REGIÃO DE CAMPINAS

Indústria coloca pé no freio à espera da política econômica

Definição sobre a reforma trabalhista do governo também chama atenção do setor

Edimarcio A. Monteiro/ [email protected]
01/03/2023 às 09:02.
Atualizado em 01/03/2023 às 09:02
Indústria eletromecânica de Itapira, que produz ventiladores e exaustores, teve queda de 12% nas vendas em janeiro e espera desempenho negativo também em fevereiro (Divulgação)

Indústria eletromecânica de Itapira, que produz ventiladores e exaustores, teve queda de 12% nas vendas em janeiro e espera desempenho negativo também em fevereiro (Divulgação)

As indústrias da região de Campinas iniciaram o ano com o pé no freio, em compasso de espera pelas definições da nova política econômica e da reforma trabalhista a serem adotadas pelo governo federal. É o que mostra a Sondagem Industrial do mês de Fevereiro divulgada na terça-feira (28) pelo Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) regional Campinas, indicando que 69% das empresas reduziram a produção em relação a janeiro, 23% mantiveram estável e apenas 8% aumentaram. 

É um quadro diferente do verificado no mesmo período do ano passado, quando 52% das indústrias mantiveram a produção, 40% aumentaram e 7% diminuíram. “Esta redução está diretamente ligada a expectativas das empresas, que aguardam as novas medidas econômicas que impactarão diretamente no dia a dia da economia e delas”, diz o diretor titular do Ciesp-Campinas, José Henrique Toledo Corrêa. A entidade tem 548 associadas em 19 municípios, que somam um faturamento anual de R$ 52 bilhões e empregam em torno de 98 mil funcionários. A área englobada é a terceira maior força industrial do Estado, atrás apenas da cidade de São Paulo e das outras cidades que formam a Região Metropolitana paulistana.

A sondagem mostra outros indicadores que apontam queda na atividade industrial. Entre eles, 70% dos participantes declararam ter sofrido queda no faturamento em fevereiro, enquanto 23% continuaram estáveis e 7% registraram aumento. Além disso, 62% disseram ter queda na lucratividade, 31% mantiveram o nível e outros 7%, aumento. “Fazia tempo que não sentia que o ano começa após o Carnaval. Para nós, a segunda-feira foi o primeiro dia de 2023”, disse Corrêa, em uma referência que agora as empresas devem retomar as atividades este ano.

Reflexo 

Uma indústria eletromecânica de Itapira é um exemplo que o início de 2023 foi ruim. A empresa, que produz ventiladores e exaustores industriais, investiu entre 2021 e 2022 R$ 4 milhões, o equivalente a 11% do faturamento anual, para ampliar a produção e contratou 12 novos funcionários no ano passado, crescimento de 17,65% na mão de obra, chegando a 80 no total. A expectativa era atingir em 2023 um aumento nas vendas em torno de 15%, mas a realidade em janeiro houve queda de 12% nas vendas, número que deve ter se repetido em fevereiro – os números ainda não estão fechados.

“Nós trabalhamos com um produto sazonal e o verão é a nossa melhor época de vendas, o que não ocorreu. Desde dezembro estamos com quedas nas vendas”, explica o sócio e diretor Técnico e Financeiro da indústria, Paulo Stivalli Júnior. Ele classifica o momento econômico atual como de “apreensão” e aguarda as medidas que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) adotará quanto a inflação, controle dos gastos públicos, reforma tributária e outros pontos da política econômica para ver como o mercado reagirá e os reflexos para o setor industrial. 

Porém, “o que temos ouvido até agora é desanimador para quem sofre diariamente para sobreviver”, afirma o empresário. “Vamos aguardar terminar março e o verão para ver como vai ficar, mas provavelmente teremos que reduzir o número de funcionários”, completa. Para tentar reduzir o impacto da sazonalidade e buscar manter a atividade ao longo do ano, a empresa lançou recentemente um aquecedor de ar e desde o ano passado começou a fazer contatos no exterior e a participar de feiras internacionais para iniciar as exportações. 

“Ainda não colhemos os resultados, mas esperamos chegar ao final do ano com uma realidade diferente deste início”, afirma Stivalli Júnior. “O associado do Ciesp-Campinas vê como principal desafio para 2023 a reforma tributária. Ela patina há anos, mas precisa acontecer porque vai ajudar a reduzir o custo que as empresas têm. É uma cadeia muito longa e onerosa, que reforma poderá rever e gerar muitos novos empregos”, diz, por sua vez, o diretor titular da entidade.

Outras medidas 

A Sondagem Industrial Mensal mostra que a redução do número de impostos é defendida por 69% das empresas. Ela aparece disparada na frente até mesmo das medidas para reindustrialização do País, apontada por 8% dos entrevistados, e a reforma administrativa, também 8%. Outros 15% dos entrevistados apontaram não ter uma avaliação do principal desafio para este ano.

A pesquisa mostra ainda que 77% consideram como “fundamental e obrigatório” aumentar o crédito disponível e ter juros mais baixos para a retomada do crescimento industrial e 23% apontam como “importante”. Toledo Corrêa diz ainda que a reforma trabalhista defendida pelo governo pode surtir o efeito negativo de gerar demissões. 

Embora ainda não haja medidas previstas, o diretor titular do Ciesp-Campinas aponta que as mudanças trabalhistas feitas pelo presidente Michel Temer (MDB) em 2017 resultaram em novos empregos, que agora estão em risco. A lei 13.467 estipulou que os acordos coletivos passaram a prevalecer sobre a legislação, a contribuição sindical deixou de ser obrigatória, a jornada de trabalho antes limitada a 8 horas diárias passou a ser 12 horas, respeitadas as 220 horas mensais; as férias de 30 dias passaram a poder ser parceladas em três vezes e foi criado o trabalho intermitente (o funcionário pode ser contratado por um período determinado).

Entre novembro de 2017 e setembro de 2022, foram gerados 5,64 milhões postos de trabalho no País, de acordo com a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Já a taxa de desemprego caiu de 12% para 8,7%, mas o índice é considerado muito alto. Porém, um estudo feito por pesquisadores do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo (Made-USP) aponta que a reforma trabalhista não gerou empregos, conforme prometido. 

Eles compararam a taxa de desemprego no Brasil com a de outros 11 países da América Latina e Caribe e chegaram a conclusão que apresentaram comportamento similar. “Os resultados obtidos não nos permitem afirmar que a reforma trabalhista de 2017 teve impacto significativo para o menor (ou maior) crescimento da taxa de desemprego no Brasil”, afirmam os pesquisadores Gustavo Pereira Serra, Ana Bottega e Marina da Silva Sanches.

Comércio exterior 

Em janeiro passado, as exportações das empresas em cidades que integram o Ciesp-Campinas foram de US$ 317 milhões (R$ 1,65 bilhão), alta de 37,5% em relação aos US$ 230,5 milhões (R$ 1,2 bilhão) do mesmo mês de 2021. Para Toledo Corrêa, o crescimento é em virtude, principalmente, das médias e grandes empresas buscarem aumentar as vendas ao exterior para compensar a queda no mercado interno. “As empresas estão buscando mercados lá fora”, disse o diretor titular do Ciesp-Campinas.

Apesar desse resultado, o diretor do Departamento de Comércio Exterior da entidade, Anselmo Félix Riso, considera que “2023 será um ano de dificuldades” em virtude da alta taxa de juros e volatilidade da taxa cambial. Em janeiro, as importações foram de US$ 976,3 milhões (R$ 5,1 bilhões), crescimento de 3,6% em relação aos US$ 942,5 (R$ 49,9 bilhões) de janeiro de 2021. 

Com isso, o saldo da balança comercial da região no primeiro mês do ano ficou negativo em US$ 659,3 milhões (R$ 3,4 bilhões). O resultado representa uma queda de 7,4% na comparação com os US$ 712 milhões (R$ 3,72 bilhões) de janeiro de 2021. As três cidades que mais exportaram foram Paulínia, Campinas e Sumaré, que juntas representam 71,4% das vendas ao exterior da região. Já os municípios que mais importaram são Paulínia, Campinas e Jaguariúna.

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