INÉDITO

Exército abre inscrições para mulheres combatentes

Sexo feminino está na Força Armada desde 1992, mas para linha bélica é a primeira vez; ingresso é pela Escola Preparatória de Cadetes (EsPCEx), em Campinas

Raquel Valli
05/05/2016 às 15:19.
Atualizado em 23/04/2022 às 00:41
O tenente-coronel de Infantaria, Gustavo Henrique Dutra de Menezes, comandante da EsPCEx, que trabalha como diretor (de ensino), comandante militar e gerenciador de recursos (Leandro Ferreira/ AAN)

O tenente-coronel de Infantaria, Gustavo Henrique Dutra de Menezes, comandante da EsPCEx, que trabalha como diretor (de ensino), comandante militar e gerenciador de recursos (Leandro Ferreira/ AAN)

Pela primeira vez na história do Brasil, as mulheres poderão entrar no Exército na linha bélica. Elas estão nessa Força Armada há 24 anos, mas no segmento de combate só agora. E, para seguir essa carreira é preciso ingressar obrigatoriamente pela Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx), cujas inscrições foram abertas esta semana. O concurso 2016, para ingresso 2017 na instituição de ensino, disponibiliza 440 vagas: 400 para eles, e 40 para elas. O vestibular é mais concorrido do que todos os cursos de engenharia da USP, e, no caso específico das mulheres, mais do que o de medicina. As exigências são as mesmas para ambos os sexos, com ressalva de que os índices de exercícios físicos serão adaptados para o feminino. Dentro da profissão militar há quatro linhas de carreiras: bélica, científico-tecnológica, saúde e administrativa. Nessas três últimas já há mulheres desde 1992, mas na de combate só a partir do vestibular deste ano. A EsPCEx é o primeiro ano da faculdade militar do combatente. Os outros quatro anos são cursados em Resende (RJ) na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). Concorrido “Nós somos extremamente meritórios. Tudo é mensurado”, afirma o coronel de Infantaria, Gustavo Henrique Dutra de Menezes, comandante da escola, que trabalha como diretor (de ensino), comandante militar e gerenciador de recursos. Como a profissão é exigente, “a nossa principal missão, além de preparar, é selecionar”, completa o comandante. Assim, a escola em Campinas funciona como um preparativo para o que o aluno daqui vai encontrar mais acentuadamente na Aman. Para se ter uma ideia, dos que conseguem entrar na EsPCEx, cerca de 15% não conseguem terminá-la. A dificuldade, entretanto, começa bem antes. Para o vestibular 2016 estima-se 23 mil candidatos, sendo 18 mil homens e 5 mil mulheres, o equivalente a 52 candidatos por vaga no geral; 45 para eles; e 125 para elas. A mesma relação para o curso de medicina, o mais concorrido da Universidade de São Paulo (USP) é de 71.93 candidatos por vaga (54 a menos do que as mulheres enfrentarão para entrar na Preparatória). Em relação aos cursos de engenharia, o mais concorrido, o de elétrica, tem 33 por vaga (12 a menos dos que os homens terão que ultrapassar para a EsPCEx). Em três dias de inscrições, 1.600 já se registraram. O prazo para os interessados se encerra em 28 de julho. Foto: Dominique Torquato/ AAN Saída dos alunos pelo Portão das Armas em formatura de EsPCEx em 2014 Os requisitos básicos são ter entre 17 e 22 anos (no ano da matrícula), ensino médio completo, e estar em dia com o Serviço Militar e com a Junta Eleitoral. A primeira fase (prova escrita) será no dias 10 e 11 de setembro. O exame será aplicado em 43 locais, em 39 cidades distribuídos pelo território nacional. Só em Campinas, 1.500 candidatos farão a prova. A taxa de inscrição é R$ 90. Tanto o edital quanto o manual do aluno estão disponíveis no site: www.espcex.ensino.eb.br O curso é em regime de internato, com ajuda de custo mensal de R$ 969,54. Entre os benefícios, alimentação, assistência médica e odontológica gratuitas. Para receber as mulheres, “a escola adaptou um pavilhão para alojamento, com dormitórios, banheiros, vestiários, sala de estudo e grêmio estudantil”, informa o tenente Breno da Silva Néto Almeida Cunha, da Comunicação Social. “O prédio já está pronto, e o mobiliário previsto para chegar até junho deste ano. Até o ano que vem será construída uma seção de saúde (enfermaria), pensando-se nas peculiaridades femininas de atendimento”, completa o assessor de imprensa. Tudo foi pensando nos mínimos detalhes: até uma lavanderia exclusiva foi criada para elas, devido às peças íntimas diferenciadas dos homens. Expectativa Em relação à expectativa ao ingresso de mulheres, o coronel pontua que: “haverá um salto de qualidade na escola em todos os aspectos, porque elas são, nessa faixa etária, mais maduras que os homens”. Dutra destaca sobretudo um impacto ainda maior na organização e disciplina escolares. Ele assumiu a EsPCEx em janeiro deste ano, após comandar o então Batalhão de Infantaria de Força de Paz, no Haiti. “Posso dizer que há uma pessoa antes e outra – melhor e mais humana – depois da vivência no Haiti”, afirmou na cerimônia de posse.  As características adquiridas pelo militar são voz comum na escola, tido como muito humano e cortês, atributos fundamentais no trato com o sexo feminino.    Foto: Leandro Ferreira/ AAN Pavilhão feminino só aguarda mobiliário Destaque Além dos requisitos básicos, para ingressar na carreira bélica, o coronel de Infantaria, Gustavo Henrique Dutra de Menezes, comandante da EsPCEx, pontua que para ser um oficial de destaque é preciso “ser vocacionado”. Isso porque, a profissão é “semelhante a um sacerdócio”, evocando, entre outros aspectos, a rotina rigorosa e a disciplina exigida. “Faço minhas as palavras de Renato Russo: 'disciplina é liberdade', mas sei que as vezes um jovem acaba desistindo de uma carreira brilhante por ter que acordar cedo”, lamenta o coronel. “O impacto inicial é forte, e nem todo mundo aguenta”. Dutra também ressalta que o Exército espera do militar “uma vivência nacional”, o que significa ter que mudar-se de cidade de dois em dois anos, aproximadamente. Por isso, “é necessária disponibilidade para a profissão e amparo familiar”. O coronel evidencia que “além do ensino regular, das matérias universitárias e militares, há o “currículo oculto, em que procuramos focar na manutenção de valores básicos da nossa sociedade. Nosso lema aqui é que ser aluno é cultuar a lealdade, a verdade, a responsabilidade e a probidade. Sempre lembrando nossas tradições e cultura da nossa história. Por isso, inclusive, temos o projeto Valores, Tradições e Raízes”.

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