrendo hoje consequências daquilo que não fizemos lá atrás. As mudanças de clima são uma realidade. Todas as cidades estão sofrendo para enfrentar e mitigar as consequências dessas mudanças, os eventos extremos. De forma geral, elas não estão preparadas para fazer frente ao que está acontecendo. É um tema caro para todos nós. Dependemos de políticas públicas para atingir qualidade de vida e sustentabilidade no âmbito local, sem ficar apenas poetizando. Porque a gente precisa desenvolver e gerar emprego, mas como equilibrar as coisas e reduzir a injustiça social? Na época, isso me deu um despertar, renovou o meu ânimo para a política, assim como agora ao assumir a presidência da Câmara. É uma nova motivação. Sei que o desafio é enorme e a responsabilidade, imensa, mas isso me motiva. Acho que há muito o que fazer para resgatar a imagem da Câmara. E que o Poder Legislativo no Brasil vem passando por um processo de desgaste. Há um movimento generalizado contra as instituições, mas muito canalizado à política e, principalmente, ao Legislativo.
Quais foram as mudanças perceptíveis do que era a Câmara em seus primeiros mandatos para hoje?
A relação do vereador, antigamente, era direta com a população. Ele tinha de ir aos bairros, fazer reuniões nas casas. Acho que essa proximidade ajudava a população a fiscalizar mais de perto e o vereador se sentia mais cobrado. As redes sociais são importantes e acredito que todo vereador hoje se comunica diariamente por elas, mas, às vezes, parece algo frio, distante... é uma mudança que eu percebi. Eu sou ainda meio analógico, mas estou tentando me tornar um pouco mais digital. Temos que explorar o que isso pode oferecer de bom, porque, de fato, agiliza o contato. Recebemos um número maior de demandas, solicitações e, nesse aspecto, é bom.
Nos últimos anos, o líder da Câmara passou a ter que lidar com falta de respeito durante esse período de radicalização da política...
Isso, para mim, é muito nocivo para a política, porque as pessoas não debatem mais conteúdo. Essa última eleição para presidente, por exemplo: qual era o programa do Lula? Do Bolsonaro? Acho que a maioria do eleitorado não estava interessada nisso. O que pretendo para a Câmara, na minha visão de resgate de credibilidade, é trazer todos para os debates de temas que são de interesse do município. A Câmara tem de ser uma caixa de ressonância da sociedade. Trazer entidades, instituições. Vamos debater à exaustão e entender porque chegamos aqui e quais soluções podemos oferecer aos nossos problemas. Trazer discussões com diferentes opiniões.
Além de ampliar as discussões com diferentes pontos de vista, que outras mudanças o sr. pretende levar à Casa Legislativa?
Transparência. Tudo o que acontece na Câmara é público e a população, sociedade e imprensa têm direito de saber. Os contratos que estão lá, os projetos... Por isso, estou pedindo ao pessoal ver onde podemos melhorar e aumentar a transparência. Mudando o site, aproximando mais a relação com a imprensa, a sociedade dentro da Câmara. Acredito que esse contato é que pode ajudar a sociedade a mudar a forma de entender o papel e atuação dos vereadores.
A questão do resgate da credibilidade e importância do Legislativo não passa também por uma questão de produtividade?
Acredito que a Câmara tem de criar as estruturas necessárias para o vereador ter condições de exercer seu mandato na plenitude. Na estrutura da Casa, temos as Comissões Temáticas e acho que cada uma delas deveria ter uma assessoria técnica para ajudar. Porque não é apenas dar um parecer quando chega um projeto. Se você tem alguém ali pensando sobre o assunto, talvez melhore a qualidade da produção e, certamente, aparecerão mais propostas. Aposto nisso como um instrumento. Uma parte da população ainda vê o vereador como aquele que se chama quando tem uma árvore que precisa podar ou um buraco em frente à residência, mesmo com a Prefeitura tendo canais para isso. Essa relação da população com o vereador vai continuar. Não que isso seja algo ruim, negativo, mas você pode dar um salto. Tenho que defender a instituição e os vereadores, dar condição para que eles cumpram o seu papel. Se a gente conseguir fazer 10% do que eu estou sonhando...
A retomada do Parlamento Jovem é uma iniciativa nessa linha de aproximar a Câmara da sociedade?
Sem dúvida. O Parlamento Jovem começou lá atrás. Tínhamos um professor na rede municipal que conversou comigo em um dos meus primeiros mandatos e criamos a figura do “vereador estudante”. Depois, ele ganhou outra roupagem, mais institucional, e passou a se chamar Parlamento Jovem. As escolas se cadastram no programa e elegem ou indicam quem vai representar a escola como vereadores. Eles vão para a Câmara e 33 vereadores suplentes elegem a mesa e, durante um período de seis meses, levam projetos, fazem indicação. Acho um instrumento importante, uma ferramenta para isso.
Voltando ao tema da sustentabilidade, como fazer para que não ocorra nos eixos de expansão, como o da John Boyd Dunlop e do Ouro Verde, o que acontece no Centro?
O Plano Diretor estabelece parâmetros para possibilitar o desenvolvimento de novos empreendimentos que garantam um percentual mínimo de permeabilidade do solo, por exemplo. Hoje, você tem que apresentar um estudo de impacto ambiental. Então, há instrumentos que propõem esse desenvolvimento de forma sustentável. Tem que aplicar a legislação e a ambiental de Campinas, hoje, é referência para o Brasil.
Ainda na sustentabilidade, mas em outro viés, como o sr. vê o projeto do HIDS, de um bairro inteligente, sustentável?
Um dos problemas de Campinas é que você tem um Distrito Industrial e coloca nele apenas indústrias. E a pessoa tem de atravessar a cidade para trabalhar. Ou então uma área que é somente residencial, mas não tem serviços, comércios. O conceito de cidade mista está no nosso Plano Diretor e a ideia é a de otimizar a infraestrutura. Eu acho, conceitualmente, isso fantástico, porque você vai ter tecnologia, serviço, comércio e residência. Particularmente, fiquei positivamente impressionado com a proposta e acredito que é uma oportunidade que devemos experimentar. Também sou favorável, assim como o Correio Popular, à proposta de requalificação do Centro, que merece toda a atenção e cuidado. O Centro é o coração da cidade.
Sobre a Requalificação do Centro, de que maneira a Câmara pode contribuir, além de votar favoravelmente aos projetos?
Com debates. Colocar especialistas, pessoas com visões diferentes, ouvir prós e contras e formular propostas. No primeiro mandato do Jonas (Donizette), criei uma Comissão para entender esse fenômeno. Eu não conhecia a estrutura que a Prefeitura oferecia à população em situação de rua. Campinas é referência nessa área. Existem equipes que ficam diariamente na rua fazendo contato, cadastrando, conhecendo. Eles primeiro buscam criar um vínculo com a pessoa, para então entender um pouco sobre a realidade dela. A partir daí, por meio do trabalho de convencimento, fazer com que ela adira aos programas que a Prefeitura oferece. O fenômeno da população de rua é global. Parte da sociedade tem um olhar humanitário, querendo ajudar, e parte quer tirar da frente. Não é algo simples.
O sr. assume a presidência da Câmara enquanto há uma CPI que apura denúncias de corrupção. Como encara a atuação da CPI?
A CPI tem autonomia e vou garantir que ela possa cumprir o seu papel sem qualquer ingerência. Vejo nos membros da CPI a maior disposição e seriedade em fazer o que deve ser feito. Vamos aguardar o resultado do relatório e tratar o assunto como se deve. Acho que a CPI tem que dar uma resposta à sociedade.
O senhor disse estar com o ânimo renovado. Existe aspiração para administrar a Prefeitura?
Já fui candidato a prefeito e sei que é uma coisa que não depende somente da minha vontade. Se você não estiver estruturado e contar com um forte apoio... Enfim, hoje não vejo isso na minha missão. Quero continuar na política, ponto. Então, vou, no mínimo, disputar a reeleição. Até porque, se conseguir tornar realidade nestes dois anos apenas um pouco do que discutimos aqui - e a cidade reconhecer isso -, talvez possa dar continuidade em um próximo mandato. Deixar um legado.
Por fim, quais são os seus hobbies?
Sou aficionado em séries. Ligo a televisão para ver reportagens, futebol e séries. Assisti três vezes 'Vikings' e achei a série fantástica. 'House of Cards' também, que mostra os bastidores da política dos Estados Unidos. Jogo bola, um dos meus hobbies de preferência. E olhe que tenho 67 anos, mas ainda bato uma bolinha. E, claro, estar com os amigos, né. O futebol, hoje, é um pretexto na verdade (risos). Sou palmeirense e estou lendo "Cabeça Fria, Coração Quente", do Abel Ferreira [técnico do Palmeiras]. O cara é estudioso, tem uma filosofia. O último livro que li foi o "Pós-verdade - a nova guerra contra os fatos em tempos de fake news", do Matthew D'Ancona, um jornalista inglês que analisa o que ele chama de pós-verdade, a partir de dois eventos: o Brexit na Inglaterra e a eleição de [Donald]Trump. E o legal é que quando você lê aquilo, percebe que é também a nossa realidade aqui, a construção das narrativas, das fake news.