PANDEMIA

'Estamos aprendendo como conter'

Infectologista de Campinas analisa coronavírus e esclarece as principais dúvidas da população

Da Agência Anhanguera de Notícias
22/03/2020 às 13:19.
Atualizado em 29/03/2022 às 20:08

Infectologista com mais de 40 anos de trabalho, o médico Rogério de Jesus Pedro já enfrentou epidemia severa de meningite em Sâo Paulo, na década de 60 do século passado. Fez o dignóstico do primeiro caso de HIV em Campinas nos anos 80 e mais recentemente, enfrentou o Influenza H1N1. Mas nada, diz ele, se compara ao que o mundo assiste agora com o novo coronavírus Covid-19. “Naqueles outros casos, nós tinhamos o caminho. Agora, estamos aprendendo. Me parece muito mais difícil de conter”, admite ele. Pedro lembra que a experiência da China já mostrou que o isolamento é uma arma poderosa e lembra que o governo brasileiro precisa estimular esse tipo de atitude das pessoas, até porque, lembra, o sistema de saúde não suportaria. Veja os principais pontos da entrevista com o especialista. Correio Popular - O Sr. acha que a epidemia pode ter efeitos mais amenos no Brasil pelo fato do país já ter informações sobre como foi feito o enfrentamento na China ou na Itália, por exemplo. Ou por causa do clima? Rogério de Jesus Pedro - Claro que a experiência dos países que nos precederam na pandemia são relevantes para as ações de controle no Brasil, porém nem sempre aplicáveis na nossa realidade. Muitas medidas utilizadas na China, por exemplo, não se aplicam no Brasil pelas condições culturais e políticas diversas entre os povos, mas são orientadoras, principalmente por demonstrar que o rigor do isolamento social e os métodos de barreira são muito importantes para impedir ou retardar a disseminação do vírus. Já na Itália ficou evidente que o retardo destas ações, aliadas às diferencas demográficas das populações, levou a sobrecarga rápida dos serviços de saúde e exauriram os serviços assistenciais, sendo responsáveis pela grande mortalidade lá observada. O Programa de Ações do Ministério da Saúde tem clareza disso e implementa ações via Sistema Único de Saúde e Vigilância Epidemiológica que visam controlar a evolução da pandemia e mitigar suas consequências. A questão do clima é uma incógnita; teoricamente, as doenças respiratórias e esse vírus preferem o frio. Estou com suspeita de contaminação. Como devo proceder? Seguir os protocolos fartamente divulgados pelos serviços de saúde. Basicamente, casos leves sintomáticos, procurar as UBS. Só os casos mais graves devem procurar o PS ou as Unidades de Referência do sistema público ou privado. O sistema está organizado para o diagnóstico e tratamento dos casos mais graves nos centros de referência. Como deve ser feito o isolamento domiciliar? Como deve ser o contato com os outros membros da família? O isolamento domiciliar de pacientes infectados deve ser o mais rigoroso possível. Uso de máscaras para conter a dispersão de gotículas, normas de etiqueta respiratória, lavar as mãos várias vezes ao dia, objetos de uso pessoal, pratos e talheres exclusivos, limpeza de superfícies com os produtos recomendados. Os pacientes devem ficar a distância segura dos acompanhantes, pelo menos 2 metros. Usar o bom senso, sabendo que as doencas de transmissão respiratória e de contato são muito difíceis de conter. Além de tudo, o tempo de isolamento é longo, pelo menos duas semanas. Os familiares devem evitar o contato e lavar as mãos com água e sabão ou álcool gel conforme é recomendado. Que produtos de limpeza matam o coronavírus? O coronavirus é muito sensível aos produtos de limpeza simples como álcool e água sanitária, só para lembrar os mais comuns, devendo atentar para as concentrações recomendadas destes produtos. Portanto os produtos de limpeza matam os vírus. Como é feito o tratamento? O tratamento específico ainda não se conhece. Existem vários ensaios com medicamentos já utilizados em outras viroses com resultados promissores, porém ainda experimentais. Poderia citar alguns. O que é preciso saber é que a grande maioria dos casos, 80%, é de pacientes com sintomas gripais que são autolimitados e o tratamento é sintomático. Os casos graves, 20%, passam por manifestações pulmonares que podem chegar a insuficiência respiratória que necessitam de próteses respiratórias; e cuidados intensivos, 5%. É nestes casos que ocorrem os óbitos. Já se sabe que idade mais avançada e comorbidades agravam o prognóstico. É possível ser infectado mais de uma vez? Sim, é possivel ser infectado mais que uma vez. Estes coronavirus são RNA, que caracteristicamente, sofrem muitas mutações, de modo que eles se tornam quando mudam quase espécies diferentes e podem enganar o sistema imune que não os reconhece, dai haver reinfecções. Vitamina D protege contra coronavírus? Vitamina D não tem acão contra coronavírus. Crianças ou adultos: quem corre mais risco ao ser infectado por coronavírus? Estes vírus infectam igualmente crianças , adultos, homens e mulheres. As crianças e adultos jovens são menos sintomáticos e certamente têm infecções menos graves. Mulheres e homens são igualmente acometidos, sendo que homens mais velhos e com comorbidades têm maior mortalidade. Animais de estimação podem transmitir o novo coronavírus? Animais de estimação não transmitem este coronavírus. Eles são adaptados às espécies. Existem outros coronavirus que acometem animais domésticos. Como surgiu o coronavírus? Estudos filogenéticos mostram que o SARS-CoV-2, que causa a Covid-19, surgiu na China, na província de Wuham, provavelmente tem origem de morcegos. Sofreu a primeira adaptacão a uma outra espécie animal de onde fez o salto definitivo para os humanos por mutações adaptativas. Os estudos feitos na China descrevem muito bem estas passagens. Hábitos culturais, alimentícios e ambientais possibilitaram esta adaptacao. Grávidas correm mais riscos? Até o momento, isto não é destacado na epidemiologia do Coronavírus. Sabemos que a gravidez traz mudancas na resposta imune além de modificações na fisiologia respiratória que justificou a maior gravidade da infecção causada pelo vírus da Influenza H1N1 na gravidez, mas não nesta virose causada pelo coronavírus. Mulheres com suspeita de coronavírus podem amamentar? Amamentação é contraindicada. Não é para fazer. Que cuidados se deve tomar no transporte público - trens, ônibus, metrô? Transporte público é um grande fator de risco de transmissão pelo contato, proximidade entre pessoas, confinamento, muitas pessoas. É um gargalo importante na contenção da transmissão. As medidas como espaço maior entre os usuários, limpeza de superfícies de contato, álcool gel, procuram minimizar riscos. Que tipo de exame eu poderia fazer para saber se tenho o novo coronavírus? Os exames para diagnóstico foram rapidamente padronizados e disponibilizados. Os métodos mais utilizados são a pesquisa do coronavírus nas secreções da faringe e do nariz por métodos diretos de biologia molecular RT PCR. Existem outros como pesquisa de anticorpos contra o coronavírus.

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