Recuperação da área ‘desmatada’ do Taquaral deverá levar três anos; verba que financiará o trabalho será proveniente das vendas das toras de eucalipto que foram removidas, totalizando cerca de 3 mil metros cúbicos (Alessandro Torres)
A Prefeitura de Campinas anunciou ontem, durante reunião no Palácio dos Jequitibás, um plano diretor para traçar estratégias de recuperação para o Parque Portugal (Lagoa do Taquaral) e para o Bosque dos Jequitibás. O plano deve nortear a Administração sobre as espécies de árvores que devem ser plantadas e o desenho de plantio, que deve ser adotado privilegiando segurança, conforto e benefícios à fauna e flora, além dos usuários. O trabalho vai ser realizado através de uma parceria entre o município e o Estado.
O Parque do Taquaral ficou fechado por exatos dois meses, entre janeiro e março, depois que um eucalipto caiu e atingiu uma criança de 7 anos que participava de um piquenique no local. A jovem Isabela Tibúrcio não resistiu aos ferimentos e morreu. Durante o período em que esteve fechado, todos os eucaliptos do local foram removidos, gerando controvérsia entre frequentadores contrários a ação. Já o Bosque dos Jequitibás foi fechado em 26 de dezembro do ano passado, depois que um jacarandá caiu na Rua General Marcondes Salgado e vitimou o jovem Guilherme da Silva, de 36 anos, e até ontem não havia sido reaberto e sem uma previsão para que isso aconteça.
A adoção do plano diretor foi anunciada pelo prefeito Dário Saadi (Republicanos) na presença do secretário de Serviços Públicos, Ernesto Dimas Paulella, dos vereadores Zé Carlos (PSB), Otto Alejandro (PL) e Higor Diego (Republicanos), de um representante do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), Fernando Vidal e dos especialistas em arvorismo Marco Aurélio Nalom, do Instituto de Pesquisa Ambientas (IPA) e Demóstenes Ferreira da Silva, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq).
Em parceria com o município, a Esalq e o IPA vão realizar a construção do plano para os parques. No caso do IPA, o instituto deve escolher as espécies que serão usadas no plantio, nativas da mata atlântica. “Serão plantadas árvores que ofereçam segurança aos frequentadores, que atraem a fauna e que futuramente possam gerar sementes para o próprio município”, explicou Marco Aurélio. A área em questão corresponde a três hectares.
O corpo técnico da Esalq, por sua vez, será responsável por delimitar os espaços de plantio das árvores, de forma a providenciar que as raízes cresçam fortes e não ofereçam risco aos frequentadores. Os especialistas devem ainda traçar um desenho de plantio que favoreça a circulação de pedestres entre elas e a realização de atividades recreativas. “Árvore é risco. Apesar de ser sinônimo de saúde coletiva, as árvores têm enorme potencial de destruição quando caem. Há no Brasil uma cultura de pensar só lá na frente, no quão bom a árvore vai ser quando crescer, mas sem pensar que ela pode cair, sem pensar para onde essa raiz deve crescer”, explicou Demóstenes.
A reconstrução da área ‘desmatada’ do Taquaral deverá levar três anos, e a verba que financiará o trabalho será proveniente das vendas das toras de eucalipto que foram removidas, que totalizam cerca de 3 mil metros cúbicos. O secretário de Serviços Públicos, Ernesto Paulella, disse que não sabe estimar o valor que a venda da madeira deve gerar, mas disse que acredita que somente a venda dos eucaliptos seja capaz de quitar a requalificação do espaço. A reportagem apurou com madeireiras da Região Metropolitana de Campinas (RMC) que o eucalipto bruto é comercializado a cerca de R$ 900 o metro cúbico. Isso significa que a venda conferiria ao Executivo um valor aproximado de R$ 2,7 milhões.
Apesar dos três anos de trabalho previstos, a estimativa é de que as árvores atinjam a idade suficiente para dar sementes, com copas já arejadas, em 30 anos. Isso significa dizer que, nos moldes que era antes, o espaço pode levar até três décadas para se caracterizar novamente.
A estratégia de usar espécies nativas tem como objetivo requalificar o ambiente atraindo a pequena fauna e promovendo a captura de carbono. O secretário Paulella deu alguns exemplos de espécies que devem ser empregadas no replantio. “Jequitibá, peroba rosa, guatambu, guarantã, caviuna, cabreuva, a lista é grande. Os benefícios são muitos. Primeiro em relação a pequena fauna, já que o eucalipto a espanta por causa do odor muito forte. As árvores nativas são muito atrativas porque além de não terem o odor produzem frutos. A presença da pequena fauna alinhada aos frutos gera reprodução, gera maior captura de carbono” disse o titular de Serviços Públicos.
A Esalq, agora empregada para traçar projeto em Campinas, já realizou ações de grande porte no mesmo sentido pelo estado afora. Um dos grandes projetos foi a requalificação do Parque do Ibirapuera, na capital, que aconteceu entre 2014 e 2017. Paulella disse, no entanto, que o projeto do Taquaral deve trazer ainda mais árvores nativas que o existente no parque paulistano.
Por fim, Dário disse que, caso os recursos provenientes das vendas dos eucaliptos não sejam suficientes, o Executivo deve aportar o término de imediato com recursos do tesouro municipal.
Árvores que serão removidas no Bosque dos Jequitibás estão marcadas, mas Prefeitura aguarda autorização do Condephat para que o manejo seja feito (Alessandro Torres)
JEQUITIBÁS
No Bosque dos Jequitibás, que permanece fechado e sem previsão para ser reaberto, o plano diretor servirá para definir as árvores que serão plantadas no lugar das 108 que serão removidas. A reportagem do Correio Popular esteve ontem no parque, depois de mais de seis meses com o acesso controlado, o que não dava margem à entrada de nenhum veículo de imprensa. Os exemplares que serão removidos estão marcados, mas a Prefeitura aguarda agora uma autorização do Condephat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico), órgão estadual, para que o manejo das árvores seja feito. A autorização é necessária, pois toda área do Bosque é tombada.
“Os exemplares a serem cortados foram escolhidos com base em análises técnicas. Tem árvores, por exemplo, que estão secas e mortas. Outras cresceram tortas para procurar o sol, já que o espaço entre as copas é disputado. Essas, especificamente, serão removidas mesmo saudáveis, porque numa situação de solo encharcado o centro de gravidade dos troncos ocasiona queda da árvore”, explica João Pedro Sangaletti, engenheiro florestal da prefeitura.
Ontem, o prefeito avaliou que os dois acidentes envolvendo árvores nos dois parques proporcionarem-lhe “os momentos mais terríveis de sua gestão”.
Questionado sobre o caráter impopular da remoção das árvores em ambos os Parques, Dário disse que não se intimida com opiniões contrárias, já que a ação tem parecer essencialmente técnico. “Temos o laudo, e é o laudo que define. Eu sei que depois que as árvores foram removidas teve gente reclamando, mas essa é uma ação que tem que ser macho para tomar. Se porventura cai uma árvore, mata alguém, quem vai pagar o pato?”, disse.
Os estudos estão sendo realizados desde março pelos órgãos envolvidos. De acordo com o IPA, Campinas tem cerca de 11,4 hectares de área nativa, o que corresponde a 14,4% do território municipal.