LEGISLAÇÃO

Emissão de certidões em braille por cartórios começa em abril

Secretário estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Marcos da Costa, disse que a lei vai beneficiar 1,3 milhão de pessoas com dificuldades visuais

Edimarcio A. Monteiro/ [email protected]
15/03/2023 às 08:21.
Atualizado em 15/03/2023 às 08:21
Diretor técnico do Centro Cultural Louis Braille, de Campinas, Benedito João Bertola apontou algumas dificuldades para colocar a lei em vigor, como o alto custo das impressoras em braille que são importadas (Rodrigo Zanotto)

Diretor técnico do Centro Cultural Louis Braille, de Campinas, Benedito João Bertola apontou algumas dificuldades para colocar a lei em vigor, como o alto custo das impressoras em braille que são importadas (Rodrigo Zanotto)

Os cartórios de registro civil do Estado de São Paulo terão, quando solicitados, que emitir certidões de nascimento, casamento e óbito em braille. A obrigação, que passará a valer a partir do próximo dia 8 de abril, está prevista na lei nº 17.649 sancionada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), já publicada no Diário Oficial do Estado. Os 816 cartórios paulistas, dos quais 23 na Região Metropolitana de Campinas, terão ainda de fixar em local visível placa ou cartaz, também com escrita em braille, informando a disponibilização do novo serviço.

“No Estado todo, são mais de 1,3 milhão de pessoas com deficiência visual que terão seu direito assegurado por meio dessa lei, que garante o amplo acesso às certidões”, disse o secretário estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Marcos da Costa, A novidade pegou de surpresa o setor, que ainda busca informações sobre como disponibilizar as certidões em sistema de escrita com pontos em relevo que as pessoas cegas ou com deficiência visual podem ler um texto através do tato. 

“A intenção da lei é boa, permite maior integração das pessoas com deficiência visual, mas ainda temos que ver como essa lei vai funcionar e quem irá arcar com os custos que vai gerar”, disse na terça-feira (15) a oficial substituta do Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais do 2º Subdistrito de Campinas, Nilza Robaina. O Cartório Santa Cruz, como é conhecido, emite, em média, 900 certidões de nascimento, casamento e óbito por semana.

Ela lembra que as pessoas já têm direito, desde 1994, a certidão de nascimento ou óbito gratuita, com o custo sendo absorvido pelo órgãos de registro civil. Nilza Robaina disse que está em contato com a Associação dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen), que representa os cartórios, em busca de mais informações e esclarecimentos de como será aplicada a nova lei. Em nota, a entidade divulgou que enviou contribuições para a aplicação da norma, mas que acabam consideradas na redação final da lei. 

“Desta forma, o novo texto ainda carece de informações sobre sua aplicação prática, como a ausência de fonte de custeio, de maquinário especializado e de capacidade técnica, uma vez que os profissionais que emitirão os documentos não dominam a linguagem em braile e não podem certificar certidões em idiomas que não compreendem”, destaca a Arpen. A associação acrescentou que aguarda que a lei “seja melhor regulamentada para que tenha aplicação prática.” 

A lei 17.649 não é clara quanto a sua aplicação, tendo apenas dois artigos, um que trata da disponibilização das certidões em braille e o outro que fala do cartaz ou placa informando o usuário sobre esse serviço. O governador vetou dois artigos da nova legislação, criada a partir do projeto de lei n 52, de 2022. Um estabelecia a imposição de multa em casos de descumprimento da obrigação e o outro impunha a regulamentação da lei ao Poder Executivo.

Repercussão 

Em seu parecer, o governador argumentou que a gradação da sanção pode ser “excessiva ou insuficiente” e que proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência é de competência da União, de acordo com a Constituição. O diretor técnico do Centro Cultural Louis Braille, de Campinas, Benedito João Bertola, considerou a emissão de certidões em braille importante do ponto de vista dos direitos do cidadão, mas com dificuldades técnicas para sua implementação. 

“Eu acho benéfico tudo o que agrega e garante o acesso a documentos para pessoas com deficiência, em especial as com deficiência visual, mas é um contrassenso a obrigatoriedade”, disse. Para ele, o ideal é que a novidade fosse colocada como opcional. 

Benedito Bertola apontou algumas dificuldades para colocar a lei em vigor. Para começar, o alto custo de impressoras em braille, que são importadas e custam entre R$ 40 mil e R$ 90 mil. Atualmente, explicou ele, ao apresentar um documento a uma pessoa com deficiência visual, o cartório deve fazer a leitura duas vezes e diante de duas testemunhas, que também devem assiná-lo. 

Para o diretor do Centro Cultural Louis Braille, isso é suficiente para garantir a idoneidade da documentação. Ele citou ainda que uma certidão de papel em folha padrão (tipo A4) se transforma em três a quatro folhas do mesmo tamanho quando convertida em escrita braille. Além disso, a certidão emitida seria usada apenas pelo portador de deficiência visual, que precisaria do documento impresso tradicional para apresentar quando fosse requisitado. 

Benedito Bertola lembrou que o centro cultural presta o serviço de impressão em braille para estabelecimentos comerciais, como cardápios para restaurantes, mas esse é um serviço que não é fácil de ser encontrado e tem um custo alto. De acordo com uma empresa especializada em impressões em braille, um livro de literatura de 300 páginas pode chegar a custar R$ 500 nessa escrita especial. O convencional sai entre R$ 40 de R$ 60, dependendo do título e do autor. “O alto valor se deve ao volume de papel utilizado e ao processo de impressão e acabamento do material em braille”, explicou a empresa.

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