JULGAMENTO NO TCU

Impasse sobre Viracopos deve ter solução em agosto

ABV desistiu da devolução do aeroporto e quer continuar na administração

Edimarcio A. Monteiro/ [email protected]
26/07/2023 às 09:03.
Atualizado em 26/07/2023 às 09:03
A Aeroporto Brasil Viracopos recuou porque entende que o cenário hoje é diferente do que viveu até 2020; receita bruta da empresa cresceu bastante em nos últimos dois anos, quando fechou no azul pela primeira vez (Alessandro Torres)

A Aeroporto Brasil Viracopos recuou porque entende que o cenário hoje é diferente do que viveu até 2020; receita bruta da empresa cresceu bastante em nos últimos dois anos, quando fechou no azul pela primeira vez (Alessandro Torres)

O Ministério de Portos e Aeroportos (MPA) aguarda decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o questionamento da legalidade do cancelamento da relicitação para definir o futuro do Aeroporto Internacional de Viracopos. O relator do processo e vice-presidente do Tribunal, o ministro Vital do Rêgo, já deu parecer favorável ao cancelamento, desde que cumpridas 14 condições. No entanto, o julgamento está suspenso até o próximo dia 5, quando vence o prazo de pedido de vista apresentado pelo ministro Walton Alencar Rodrigues. Com o reinício, a expectativa é que os outros oito ministros do TCU votem até o final de agosto. As sessões ocorrem semanalmente, sempre às quartas-feiras.

A principal condição imposta por Vital do Rêgo é a do interesse público, com a manutenção da atual operadora do terminal, a Aeroportos Brasil Viracopos (ABV), ser menos onerosa para o governo federal do que a realização de licitação para a escolha de uma nova empresa.

A administradora, que confirmou interesse em continuar, estima ter direito a um ressarcimento de cerca de R$ 4 bilhões. O valor é para cobrir os investimentos feitos no aeroporto nos últimos 11 anos, desde que assumiu a operação em julho de 2012, como no novo terminal de passageiros, construção de três pistas de taxiamento, novo pátio de aeronaves e outras obras.

“Em breve nós teremos a solução para os dois casos”, declarou o ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França, referindo-se também ao Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro. 

De acordo com ele, os dois terminais estão em estágios diferentes, com o de Viracopos um pouco mais avançado. Porém, há uma divisão interna no governo federal quanto à suspensão do pedido de devolução do empreendimento, o que causaria a relicitação, que foi apresentado pela ABV em outubro de 2020, mas que posteriormente mudou de posição para seguir na administração do maior aeroporto de cargas da América Latina e um dos maiores de passageiros do Brasil.

O MPA e a Advocacia-Geral da União (AGU) entendem que a “desistência da desistência”, como é chamada por França, é possível. No entanto, a Agência Nacional de Viação Civil (Anac) é contra e defende a relicitação. Ela é responsável por regular e fiscalizar as atividades da aviação civil e a infraestrutura aeronáutica e aeroportuária no Brasil.

MUDANÇA DO CENÁRIO

“Se não houver solução, vai para o processo de relicitação”, acrescentou o ministro. A Aeroporto Brasil Viracopos aponta que recuou da devolução porque hoje o cenário é muito diferente do que viveu até 2020. A empresa fechou 2021 com uma receita bruta de R$ 1,1 bilhão, aumento de 29% sobre o faturamento do ano anterior. O lucro líquido no exercício foi de R$ 276 milhões, sendo a primeira vez que fechou no azul desde que assumiu o aeroporto, revertendo o prejuízo de R$ 322 milhões do ano anterior. Em 2022, a receita bruta foi de R$ 1,5 bilhão, aumento em torno de 28% na comparação com 2021.

O lucro líquido foi de R$ 45,1 milhões, sendo o segundo ano seguido de lucro desde o início da concessão. No primeiro semestre deste ano, Viracopos bateu recorde de movimentação de passageiros. Entre janeiro e junho, 6,23 milhões de passageiros embarcaram ou desembarcaram no terminal, 13,06% a mais dos que os 5,51 milhões de igual período em 2022.

Viracopos registrou em 2011, último ano antes da concessão, 7,6 milhões de passageiros ao longo de 12 meses. A ABV argumenta ainda que a excelência operacional do aeroporto não justifica a relicitação. Viracopos foi eleito o 4º Melhor Aeroporto do Mundo em 2022 pela AirHelp, empresa de tecnologia que presta serviços jurídicos para passageiros com problemas em voos para dentro ou foram da União Europeia.

“Temos dezenas, ou até mesmo centenas, de concessões que se sujeitam a crises diversas durante seu longo prazo de duração. Atualmente, há, no TCU, sete contratos em processo de relicitação que se juntam a outros tantos com pedido de resolução consensual. A principal diferença é que a relicitação conduz à extinção prematura do contrato, enquanto a resolução consensual bem-sucedida proporciona a continuidade do contrato de concessão com base nos acordos homologados", diz o ministro Vital do Rêgo em seu voto.

O ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França, argumenta que a ABV já manifestou interesse em se manter na administração de Viracopos, mas não formalizou essa posição. “Para iniciarmos um procedimento, temos que começar com esse documento”, argumenta. A concessionária divulgou que aguarda a posição final do TCU para, em caso de ser favorável ao cancelamento da relicitação, oficializar o pedido de solução amigável.

O PROCESSO

A ABV foi a primeira a pedir a devolução de aeroporto no país, mas depois foi seguida pela Inframerica, responsável pelo Aeroporto Internacional de Natal – Governador Aluízio Alves (Asga), em São Gonçalo do Amarante (RN), e a Rio Galeão, responsável pelo Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão, no Rio de Janeiro. O terminal da capital potiguar foi relicitado, o primeiro processo desse tipo no Brasil, em maio passado por R$ 320 milhões.

A empresa vencedora foi a Zurich Airport International AG, que atua na operação de outros nove aeroportos em todo o mundo. No Brasil, ela á responsável por 100% da operação dos terminais de Florianópolis (SC), Macaé (RJ) e Vitória (ES), além de ser sócia no de Belo Horizonte (MG). A empresa também atua no aeroporto de Zurique (Suíça), Bogotá (Colômbia), Curaçao (Caribe), Iquique e Antofagasta (Chile). Em 2019, também ganhou a concessão para construir e operar o segundo aeroporto de Nova Delhi, na Índia.

A ABV reafirmou que somente deixará a administração de Viracopos após ser “integralmente indenizada” em caso de realização da relicitação. No caso das outorgas não cobrirem os valores de indenização, a diferença teria de ser paga pelo governo federal. Na avaliação do MPA, a relicitação dos terminais tem muitos obstáculos. O principal é que, nos novos estudos de viabilidade financeira, o valor das outorgas dificilmente conseguirá cobrir os valores já investidos pelas concessionárias nos aeroportos.

A ABV argumentou que fez o pedido de devolução porque houve quebra de contrato por parte do governo federal ao não cumprir o que estava previsto no edital de licitação. Entre os descumprimentos apontados pela empresa está a entrega do sítio aeroportuário de 27 quilômetros quadrados, o que inviabilizou o desenvolvimento de projetos que aumentariam a receita.

A Aeroportos Brasil tinha planos de implantar um aerotrópole, aeroporto que serve como centro de um núcleo comercial multimodal. Ele contaria com construções de hotel, centros de convenções, edifícios comerciais e universidade. Porém, Viracopos ocupa hoje em torno de 20% dessa área, e o governo não desapropriou as demais.

A ABV apontou ainda a necessidade de reequilíbrio econômico-financeiro decorrente dos impactos da pandemia de covid-19 sobre todo o contrato, alterações no regime tarifário relativo a cargas em trânsito e a anulação de multa aplicada por descumprimento contratual. Procurada, a Anac não se manifestou até o fechamento dessa reportagem.

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