AGRICULTURA

Engenheiro Coelho se destaca por produção de mandioca

Cenário da produção hoje concentra-se em pouco mais de 110 produtores do tubérculo, que totalizam 500 hectares de terra dedicados à cultura da família das euphorbiaceas

Gustavo Abdel
05/04/2015 às 05:00.
Atualizado em 23/04/2022 às 17:23
Ônibus que transporta as mercadorias também serve como dormitório (Janaína Ribeiro/Especial para a AAN)

Ônibus que transporta as mercadorias também serve como dormitório (Janaína Ribeiro/Especial para a AAN)

Dezenas de sacas de mandiocas enfileiradas no piso do ônibus servem como cama. Colchões e lençóis cobrem o produto que horas mais tarde estará em carriolas de vendedores espalhados por todo o Litoral de São Paulo e Interior do Rio de Janeiro.   O produto é levado duas vezes por semana por “mandioqueiros” profissionais de Engenheiro Coelho, que há mais de 20 anos embarcam em longas viagens, montados em ônibus rurais, ao encontro dos consumidores fiéis dessa raiz que, diferentemente do chuchu e da banana, não dá na serra. O terceiro menor município em população da Região Metropolitana de Campinas (RMC), Engenheiro Coelho é a principal fornecedora de mandioca de ponta a ponta do Litoral paulista.   O comércio movimenta, em média, mais de R$ 250 mil entre faturamento dos vendedores, fornecedores de mandioca e aos donos de ônibus que transportam o pessoal.   Um negócio que se solidificou como certeza de vendas a partir de um momento de incertezas vividas na época em que a plantação de citrus foi abatida pelo greening — doença que faz com que os frutos fiquem permanentemente verdes, com gosto amargo. “As coisas ficaram ruins em Engenheiro. Muita gente foi despedida da lavoura de laranja e precisava ganhar dinheiro. Passamos a vender mandioca nas ruas. De repente, surge a ideia de viajar para o Litoral e tentar as vendas por lá”, recorda-se Joaquim José, de 37 anos, proprietário de um ônibus que percorre o trecho do Litoral Norte de São Paulo.   “Comecei vendendo nas ruas de Engenheiro, depois durante uns três anos descia para o Litoral e hoje tenho esse ônibus. Faz 19 anos que estou nessa luta. Vale a pena, apesar de ser muito cansativo”, disse. O cenário da produção de mandioca em Engenheiro Coelho, hoje, concentra-se em pouco mais de 110 produtores do tubérculo, que totalizam 500 hectares de terra dedicados à cultura da família das euphorbiaceas.   A média de produção de mandioca em 2014 foi de 20 toneladas por hectare.   Além de serem fornecedores regulares de mandioca para supermercados e varejões em grandes centros, como Campinas e São Paulo, os produtores têm garantido há anos, duas vezes por semana, vendas certas aos chamados “turmeiros” do município.Divisão O esquema desses viajantes é dividido entre três proprietários de ônibus, os tais turmeiros, e os pontos de partidas são todos no bairro Jardim Brasil.   Na Rua Antonio Batistela se concentra a turma do Adilson Augusto de Souza (Tino Pepe), dono de um ônibus que transporta às terças e sextas-feiras cerca de 15 mandioqueiros para Litoral Sul (Santos, São Vicente, Cubatão e Mongaguá).   Três ruas para baixo, na Catarina Caetano, o turmeiro Joaquim José comanda o grupo que passa dois dias no Litoral Norte (Caraguatatuba, Bertioga e Ubatuba).   E nas proximidades está a turma do “Ninha”, rapaz que se identifica somente por apelido, e que leva também às terças-feiras um grupo de vendedores para as cidades cariocas de Itatiaia, Barra Mansa e Volta Redonda. Tino Pepe e Joaquim passam de propriedade em propriedade encomendando uma quantidade de mandioca estipulada pelos vendedores.   Horas antes das viagens as encomendas vão chegando e sendo depositadas na calçada em frente à casa dos líderes das turmas. Os ônibus são carregados e as viagens são iniciadas sempre às 19h. Para embarcar cada mandioqueiro desembolsa R$ 140 por viagem. Além de mandioca, o esquema de vendas no Litoral agregou outras culturas que saem de Engenheiro Coelho. Ao longo dos anos, milho, quiabo, batata-doce e um pouco de laranja seguem para a baixada.   “Há 10 anos trazemos encomenda de milho para o Tino e ao Joaquim. Hoje trazemos menos, em média 40 sacos, mas já trouxemos 150. Mas nunca deixamos de ter encomenda. É sinal que cada ‘descida’ vende bem”, dizia Rafael Santana de Araújo, de 22 anos, enquanto descarregava a encomenda colhida na região de Santa Bárbara d’Oeste em frente à casa de Tino Pepe.   O próprio Tino, que já foi vereador em Engenheiro na legislatura passada, não é chegado à conversa e preferiu não dar detalhes sobre o trabalho que desenvolve junto às lavouras. Mas José Carlos da Silva, de 40 anos, que trabalhou como vendedor e motorista para Tino e mora em frente à sua casa, lembra bem da época em que vender mandioca no Litoral era mais negócio do que hoje, apesar da maioria dos mandioqueiros acharem que o esquema ainda rende bons trocados — em média R$ 2,8 mil por mês. “O Litoral não produz essa raiz porque requer um solo plano. Então, a mandioca que a gente levava vendia praticamente toda.   Com isso muita gente começou a ficar freguês do produto e hoje em dia descem encomendas”, explicou Silva. Seu pai, José Soares, foi um dos primeiros vendedores no Litoral.Luta semanal João Batista Ruas da Silva, de 56 anos, mostrou as instalações do ônibus comandado pelo cunhado Joaquim, que segue destino a Ubatuba. Os sacos de mandiocas, lacrados, servem de banco, cama e às vezes mesa. Não há bagageiro e dois varais servem para levar as poucas roupas dos vendedores. Na terça-feira, 11 deles viajariam para o Litoral Norte.   “Vamos chegar por lá umas 2h da madrugada. É cansativo, por que daí andamos desde manhã até a quarta-feira à tarde, quando então a gente retorna”, explicou Ruas da Silva, que está há 17 anos na labuta de vendas. Alguns deles dormem no próprio ônibus e outros em postos de gasolina. As carriolas dos mandioqueiros ficam no Litoral, em postos, botecos e moradias.   O quilo do produto está sendo vendido a R$ 2,50. “Um vendedor que desce em média de sete a oito vezes por mês consegue faturar R$ 2,8 mil. Para uma cidade que não tem serviço, a alternativa é partir para a estrada”, disse o turmeiro Joaquim, que consegue tirar livre R$ 7 mil fazendo o transporte dos vendedores.   “Tenho por mês um gasto de R$ 3 mil de manutenção do ônibus”, disse. Há uns 10 anos, recordou o turmeiro, sete ônibus faziam o trajeto até o Litoral.

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