Prefeitura, que pagou por um trabalho no viaduto, resolve apagar obra de artista independente
O "não autorizado" Del Pires se inspirou no amor e teve arte removida (Thomaz Marostegan)
A paisagem urbana sob o Laurão (Viaduto Laurão), em Campinas, vive uma metamorfose a cada dia. Desde a arte de rua entregue pelo famoso grafiteiro Gustavo Nénão, no fim de abril, as pilastras de sustentação do local receberam outras cinco obras em grafite, estas assinadas pelo artista plástico Sandro Del Pires. A “exposição de arte de rua” chamou a atenção dos motoristas que passam pelas avenidas Norte-Sul e Princesa d’Oeste e atraiu diversos visitantes interessados em tirar fotos por lá. No entanto, o cinza dos muros voltou a se sobrepor ao colorido do grafite nesta semana. Ao contrário de Nénão, que foi contratado pela Prefeitura para fazer seu trabalho no Laurão, para retratar a Campinas do início do século 20, Del Pires não tinha autorização para fazer suas pinturas no espaço. Com isso, a Secretaria Municipal de Cultura enviou uma equipe ao local na última segunda-feira e apagou as cinco obras. O artista plástico admite ter feito as artes por conta própria, mas lamenta a “guerra do grafite” instalada no local. “Como muitos artistas da região, já tinha tentado entrar em contato com a Secretaria de Cultura, mas meus pedidos sempre ficaram engavetados. Eu estava de olho no Viaduto Laurão há muito tempo, e quando vi a obra do Nénão, conversei com ele e perguntei se ele ia pintar só aquela pilastra. Como ele não ia pintar as outras, resolvi ir lá no feriado de 1º de Maio e fiz meus trabalhos também”, lembra Del Pires, que retratou em suas obras imagens de casais apaixonados. “Eu quis compartilhar a felicidade dos casais e o símbolo do amor para a população de Campinas e fez um sucesso muito grande. Aí, no dia seguinte, a Prefeitura me chamou pela primeira vez pra conversar, mas condenaram o que eu fiz e disseram que eu podia até ser processado. Perguntei se as obras continuariam lá, e disseram que sim. Duas semanas depois, um assessor me ligou dizendo que teria que retirar uma das pinturas, pois estava atrapalhando a anterior. Mas tiraram todas, de forma arbitrária”, afirma. Natural de São Paulo, Del Pires iniciou seu caminho rumo ao mundo da arte aos 8 anos, quando se mudou para Montevidéu, no Uruguai. Lá, arriscou seus primeiros desenhos, que já despertaram a atenção das pessoas com as quais convivia. Formou-se em artes plásticas no Instituto Universitário Nacional de Artes (IUNA), em Buenos Aires, na Argentina, e já fez trabalhos para artistas como Jorge Ben Jor, Seu Jorge, Alcione, além de Arun Manilal Gandhi (neto de Mahatma Gandhi) e do empresário português Armindo Dias, dono do hotel The Royal Palm Plaza, que faleceu nesta semana. “Vivo em Campinas e me senti traído pela cultura da minha cidade”, desabafa o artista plástico.