FUTURO AMEAÇADO

Entidades de Campinas criticam mudanças no programa Jovem Aprendiz

14 instituições, entre elas Patrulheiro e Guardinha, farão ato nesta segunda-feira, no Centro da cidade

Rodrigo Piomonte
14/05/2022 às 20:34.
Atualizado em 15/05/2022 às 10:14
A aprendiz, Layarah, de 16 anos, torce para que o programa federal de inserção de jovens no mercado de trabalho continue dando oportunidades para adolescentes como ela (Gustavo Tilio)

A aprendiz, Layarah, de 16 anos, torce para que o programa federal de inserção de jovens no mercado de trabalho continue dando oportunidades para adolescentes como ela (Gustavo Tilio)

As mudanças impostas pelo governo federal ao programa Jovem Aprendiz, por meio de uma Medida Provisória publicada no início desse mês, estão preocupando as entidades que atuam como formadoras de aprendizes em Campinas. Elas temem uma redução de 50% na inserção desse público no mercado de trabalho da cidade. Pela Lei do Aprendiz, empresas consideradas de médio e grande porte devem reservar de 5% a 15% das vagas para jovens de 14 a 24 anos. Agora, com as mais recentes mudanças, ex-aprendizes efetivados pelas empresas poderão continuar entrando artificialmente no cálculo das cotas por 12 meses. 

A MP determina que os jovens identificados como vulneráveis passem a contar em dobro no cumprimento das cotas dentro das empresas e os contratos tenham prazo de até quatro anos, duas vezes mais do que o estabelecido anteriormente. A idade máxima para participar do programa sobe de 24 para 29 anos, segundo a MP. Para as entidades que atuam nesse segmento, todas essas mudanças trarão um enorme impacto sobre o programa, fechando as portas das empresas para a entrada de novos aprendizes, principalmente aos mais pobres. Elas alertam ainda que a medida vai precarizar os empregos, permitir a redução de salários e esvaziar a fiscalização do cumprimento de cotas pelas empresas. A justificativa do governo para as mudanças foi o suposto aumento na oferta de vagas.

Para chamar a atenção da sociedade e do poder público sobre os riscos das alterações propostas pela MP, um ato está sendo organizado para amanhã no Centro, com a presença das 14 entidades que atuam na formação de jovens aprendizes de Campinas. A cidade tem atualmente cerca de três mil jovens aprendizes que atuam em empresas dos setores de comércio, serviços e indústria.

A coordenadora da Comissão do Jovem Aprendiz do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescentes (CMDCA) em Campinas, Adriana Arten, diz que as 14 entidades que atuam na cidade estão mobilizadas contra a medida do governo. "Nós precisamos dizer não à MP 1.116, principalmente aos prejuízos dessa medida provisória para os adolescentes e jovens. Nenhum aprendiz a menos", disse.

Adriana trabalha no Patrulheiros Campinas, entidade com 56 anos de tradição na cidade e que, atualmente, atende na formação de 850 jovens, sendo a maioria em situação de vulnerabilidade social. Segundo ela, a cidade teria um grande potencial de absorver jovens aprendizes se todas as empresas cumprissem as cotas estipuladas por Lei Federal. Agora, com a MP, essa capacidade de contratação tende a se reduzir. "O potencial de vagas para o município é de 9.122. Atualmente são atendidos cerca de 30% desse potencial, pois falta fiscalização para que as empresas contratem aprendizes. E com a medida provisória a situação vai ficar ainda pior", disse.

A coordenadora, Amanda Cristina Fabri Donadon Pedrini, da Associação de Educação do Homem de Amanhã, a Guardinha, também enfatiza os aspectos negativos que a proposta do governo traz na lei da aprendizagem. "A MP vai trazer bastante impacto negativo na colocação dos atendidos em situação de vulnerabilidade social, que são os atendidos pelas entidades formadoras. A partir do momento que a MP coloca que um aprendiz com vulnerabilidade ou com deficiência contará para duas cotas, nós já temos uma redução de 50% nas cotas das empresas", disse.

De acordo com a coordenadora, que trabalha com a formação de 350 jovens, em Campinas, já tem empresas na cidade solicitando a redução das cotas e a não colocação de aprendizes. "Algumas empresas que estavam em um momento de inserção de jovens já pediram para reduzir a quantidade, considerando os jovens em vulnerabilidade, ou seja, já dando destaque para que esses fossem contratados. Então isso já está mostrando o impacto negativo de redução na inserção", disse.

Na avaliação da coordenadora, a MP foi editada para trazer benefícios para as empresas, ao estimular a não contratação, a isenção no cumprimento da cota e a não fiscalização de forma efetiva. "Então a consequência é direta nas entidades por conta do público atendido. Queremos colocar os jovens em vulnerabilidade no mercado de trabalho e não diminuir a quantidade inserida", diz.

Professor da rede estadual de ensino e coordenador da Escola de Educação Corporativa da Unicamp (Educorp), Edison Cardoso Lins, iniciou a sua vida profissional como patrulheiro. Ele lamenta que programas de apoio à juventude, como o Jovem Aprendiz, sofram "revisões aligeiradas", que podem comprometer a importância e a abrangência das suas atividades, justamente em um país que apresenta tanta carência nesse sentido.

No entender de Lins, as mudanças promovidas pela MP do governo federal afetam tanto a formação profissional do jovem, quanto a sua trajetória educacional, visto que uma das condições para ingressar em programas do gênero é estar matriculado na escola formal. "Espero que haja uma movimentação para impedir a desconstrução dessa política social. Esses programas são muito importantes. Assim como eu, muitos profissionais que estão no mercado de trabalho passaram por esse tipo de apoio no início da carreira profissional".

Jéssica Massaranduba, 17 anos, trabalha como jovem aprendiz no Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPQD) e diz ter sido muito importante a passagem pelo Patrulheiros Campinas. "Tive uma grande oportunidade através do Patrulheiros Campinas, e essa oportunidade desejo a todos os jovens, porque como aprendiz acabei crescendo muito como pessoa e tive grandes ensinamentos que quero levar para a vida", disse. Para ela, ser uma jovem aprendiz é muito gratificante. "Através dos patrulheiros aprendi coisas que muita das vezes nas escolas não nos ensinam, eles nos oferecem uma oportunidade de entrar no mercado de trabalho e crescer dentro dele, saímos de lá com outros olhos e outros pensamentos, e com isso crescemos como profissionais", complementa. 

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