ESTUDO

Em 10 anos, frota da RMC cresceu 34,24% e ampliou repasse do IPVA

Em igual período, repasse do imposto para as prefeituras da região aumentou 89,25%

Edimarcio A. Monteiro/ [email protected]
21/05/2023 às 11:28.
Atualizado em 21/05/2023 às 11:29
IPVA é calculado sobre o valor de mercado do veículo, o que leva em conta o ano de fabricação, potência, nível de equipamentos e acabamento; com aumento da frota, cidades tiveram repasse maior (Alessandro Torres)

IPVA é calculado sobre o valor de mercado do veículo, o que leva em conta o ano de fabricação, potência, nível de equipamentos e acabamento; com aumento da frota, cidades tiveram repasse maior (Alessandro Torres)

O número de veículos das 20 cidades da Região Metropolitana de Campinas (RMC) cresceu 34,24% na última década, o que resultou em um aumento de 89,25% no repasse do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) para as prefeituras. A frota passou de 1,88 milhão de automóveis, motocicletas, ônibus, caminhões e outros modelos em 2013 para 2,53 milhões em março passado, enquanto a transferência do tributo saltou de R$ 521,1 milhões para R$ 986,18 milhões em 2022. Os dados constam de estudo feito pelo economista Gildo Canteli, assessor econômico e financeiro da Prefeitura de Vinhedo.

Com uma população estimada em 3,22 milhões de habitantes na RMC, o aumento da frota faz com que a média seja de 1,27 veículo por morador, superior a média nacional, que é 1,63, e até mesmo do Estado de São Paulo, de 1,41. Na última década, Hortolândia, que completou 32 anos na última sexta-feira, foi o município da Região Metropolitana com o maior aumento no repasse de IPVA, passando de R$ 14,61 milhões para R$ 41,79 milhões, alta de 185,7%.

Com 138.937 veículos emplacados, a cidade tem a 6ª maior frota da RMC, com média de 1,77 veículo/habitante.

A média é superior a registrada da RMC e do Estado, mas a frota de Hortolândia teve alta de 81,78% nos últimos dez anos. A taxa foi superior ao crescimento da população da cidade, que foi de 27,89%, passando de 192,69 mil pessoas em 2013 para 246,45 mil atualmente, de acordo com cálculos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

FONTE DE RECEITA

Para Canteli, a expansão do número de veículos nas cidades ocorreu, principalmente, pelo interesse das prefeituras no repasse de 50% do IPVA. A partir da Constituição de 1988, os municípios passaram a receber metade do valor desse tributo arrecadado no município, que hoje está entre as quatro maiores fontes de receita tributária. Ele divide o ranking com os impostos sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Predial e Territorial Urbano (IPTU).

“A partir de 1996, as prefeituras também passaram a investir na informatização das Ciretrans (Circunscrições Regionais de Trânsito) para agilizar a emissão dos documentos e incentivar os proprietários a manter os veículos na cidade”, disse o assessor econômico. Para ele, isso ajuda a explicar o fato de, proporcionalmente, Campinas ter registrado o menor crescimento na arrecadação com IPVA nos últimos anos na RMC. Entre janeiro e abril deste ano, Hortolândia recebeu R$ 33,3 milhões em repasse desse imposto, alta de 7.387,93% em comparação aos R$ 444,76 mil de todo o ano de 1996.

No mesmo período, o aumento em Campinas foi de 1.084,29%, saltando de R$ 29,25 milhões para R$ 346,62 milhões. A taxa do município foi inferior a média da Região Metropolitana (1.607,29%) e até mesmo do Estado São Paulo (1.132.64%). Nos 645 municípios paulistas, o valor arrecadado com o IPVA passou de R$ 792,48 milhões para R$ 9,77 bilhões. Porém, até mesmo o crescimento de Campinas superou a inflação acumulada de 2016 até o mês passado, que foi de 434,47%, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pelo IBGE.

Vinhedo é a cidade da RMC com a maior média per capta na arrecadação do IPVA, valor que nos primeiros quatro meses de 2023 ficou em R$ 375,99. Holambra aparece na segunda colocação (R$ 363,90) e Valinhos está na terceira posição (R$ 346,66). Para o economista Gildo Canteli, a posição de Vinhedo está relacionada a renda população, que é líder na Região Metropolitana, com o valor médio de R$ 3.750,30, de acordo com o estudo Mapa da Riqueza no Brasil, realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), que leva os dados da declaração do Imposto de Renda Pessoa Física de 2020.

A cifra coloca o município no quarto lugar no Estado e em 11º em todo o País. O IPVA é calculado sobre o valor de mercado do veículo, o que leva em conta o ano de fabricação, potência e nível de equipamentos e acabamento. As alíquotas do imposto para veículos particulares novos e usados são de 4% para carros de passeio; 2% para motocicletas e similares, caminhonetes cabine simples, microônibus, ônibus e maquinário pesado; além de 1,5% para caminhões e 1% para os veículos de locadoras, registrados em São Paulo.

Do valor repassado para o município, 40% são verbas carimbadas, ou seja, têm destino certo. A legislação estabelece que obrigatoriamente 25% são destinados para edução e outros 15% para a saúde, o que garante um caráter social para o tributo e beneficia a população de menor renda.

Taxista Juliano Farias diz que em Campinas não se consegue rodar em muitos pontos no horário de pico (Alessandro Torres)

Taxista Juliano Farias diz que em Campinas não se consegue rodar em muitos pontos no horário de pico (Alessandro Torres)

CONSEQUÊNCIAS

Porém, o aumento da frota também tem seus reflexos negativos. “Em Campinas, não se consegue rodar em muitos pontos no horário de pico. É preciso buscar rotas alternativas”, disse o taxista Juliano Farias, que atua na profissão há 29 anos. Ele aponta entre os locais problemáticos as ruas centrais; a Rodovia Professor Zeferino Vaz (o “Tapetão”), na altura do Vila Nova; a Avenida John Boyd Dunlop; e a Rodovia Jornalista Francisco Aguirre Proença (Campinas-Monte Mor). “O trânsito fica bem enroscado”, afirmou.

A gerente de loja Cristiane Nunes disse que evita dirigir entre 16 e 19 horas pelas ruas da cidade. “Somente saio nesse horário se for realmente necessário”, explicou. Já o autônomo Maurício Carmignotto disse que prioriza andar de motocicleta. “É muito mais eficiente, não fico preso no trânsito”, argumentou. Ele tira o carro da garagem quando tem que carregar pacotes maiores e descarta usar o transporte coletivo. “Perde-se muito tempo esperando ônibus”, justificou.

Para o engenheiro Luiz Vicente Figueira de Mello Filho, especialista em trânsito, “mais carros nas ruas vão na contramão do que deveríamos estar pensando”. Ele considera que o uso maior do transporte individual é uma consequência dos erros no planejamento urbano, de mobilidade e de transporte. Consultor nessa área, ele apontou que a política de ampliar vias públicas e rodovias de acesso às cidades da RMC, principalmente Campinas, “apenas estimula as pessoas a usarem mais o carro e não resolve o problema” dos congestionamentos.

Segundo ele, o ideal seria investir em meios de transporte de massa, como faixas exclusivas para ônibus de grande porte entre as cidades, além de usar outros modais, como o ferroviário e o uso de bicicletas. Para o engenheiro, esses meios deveriam estar integrados para desestimular o uso de carros e motos. Mello Filho diz que, além de problemas para circular, o uso de transporte individual aumenta o número de acidentes de trânsito e a poluição atmosférica pela emissão do monóxido carbono gerado pela queima de derivados de petróleo.

De acordo com o especialista, o atual sistema de transporte coletivo da RMC é precário, o que acaba incentivando os meios individuais. Para a historiadora Maria do Carmo Andrade Gomes, autora do livro “Onibus: Uma história dos Transportes Coletivos”, o desequilíbrio urbano teve início nas décadas de 1950 e 1960, com a chegada dos ônibus a diesel, quando os interesses comerciais e empresariais determinaram o crescimento da cidade.

Segundo ela, na segunda metade de 1950, com o governo de Juscelino Kubitschek, foi feita a opção pelo transporte sob rodas e, desde então, a indústria automobilística passou a ter grande força e peso. “Daí chegamos ao modelo de hoje. As cidades não comportam mais carro e ônibus, um disputa espaço com o outro”, disse a pesquisadora.

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