ECONOMIA

Jovens encaram crise econômica pela 1ª vez

São recém-formados ou profissionais ainda com pouca experiência que precisaram aprender a entender a situação financeira do País e passaram a sentir na pele os efeitos de um mercado interno pouco aquecido

Eric Rocha
12/07/2015 às 07:00.
Atualizado em 28/04/2022 às 16:39
Fila para dar entrada no seguro-desemprego, no Poupatempo da região central; percentual de desempregados chegou a 6,7% em maio (Camila Moreira/ AAN)

Fila para dar entrada no seguro-desemprego, no Poupatempo da região central; percentual de desempregados chegou a 6,7% em maio (Camila Moreira/ AAN)

Inflação, ajuste fiscal, dólar em alta e desemprego são algumas palavras que pareciam distantes da realidade de jovens entre 20 e 30 anos até recentemente. Pouco atingidos pela crise internacional de 2008, essa parcela da população vive agora em 2015 a primeira recessão econômica da vida. São recém-formados ou profissionais ainda com pouca experiência que precisaram aprender a entender a situação financeira do País e passaram a sentir na pele os efeitos de um mercado interno pouco aquecido.Olhar de perto o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial, ajuda a entender um pouco desse contexto novo para alguns. Entre maio de 2009 e junho de 2010, quando alguns jovens dessa faixa etária ainda estavam estudando, houve alta nos preços praticados pelo mercado, mas ele ficou em 4,84%. Cinco anos mais tarde, os valores dispararam e o índice atingiu os atuais 8,89%, no cálculo do período compreendido entre maio de 2014 e junho de 2015. Vários itens muito utilizados pelos jovens registraram altas expressivas nos últimos 12 meses. Já o Produto Interno Bruto (PIB), que mede a riqueza e o nível de atividade econômica, mostrou um Brasil que cresceu 7,6% em 2010. Um panorama completamente diferente do esperado pelo mercado para este ano: a expectativa é que haja uma recessão de 1,5%.E se os preços estão em alta e a economia não gira, as empresas não faturam e quem sofre são os empregados. A taxa de desemprego, que fechou 2014 em 4,8%, já chegou a 6,7% em maio. O publicitário Julian Renzulli, de 29 anos, afirmou ter sentido um pouco os efeitos de 2008, quando trabalhava como vendedor em uma loja de tintas, mas que nada se compara ao que vive hoje. “A agência onde eu trabalhava vinha perdendo clientes desde o início do ano passado”, disse. Os maus resultados da empresa acabaram fazendo com que ele fosse demitido em fevereiro e a busca pela realocação no mercado até agora tem sido um processo nada fácil.“Está muito difícil porque a quantidade de ofertas diminui muito e, quando tem, querem pagar menos. Todo mundo fala que está sem dinheiro”, comentou Renzulli, que segue fazendo um curso de pós-graduação para tentar se diferenciar dos outros profissionais. O jovem está de casamento marcado para setembro e a perda do emprego provocou alguns cortes na festa. Ele pode também perder cerca de R$ 35 mil que investiu para começar a comprar um imóvel na planta, uma vez que teme não conseguir o financiamento. Com 25 anos, Raphael Henricky Lopes da Silva também tem sentido os efeitos da crise. Depois de trabalhar um longo período como autônomo, ele buscava na última sexta-feira um emprego fixo em uma agência de empregos no Centro de Campinas. A ideia é acumular as duas funções para aumentar a renda. “Entreguei vários currículos e até agora nada. Cada vez mais as empresas exigem mais requisitos, mas querem pagar menos”, disse o jovem. A atendente Sabrina Reis, de 28 anos, perdeu o emprego em uma panificadora no último mês. Na fila para dar entrada no seguro-desemprego, no Poupatempo da região central, ela comentou que sabe que os próximos meses devem ser difíceis. “Fico com medo porque está complicado arrumar trabalho. Estou estudando, mas preciso pagar isso”, afirmou.Uma arquiteta de 25 anos, que prefere não se identificar, contou que o escritório onde trabalha em Campinas ainda tem um grande volume de projetos, mas que os clientes têm optado por fazer as obras por etapas, adiando pagamentos que antes vinham de uma vez só. A solução da direção foi cortar salários e diminuir as cargas horárias dos funcionários em 20%, caso contrário poderia haver demissões. “Tive que recalcular as coisas do meu dia a dia, vou ter que dar uma cortada. É complicado porque eu conheço várias pessoas que são recém-formadas e não têm trabalho. Em longo prazo tende a melhorar, sempre é assim. Tem o alto e o baixo, e acho que vamos ficar nele por um tempo considerável”, disse a jovem, que atua como profissional liberal. A decisão tomada pelo escritório onde ela trabalha se assemelha ao conjunto de medidas autorizadas pelo Programa de Proteção ao Emprego (PPE), lançado na semana passada pelo governo federal. A partir dele, empresas vão poder reduzir 30% dos salários e das cargas horárias dos funcionários. O trabalhador, no entanto, terá metade dessa redução paga com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). O objetivo é frear as demissões e os gastos do Estado com o seguro-desemprego.“O mundo está ensaiando uma recuperação e o Brasil está entrando na crise. O governo apostou muito em que se criando a demanda, a oferta iria atrás. Só que na prática isso não é assim, porque temos um capitalismo enfraquecido. As empresas preferem esperar para ver o que vai acontecer”, avaliou o professor de economia brasileira da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas) Pedro de Miranda Costa. Na visão dele, o País está enfrentando “a própria crise” e não há uma situação externa que sirva de desculpas. O docente orientou que os jovens impactados pelo momento econômico devem “tirar um pouco o pé” neste momento e pensar em reduzir os gastos e poupar dinheiro. Assim, se vier o desemprego, já haveria um fôlego para se manter sem os rendimentos.

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