MEIOS CONTRACEPTIVOS

Hospitais de Campinas se adaptam às novas regras de laqueadura e vasectomia

Alterações na lei de planejamento familiar concedem mais autonomia à mulher

Ronnie Romanini/ [email protected]
14/03/2023 às 08:41.
Atualizado em 14/03/2023 às 08:58
Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism) da Unicamp possui uma Comissão de Laqueaduras, na qual os profissionais de saúde já estão adaptados e integrados às novas regras para os procedimentos (Alessandro Torre)

Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism) da Unicamp possui uma Comissão de Laqueaduras, na qual os profissionais de saúde já estão adaptados e integrados às novas regras para os procedimentos (Alessandro Torre)

Entrou em vigor na semana passada a lei que atualizou as regras para os procedimentos de laqueadura e vasectomia. As alterações na lei de planejamento familiar são consideradas um avanço para as mulheres, uma vez que houve a revogação do artigo que previa a necessidade de consentimento do cônjuge para os procedimentos. Outra novidade é a redução da idade mínima, de 25 anos para 21. Antes, era necessário ter 25 anos ou pelo menos dois filhos vivos. 

As atualizações fizeram com que os hospitais e instituições da cidade se preparassem para a adequação às novas regras, como foi no Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism). Segundo explicou o obstetra Belmiro Gonçalves Pereira, presidente da Comissão de Laqueaduras do Caism, os profissionais estão completamente adaptados. A comissão foi a responsável pela adequação à nova regulação.

"Estamos completamente adaptados. Fizemos várias reuniões com toda a equipe, incluindo médicos residentes e alunos da graduação, que fazem o primeiro atendimento dessas pacientes que solicitam o procedimento. Fizemos esse processo todo nas últimas duas semanas e quando a lei entrou em vigor, no dia 3, já tínhamos todos os procedimentos prontos. No dia 9, fizemos uma reunião final apresentando a maneira que vai funcionar para toda a equipe do Caism." 

A Comissão de Laqueaduras existe há 20 anos, porém, por cerca de dois anos e meio durante a pandemia de covid-19, os trabalhos foram reduzidos pela necessidade de realocar alguns funcionários - como da assistência social e da psicologia. A partir do final do ano passado, mesmo antes da lei entrar em vigor, a Comissão começou a se reorganizar ainda para atender às demandas dentro da legislação anterior e se preparar para as novidades. A Comissão é formada por mais uma obstetra, uma ginecologista, duas assistentes sociais, uma psicóloga e uma equipe de enfermagem. 

Avanço para as mulheres 

A advogada e pesquisadora de direitos sexuais e reprodutivos da Universidade de Brasília (UnB), Ana Carolina Dantas, lembra que as mulheres eram as principais afetadas pela antiga legislação. "A mudança é muito oportuna e fortalece a autonomia feminina e a igualdade de gênero". 

A coordenadora do Departamento Científico de Ginecologia e Obstetrícia da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Campinas (SMCC), Isabella Nelly Machado, também avaliou as mudanças na lei de planejamento familiar como um avanço para a autonomia feminina. "Dá mais poder de decisão às mulheres no caso da redução da idade, de não precisar do consentimento do parceiro. É um grande avanço social em relação aos direitos femininos, ao direito de ter o seu planejamento familiar."

Isabella disse que há uma grande concordância entre as ginecologistas sobre a decisão de desobrigar a comunicação ao parceiro. "Nós convivemos, trabalhamos, atendemos muitas mulheres que não têm parceria fixa, ou uma parceria juridicamente estabelecida, ou até mesmo uma que, afetivamente, poderia ser responsável por uma decisão dessas". 

Por outro lado, ela reconheceu que há um questionamento entre os ginecologistas quanto à redução da idade. "É uma preocupação dos ginecologistas que trabalham no dia a dia com as mulheres - principalmente nos serviços públicos - pelo receio de que a mulher estaria em uma fase da vida ainda muito precoce para tomar uma decisão definitiva." 

Isabelle explicou que na grande maioria dos casos o caminho para uma tentativa de retomar a função reprodutiva passa por processos de reprodução assistida, algo que não é acessível a todos da população. 

"Existe uma discussão sobre se essa redução vai acarretar em um aumento da demanda pelos procedimentos de reprodução assistida. São procedimentos onerosos para a família, tanto emocional como financeiramente, e muito menos acessível para as classes de maior renda econômica."

Isabella lembrou também da importância e da exigência de um termo de consentimento. "Sem ele, a laqueadura não pode ser realizada. Não é apenas porque a paciente expressou um desejo, por estar dentro da lei, que vai ser feito". 

A lei de planejamento familiar também incorporou entre as novas regras a obrigatoriedade do fornecimento de métodos contraceptivos pelo sistema público de saúde em até 30 dias, segundo a opção do paciente. E passou a ser permitida a laqueadura durante o parto, garantida quando o prazo mínimo de 60 dias entre a manifestação da vontade e o parto e as devidas condições médicas são respeitadas. 

No ano passado foram realizadas 104,8 mil laqueaduras e 51,5 mil vasectomias, de acordo com o DataSUS. O número de procedimentos cresceu quando comparado ao ano de 2021, quando foram registradas 71 mil e 25 mil cirurgias, respectivamente. 

Em Campinas, o Caism informou que foram feitas 60 laqueaduras pós-parto em 2022, número bastante inferior ao período pré-pandemia, quando o hospital chegou a ultrapassar 200 procedimentos por ano. O Hospital Maternidade de Campinas divulgou que em 2022 a média mensal de laqueaduras foi de 30. Como comparação, são cerca de 750 partos por mês. 

A laqueadura e a vasectomia são métodos contraceptivos permanentes feitos por meio de cirurgia que impedem o contato do espermatozoide com o óvulo. No primeiro caso, é feito um corte ou amarração nas trompas (tubas), o canal que liga o útero aos ovários. Já na vasectomia, o que se corta são os canais deferentes, que conduzem os espermatozoides. Ambos os métodos possuem alta eficácia e são fornecidos pelo SUS. 

O Ministério da Saúde orienta que aqueles que desejam fazer o procedimento no serviço público devem ir a uma Unidade Básica de Saúde (UBS). Lá, o paciente é encaminhado para um profissional de enfermagem que apresenta as opções de métodos contraceptivos disponíveis e depois para um especialista, como ginecologista ou urologista, para os exames pré-operatórios e orientações da cirurgia. No caso da esterilização, o pacientes do SUS é submetido a espera de 60 dias para decidir definitivamente sobre o procedimento e, após esses passos, a cirurgia é feita. (com Agência Estado)

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