TRANSPORTE PÚBLICO

Lucro limitado e custo elevado afetaram licitação dos ônibus

Prefeitura agora estuda ajuste nos termos para atrair o interesse das empresas

Luis Eduardo de Sousa/ [email protected]
22/09/2023 às 09:06.
Atualizado em 22/09/2023 às 09:06
A licitação também abrange o BRT, que contará com uma frota mais moderna, equipada com ar-condicionado, wi-fi, tomadas USB, câmeras, GPS e terminais de computador de bordo (Alessandro Torres)

A licitação também abrange o BRT, que contará com uma frota mais moderna, equipada com ar-condicionado, wi-fi, tomadas USB, câmeras, GPS e terminais de computador de bordo (Alessandro Torres)

A insatisfação em relação ao baixo valor dos repasses provenientes dos recursos gerados pelo sistema de transporte público municipal, juntamente com os elevados custos associados à implementação de tecnologias embarcadas nos ônibus, como sistemas de wi-fi, ar-condicionado e veículos elétricos na frota, parece ter sido um dos principais fatores que contribuíram para o movimento de "boicote" contra o processo de licitação do transporte em Campinas. Esse movimento resultou no desinteresse generalizado das empresas em apresentar propostas para a seleção de uma nova operadora para o sistema. A própria Prefeitura identificou essas hipóteses como possíveis razões para a situação.

Analisando o que ocorreu em São José dos Campos, onde uma situação semelhante foi registrada e três licitações malsucedidas foram realizadas, é provável que a Administração municipal precise fazer ajustes nos termos da licitação para atrair participantes interessados.

A abertura dos envelopes contendo as propostas para a licitação ocorreu na última quarta-feira, e o processo foi considerado "deserto" por não receber nenhuma manifestação de interesse, nem mesmo das empresas já estabelecidas na cidade. A despeito desse desfecho inesperado, a Prefeitura garantiu que isso não afetará o serviço de transporte, uma vez que já existe um contrato vigente com os atuais prestadores de serviços até 2026. Diariamente, mais de 440 mil pessoas utilizam os mais de 800 ônibus que operam em 216 linhas na cidade.

Em resposta à falta de propostas, o presidente da Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec), Vinicius Riverete, considerou esse problema como comum em grandes cidades, afirmando que tais localidades têm enfrentado processos longos para consolidar licitações de transporte público.

Em São José dos Campos, cidade situada a 150 km de Campinas e com aproximadamente 700 mil habitantes, a administração municipal enfrentou desafios semelhantes em três ocasiões. Segundo informações da assessoria de comunicação da Secretaria de Mobilidade Urbana da cidade, o desinteresse das empresas "parece ter sido motivado pela exigência de incorporar mais veículos elétricos à frota", o que teria desagradado o empresariado.

Em Campinas, esse também parece ser um dos fatores que desanimaram os empresários. O edital da licitação, que tem enfrentado uma década de incertezas, estabelece a necessidade de "ônibus novos, mais confortáveis, silenciosos e menos poluentes". Além disso, o documento demanda "redução no tempo de espera nos pontos, estações e terminais, viagens mais rápidas e o fim do crédito expirado". Atualmente, o crédito do Bilhete Único tem validade de apenas um ano após a última recarga.

"A licitação também abrange a operação do BRT, que contará com uma frota mais moderna, equipada com ar-condicionado, wi-fi, tomadas USB, câmeras, GPS e terminais de computador de bordo, além dos serviços de manutenção, limpeza, vigilância e reparos das estações", informou a Emdec ao lançar a versão mais recente do edital, em julho. As exigências destinadas a modernizar o sistema de transporte, que pouco mudou ao longo das décadas, parecem ter gerado a impressão de que o processo se tornaria mais oneroso para os potenciais concorrentes. Isso levou à preocupação de que a operação poderia se tornar financeiramente inviável, semelhante ao que ocorreu na cidade do Vale do Paraíba.

GUERRA JUDICIAL

Outro elemento que contribui para o clima de apreensão em relação ao processo de licitação diz respeito às disputas legais que têm surgido nos tribunais. Segundo informações da Prefeitura, foram registradas pelo menos 20 ações judiciais com o intuito de contestar a licitação, sendo que esse movimento se intensificou nas últimas semanas.

No âmbito do Tribunal de Contas de São Paulo (TCE-SP), pelo menos quatro dessas ações foram protocoladas no tribunal. O Correio Popular teve acesso aos documentos relacionados a esses processos, nos quais se constata que as ações foram movidas pelo Sindicato das Empresas de Transporte Metropolitano e Urbano de Passageiros da Região Metropolitana de Campinas (SetCamp). Tanto a entidade quanto a sua defesa optaram por não comentar sobre o assunto.

Dentre as 20 ações judiciais, foram apresentados 50 questionamentos, dos quais 14 foram acatados pelo TCE e exigiram modificações por parte da Administração. Essas modificações incluíram a atualização do valor da concessão, que passou de R$ 7,6 bilhões (valor anterior) para R$ 8,2 bilhões, e a atualização da data-base, que foi alterada de novembro de 2022 para maio de 2023.

Além disso, abordaram questões como investimentos e insumos, a solicitação de uma tecnologia mais limpa para os veículos, passando de Euro V para Euro VI, bem como uma análise mais detalhada dos custos de operação e manutenção do BRT, além de uma explanação detalhada da composição dos custos da garagem. O Serviço Seletivo de transporte foi retirado do escopo da licitação, e as garantias contratuais foram reduzidas de 10% para 5% do valor do investimento. Quanto aos demais processos, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) não divulgou informações sobre os autores.

EMDEC

A Emdec emitiu na quinta-feira (21) um novo comunicado para esclarecer a situação. Na declaração, a empresa assegura que "a operação não enfrenta riscos, uma vez que o contrato em vigor permanece válido até 2026".

A nota também destaca que o contrato anterior, de 2006, foi concedido através de licitação pelo valor de R$ 3,2 bilhões, e que agora "uma avaliação será conduzida para determinar os próximos passos".

"A licitação, que respondeu a todos os questionamentos do MP e foi republicada em 14 de julho de 2023, sofreu diversos outros questionamentos e ações, desde a semana passada, todos negados pela justiça. Isso só comprova a legalidade e a lisura do processo", finaliza o texto.

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