Essa foi a justificativa para a conversa suspeita com o empresário Celso Palma
O presidente da CPI, Paulo Gaspar (Novo), ao centro, conversa com os seus colegas da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Propina no plenário da Câmara Municipal (Rodrigo Zanotto)
Em depoimento ao Ministério Público no dia 26 de outubro do ano passado, o advogado Rafael Creato, ex-subsecretário de relações institucionais da Câmara de Campinas, lançou sobre os vereadores da Casa suspeitas de cobrança de propina sobre contratos com empresas terceirizadas. Os promotores investigam as denúncias a partir de áudios gravados em que Creato e o ex-presidente da Câmara, Zé Carlos (PSB), aparecem em conversas com o empresário do Grupo Mais - que administra a TV Câmara - Celso Palma. Nos diálogos gravados, eles supostamente estariam negociando a cobrança de propina. Na tentativa de justificar essas conversas sinistras, Creato afirmou que elas teriam sido motivadas por um pedido de seu ex-chefe, Zé Carlos, para que tentasse descobrir com o empresário que vereador estaria recebendo "dinheiro por fora" - o que seria uma suspeita associada aos valores e aditivos do contrato da TV Câmara. Os áudios gravados pelo próprio empresário do Grupo Mais motivaram a instalação da Operação Lambuja, do Grupo de Ação e Combate ao Crime Organizado (GAECO).
Ausente nas duas primeiras convocações da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Propina, que também investiga a mesma denúncia de corrupção, Creato viu o seu depoimento concedido ao MP ser lido na íntegra na reunião de quarta-feira (15). Na visão do presidente da CPI, Paulo Gaspar (Novo), a história contada por Creato ao MP não convence. "Ele inverteu a situação. Jogou toda a culpa em quem gravou os áudios, no Celso, para tentar livrar a barra dele. E também jogou a culpa no Zé Carlos, que foi quem deu a 'missão', entre aspas, para ele. Ele acaba se complicando e contando uma história que, pessoalmente, é difícil de acreditar."
Gaspar não quis explicitar que contradições ficaram claras no depoimento de Creato ao MP. Segundo o vereador do Novo, muitos dos questionamentos que estavam reservados para serem feitos ao ex-subsecretário nos depoimentos à CPI em que ele não compareceu serão utilizados na oitiva agendada para ouvir Zé Carlos. "Se o Creato estivesse na minha frente daria para eu acuá-lo, tranquilamente, com tudo o que ele falou se contradizendo. Daria para colocá-lo na parede muito facilmente diante dos argumentos que ele colocou. O MP apenas o escutou, não fez esse tipo de contra-argumentação, mas na CPI o colocaríamos na parede."
Gaspar admitiu que a CPI não tem mais a intenção de ouvir Rafael Creato, dizendo que ele perdeu a chance de se explicar. "Então, basicamente, cada um vai ter a sua opinião a partir do que ele falou e do que transcrevemos. E a opinião que cada um vai ter não será boa para ele, é lógico. Ele perdeu a chance que tinha para se explicar e, obviamente, as conclusões serão péssimas para o lado dele. Não tem nem como pensar o contrário. Agora nós esperamos que o vereador Zé Carlos compareça e não faça o mesmo papelão, que seria muito pior por ele ser vereador."
A CPI deliberou na semana passada, de maneira unânime, a convocação de Zé Carlos para prestar depoimento no dia 27 de fevereiro, às 14h. A escolha pela data levou em consideração o Carnaval e também a agenda dos vereadores. Logo após a data ser escolhida, a Defesa de Zé Carlos disse que não havia nada definido quanto à presença dele, pois não foram formalmente notificados da convocação. Na quinta-feira (16), o advogado Ralph Tórtima Stettinger Filho, disse que qualquer manifestação sobre o depoimento de Creato aconteceria somente após o depoimento dele. Questionado se isso confirmaria a presença do vereador, o advogado afirmou que a decisão ainda não foi tomada.
Paulo Gaspar considera que uma eventual ausência do ex-presidente do Legislativo no dia 27 seria uma espécie de "atestado de confissão". "A gente não tem como adivinhar a estratégia da Defesa, mas se ele não comparecer será muito ruim para ele. A CPI é política". Gaspar acrescentou que os vereadores não têm compartilhado uns com os outros as conclusões que estão tomando a partir das oitivas, embora na visão dele a conclusão seja óbvia. Ele ressaltou que os membros têm a obrigação de escutar todo mundo e ficarem atentos para novos elementos que possam surgir. O relatório final será redigido pelo vereador Major Jaime (PP).
Depoimento ao MP
Na versão dos fatos narrada por Rafael Creato ao Ministério Público na mesma data em que Celso Palma compareceu à CPI, o ex-presidente Zé Carlos teria pedido a ele, nos primeiros dias do seu trabalho na Câmara, que tentasse descobrir com o empresário se algum vereador recebia dinheiro por fora. A suspeita do ex-presidente seria por conta do valor do contrato original e dos aditivos, o que Zé Carlos chamava de penduricalhos.
Creato confessou que estranhou o pedido, mas não recusou por estar há poucos dias no serviço e precisar do trabalho. Ele afirmou ter avisado Zé Carlos que se o empresário oferecesse dinheiro, ele não aceitaria. O primeiro encontro com Celso Palma teria acontecido durante a reunião do empresário com o então presidente. Creato foi acionado durante essa reunião e informado sobre o assunto que estava sendo tratado, justamente os penduricalhos, que Zé Carlos queria que fossem englobados no atual contrato para que não ficasse pagando outras empresas e reduzindo os gastos. Posteriormente, em conversa com Creato, Palma comentou como foi a licitação que venceu e fez acusações contra a antiga empresa que fazia a gestão da TV Câmara, dizendo que ela repassava dinheiro para os antigos vereadores e antigos presidentes da Câmara.
Segundo Creato, a Procuradoria da Casa teria informado que não seria possível fazer a junção de contrato, que algo semelhante somente poderia acontecer com uma nova licitação. Zé Carlos, então, orientou Creato. "Conversa de novo com ele, fala que não tem como englobar os serviços e o que é que ele pode fazer para ajudar, que daí ele vai falar", foi o que afirmou Creato sobre as palavras do vereador do PSB. Pelo fato de Celso Palma buscar a prorrogação do contrato atual, uma nova licitação não seria interessante para o Grupo Mais e, assim, ele poderia admitir algum pagamento ilícito para vereadores.
Teria sido nesta próxima conversa que Creato falou sobre a "contraprestação", o que Celso poderia fazer para que o contrato fosse mantido. "Nessa conversa (ininteligível) eu disse para ele que não dava para fazer daquela forma, que a procuradoria disse que tinha que fazer uma nova licitação, não dava para a gente fazer um aditivo acrescentando outros serviços e falei lá o que o presidente pediu para falar o que é que daria para fazer para manter atual contrato do jeito que está. O Celso pegou e falou: 'Olha, eu quero ser parceiro nessa'. Ele falou: 'eu quero ser parceiro de vocês, quero parceiro (ininteligível) enfim'".
Creato achou que Celso falaria nesse momento, mas ele pediu para pensar. Depois, veio a negociação. Creato diz que o empresário prometeu repassar ao então presidente tudo o que fosse aditado a mais e chegou a estimar que dentro do contrato vigente conseguiria passar R$ 30 mil. A partir disso, segundo Creato, o empresário pressionou por uma resposta, mas o ex-subsecretário ainda não havia conversado com Zé Carlos, que foi comunicado na segunda-feira seguinte. Zé Carlos, então, teria dito que era exatamente isso que ele queria, como se a oferta fosse a confirmação de que havia corrupção entre a empresa e algum político. Ele queria saber qual era o jogo de planilha do empresário e para quem ele estava pagando.
"Como é que é? Então se você consegue pagar isso, você está pagando para quem? E vamos cortar isso daí, vamos cortar o contrato", teria dito Zé Carlos em alusão ao que falaria para Celso Palma.
No encontro entre Creato e Palma, o empresário teria perguntado ao advogado se conversou com o presidente. Ao afirmar que sim, Celso teria declinado da proposta, dizendo ser cristão e que "entrou certinho", deixando a entender que venceu a licitação anterior de maneira lícita, sem favorecimento ou pagamento de propina. Enquanto relatava esse trecho ao MP, Creato disse que sabia que estava sendo gravado pelo empresário.
"Eu confirmo tudo o que eu falei, mas o intuito nunca foi de obtenção de qualquer vantagem ilícita para mim ou para o Zé Carlos. Eu sei que fui realmente o recado, eu só dei o recado, ponto e falei: 'O meu papel é aqui e acabou'", justificou o advogado ao Ministério Público.
1.TEM PROVAS DA ACUSAÇÃO DE QUE ALGUM VEREADOR FOI BLINDADO E ESTARIA RECEBENDO DINHEIRO DO CELSO PALMA?
"Não, porque ele não me falava sobre isso. (ininteligível), obviamente não tinha a confiança dele, e ele não me falaria… ele não ia falar. Ele só falou: 'Sei que tem alguém recebendo, me falaram'. Foi vereador que falou para ele, mas ele nunca me falou o nome, e ele tinha alguns (ininteligível), nunca me revelou."
2.CREATO SOBRE ZÉ CARLOS
"E aí, nessa reunião, ele falou o seguinte, ele falou: ' olha, eu preciso… eu quero enxugar esse contrato, fica muito caro, a Câmara não pode pagar (R$) 4,5 milhões para um serviço de TV, para uma filmagem e, além disso, eu fiquei sabendo que a empresa repassa valor para vereador', então ele falou: 'eu vou descobrir isso, eu preciso descobrir isso para saber quem está recebendo, o valor que está recebendo e eu vou (ininteligível) tudo isso e aí quando a gente tiver tudo isso aí em mãos eu vou conversar e vamos reduzir esse contrato porque não pode ficar assim'.
3.A "MISSÃO" DE ZÉ CARLOS PARA CREATO
"'Então você conversa com ele, eu vou falar para que ele converse com você e você tenta conversar com ele, tenta insinuar para ele, verificar o que é que… qual é o contrato dele, que ele vai acabar falando, para ver se ele vai falar para você, não é? Falando para quem que ele paga, não é?' (...) Então, foi essa missão que foi dada."
4.SOBRE O PAPEL DE CREATO NA "MISSÃO" - NEGA QUE OBJETIVASSE VANTAGENS INDEVIDAS
"Eu confirmo tudo o que eu falei, mas o intuito nunca foi de obtenção de qualquer vantagem ilícita para mim ou para o Zé Carlos. Eu sei que fui realmente o recado, eu só dei o recado, ponto e falei: 'O meu papel é aqui e acabou'"
5.CREATO SOBRE O FIM DA "MISSÃO" APÓS NEGATIVA DE PALMA
"'Zé, (ininteligível) conversei com ele, ele falou que (ininteligível) permanecer do jeito que estava. Não sei, não falou mais nada, então não sei se ele está pagando ou não está pagando ninguém. Enfim, não sei'. O Zé Carlos falou o seguinte: 'Então, não fala mais com ele. Acabou, (ininteligível), vou ver o que eu faço'. Não falou mais nada comigo, nunca mais falou mais nada. Não me participou de reunião, essas outras reuniões aí que ele gravou com o Zé eu não participei, nunca mais tive conhecimento."
6.CREATO SOBRE A PRORROGAÇÃO DO CONTRATO COM O GRUPO MAIS
"E outra coisa, para provar que, realmente, nunca teve essa intenção de qualquer vantagem ilícita que o Celso fala que foi comissionada para renovação do contrato. Nunca foi pedido, tanto é que o contrato foi renovado. (ininteligível) nunca teve essa intenção mesmo, porque se ele tinha negado, não era para ter renovado, né?"