Com a Selic elevada, as taxas aplicadas nas operações na ponta assustam qualquer um: a taxa média no cartão de crédito, por exemplo, está em quase 300% ao ano
Entre todas as modalidades, a pior é o cartão de crédito, com juros de quase 300% ao ano - mas as outras alternativas também são perigosas (Cedoc)
O consumidor está sem dinheiro no bolso para comprar à vista - e optar pelo crediário também não é mais uma boa ideia. Com a Selic elevada, as taxas aplicadas nas operações na ponta assustam qualquer um: a taxa média no cartão de crédito, por exemplo, está em quase 300% ao ano. O Crédito Direto ao Consumidor (CDC), utilizado nos financiamentos para as compras no varejo, também não está nada razoável - atingiu 127,76% ao ano em média no mês passado em Campinas e região. São as maiores taxas dos últimos cinco anos. Uma boa ideia do tamanho do impacto das atuais taxas no bolso é dada avaliando a compra de uma geladeira hoje e há um ano: o valor de R$ 1.350,00, parcelado em 12 vezes geraria um gasto total de R$ 1.944,00 em 2015, com prestações de R$ 594,00. Hoje, o mesmo produto com o mesmo valor teria um custo total de R$ 2.052,00, com parcelas de R$ 702,00 - uma diferença de R$ 108,00, suficiente para 28 passagens no transporte coletivo de Campinas. O coordenador do Departamento de Economia da Acic, Laerte Martins, salientou que o custo do dinheiro está caro demais tanto para os consumidores quanto para as empresas. “As linhas utilizadas pelas pessoas jurídicas, como o desconto de duplicata, por exemplo, estão com juros de 50,76% ao ano. Por mês, a taxa é de 3,48%. Em março do ano passado, eram 45,09% ao ano e 3,15% ao mês”, afirmou. Em um ano, a taxa subiu mais de cinco pontos percentuais - e a crise econômica complica ainda mais, já que as vendas diminuem. “As empresas estão sofrendo em dobro, com a queda das receitas de um lado e o crédito proibitivo do outro”, analisou. Martins disse que, para o consumidor, o custo do dinheiro é ainda maior, com o CDC passando de 103,51% para 127,76% ao ano em março. “As taxas mensais subiram de 6,10% para 7,10%", apontou. O economista alertou especialmente para o caso do cartão de crédito, com taxa de quase 300% ao ano. “Os juros estão em 291,69% ao ano. No ano passado, eram de 179,72% ao ano. A taxa mensal saltou de 8,95% para 12,05%. E como muitos consumidores usam o cartão de crédito de forma descontrolada, acabam completamente endividados”. Entrar no cheque especial também é um problema sério. Aqui, os juros são de 247,96% ao ano em média. “Em março de 2015, o patamar era de 174,83% ao ano. Por mês, os juros passaram de 8,79% para 10,95%. Aqui também há um sério perigo para o consumidor. Muitos acabam usano o cheque especial para cobrir buracos nas contas, especialmente pela facilidade do uso, e se afundam ainda mais nas dívidas”, alertou o economista da Acic. “É verdade que a alta da taxa básica, a Selic, empurra para cima todos os juros aplicados nas operações de crédito no País. Mas as taxas cobradas na ponta são desproporcionais, astronômicas e exorbitantes. Mesmo operações subsidiadas pelo governo como a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), utilizada pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) estão mais caras. A TJLP passou de 5,50% para 7,50% ao ano”, salientou. Cuidados Depois de perder muito dinheiro pagando juros no cartão de crédito, a vendedora Joana Lima, de 25 anos, aprendeu. “O problema é que a gente acha que o cartão de crédito é um dinheiro extra que se tem para gastar. Na verdade, ele não faz parte do orçamento. E quando chega a hora de pagar a fatura, cadê o dinheiro? Me enrolei muitas vezes pagando o valor mínimo. Quando eu via, a dívida estava enorme. Tive que contar com a ajuda de parentes para me livrar do cartão. Agora não quero mais saber dele”, contou. Já o desemprego José Maria Silva, de 40 anos, teve problemas com o cheque especial. “Estou procurando emprego há seis meses. Fiquei sem dinheiro no final do ano e acabei entrando no especial, e me assustei com os juros cobrados pelo banco. Minha conta ficou no vermelho por apenas dez dias, mas o valor cobrado foi exorbitante. Pensei até em encerrar a conta”, disse. Dívidas Um estudo divulgado no final da semana passada pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) mostrou que, em 2015, os consumidores brasileiros pagaram mais de R$ 320 bilhões em juros. Os dados foram obtidos a partir de informações do Banco Central e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e significam que as famílias brasileiras jogaram na fogueira do sjuros o equivalente a 5,2% do Produto Interno Bruto (PIB). A dívida total somava R$ 803 bilhões.