comemoração 110 anos

Externato São João volta ao passado

Antigos alunos e professores do antigo e tradicional Externato São João, abriram na última quinta-feira uma 'cápsula do tempo'

Francisco Lima Neto
francisco.neto@rac.com.br
03/02/2019 às 09:02.
Atualizado em 05/04/2022 às 09:43

Antigos alunos e professores do antigo e tradicional Externato São João, abriram na última quinta-feira – data em que se comemora o aniversário de morte de São João Bosco – uma ‘cápsula do tempo’ enterrada há quase 65 anos pela comunidade escolar.  O artefato era uma lenda entre os alunos. Uma garrafa de vidro que guardava um jornal da época, cartas escritas por estudantes, filme fotográfico, moeda, folheto litúrgico e até uma correntinha com pingente de Nossa Senhora. O antigo externato, hoje Obra Social São João Bosco, era um colégio tradicionalíssimo, que atendia apenas meninos inicialmente. A abertura da cápsula inaugurou o cronograma de eventos em comemoração aos 110 anos do antigo externato, que acontece no dia 24 de junho. As ‘peças sexagenárias’ revelam os valores e a cultura da Campinas da época, que era administrada pelo prefeito Antônio Mendonça de Barros. A manchete do joenal impresso, do dia 17 de março de 1954, já falava das dificuldades de uma Prefeitura que tinha gastos maiores que a arrecadação. A garrafa estava envolta em uma edição de terça-feira do extinto jornal Diário do Povo, do Grupo RAC), que tinha a manchete: ‘A Situação Financeira do Município no exercício de 1953’. A reportagem revelava a situação difícil da cidade, com um deficit orçamentário de Cr$ 3.874.073,80. O impresso adiantava que em dezembro daquele ano seria inaugurado ‘O Novo e Magnífico Edifício do Seminário Diocesano de Campinas’. E edição também trazia a notícia da construção do Cinema Ouro Verde, na Rua Conceição, entre a Rua Luzitana e o Beco do Rodovalho. O local, onde hoje fica o Shopping Jaraguá Conceição, tinha capacidade para 1,8 mil lugares. No impresso há ainda anúncios do consultório de um médico cardiologista, de uma café chamado 100%, do Instituto Penido Burnier e da Casa Ezequiel. Chama atenção os números de telefones, que contavam apenas com quatro dígitos na época. Naqueles dias, após grande polêmica, a Secretaria de Segurança Pública decidiu permitir uma manifestação pró salário mínimo, no Largo do Arouche, em São Paulo. Campinas estava representada no ato público por alguns sindicatos. No entanto, foi alertado que a polícia estaria de prontidão no dia da passeata “a fim de impedir que agitadores comunistas perturbem a ordem pública”. Carta Uma carta, encontrada dentro da garrafa, conta como o evento aconteceu. “Aos 11 de fevereiro de 1954, os clérigos: Moisés Marques, Vitorio Bona e Alvino Bortolini, bancando pedreiros, fizeram o alicerce e a base, de tijolos deste monumento, terminando no dia 12 do mesmo mês. Dia 17 de março vieram os empregados dos srs. papais para erguer o monumento. Para os pósteros ... de 19... Atualmente governa a igreja de Deis S.S. o papa Pio XII, Eugênio Pacelli. Reitor mór da Congregação: o revmo. Sr. p. Renato Ziggiotti. Bispo diocesano: S. Excia sr. d. Paulo de Tarso. Inspetor salesiano do Sul do Brasil: revmo. sr. p. Antonio Barbosa. Diretor do Externato: revmo. sr. p. Rafael Chroboczek. Salesianos: p. Eduardo Nunes Serradel, conselheiro e encarregado do Oratório- p. Ismael Simões: Reorganizador dos Ex-alunos e seu Dirigente. cl. Alvino Bortolini. p. Paulo Slivinski. Professores do Externato: sr. José Bittencourt Cabral, sr. Gilberto Guerra e sr. Valteno Carrijo. Presidente dos ex-alunos: sr. Armando Zanolini. Prefeito de Campinas, sr. Antonio Mendonça de Barros. Empregado do Externato: sr. Lourenço Maracaibe e sr. João. Cozinheira: dna. Brígida Mariano”. Exposição Angélica Barbosa, historiadora e coordenadora da instituição, e Luís Monteiro, restaurador do patrimônio da entidade, foram responsáveis pelas revelações, cuidando para que os documentos e objetos fossem bem cuidados. A ideia é usá-los na exposição sobre a história da instituição ainda neste ano. A existência da cápsula era uma lenda entre alunos e funcionários da instituição, e havia a desconfiança de que ela estaria armazenada abaixo do busto de São João Bosco. Porém, no primeiro semestre do ano passado a existência foi comprovada. O local foi aberto e constatou-se que havia algo guardado sob a imagem, mas nada foi removido até a data especial. Os ex-alunos contam que no ano de 1975, quando começaram as obras de reforma e ampliação da unidade, cujo prédio fica na Rua José Paulino, no Centro, o busto precisou ter a sua base reduzida, pois não encaixava na nova construção, e a cápsula acabou sendo descoberta. No entanto, corriam histórias de que ela só deveria ser aberta depois de cem anos. Por isso, ela foi recolocada no mesmo lugar. Inclusive, no jornal de 1954 que envolvia a garrafa, foi deixado um recado. “No dia de hoje, 26/9/75, foi aberto o monumento de João Bosco”, trazia trecho da escrita. História Fundado em 1909 por padres salesianos, a obra social funcionava em um prédio histórico ainda mais antigo, de 1860, que pertencia a Estanislau de Campos Salles. A escola atraiu diversas pessoas durante seus 85 anos, e no começo atendia somente meninos, gratuitamente. Em 1970, já era uma tradicional escola da cidade, mas começou a cobrar mensalidade. Em 1990 introduziu o ensino misto, atendendo também meninas. Denominada Obra Social São João Bosco desde 1994, hoje atende mais de 2,5 mil crianças e suas famílias no Centro, Vida Nova e Vila Taubaté (antiga Gleba B) com Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos de 06 a 14 anos e Centro Inclusivo e Intergeracional, além de ensino infantil nas três unidades. PROGRAMAÇÃO COMEMORATIVA As comemorações dos 110 anos da Obra Social São João Bosco foram iniciadas com a abertura da cápsula do tempo, mas não para por aí. No dia 29 de março haverá um Seminário de Ação Social. De maio a junho acontecerá uma exposição contando a história da entidade, começando com a construção do Teatro Dom Nery, passando pelo Externato São João até os dias atuais. Um jantar beneficente comemorativo ocorrerá no dia 21 de junho, fechando o ano comemorativo. DEPOIMENTOS PADRES O padre Gilberto Theodoro Cucas, de 81 anos, foi diretor do antigo externato de 1980 a 1987, e estava emocionado por rever os alunos da instituição tantos anos depois. “Uma sensação de que o trabalho que nós realizamos como educadores teve seus efeitos, seus frutos. Era uma época na qual se vivia um espírito de família aqui dentro. O aluno chorava porque tinha que ir embora, queria ficar. O colégio deixou de existir, e agora tem uma obra social, que é querida por Dom Bosco. Se ele estivesse hoje aqui, estaria aprovando. Graças a Deus a obra continua, bela e formosa”, destacou. O padre Orivaldo Voltolini, diretor do local há um ano, disse que “É uma satisfação, porque 20 anos atrás, quando ainda morava no Liceu, quando se encerraram as atividades escolares do externato, a obra passou para o Liceu como responsabilidade e eu era administrador naquela época. Eu vinha aqui duas ou três vezes por semana. Rezava as missas aos domingos. Já existia um vínculo com a obra. É uma satisfação poder dar continuidade como obra social. E são 110 anos”, disse. ALUNO Paulo Hideo, de 50 anos, estudou no externato na década de 70. “Estar aqui hoje é voltar ao passado. A gente ajudou a construir o local. Ajudou a carregar tijolo, fazer a construção do prédio e viveu a localização da cápsula”, disse. PROFESSOR Cláudio Deusdedit Morelli, 71, foi professor na instituição de 1973 a 1980, e estava lá quando acharam a cápsula. “Acompanhei quando acharam a cápsula sem querer em 75. É incrível estar aqui e acompanhar a abertura”, contou. OUTRA CÁPSULA No antigo externato, os alunos alimentam a lenda de que ainda existe outra cápsula do tempo perdida em outro ponto do prédio. De acordo com relatos, quando acharam a primeira cápsula, sem querer, em 1975, os docentes se inspiraram a criar outra cápsula. “A gente fez quando era criança. Tinha várias perguntas e respostas nossas. Eu achava que estava junto com essa, mas não tem nada do pessoal de 74/75. Então, existe mais uma cápsula e acho que está na pedra inaugural do teatro”, aponta Paulo Hideo. A teoria dele é reforçada pelo antigo professor de educação física. “Fiquei um pouco chateado por não ser a que nós colocamos em 75. Na época, tinha o padre Geraldo, e ele pediu para a gente colocar mensagens. Sei que muitos alunos puseram textos e outras coisas dentro. E eu sempre soube que ela não estaria onde acharam essa de hoje. Acredito que esteja em outro local. Pelo que me lembro, colocaram a outra na pedra do lançamento do teatro”, lembrou.

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