PANDEMIA

Donos de bares radicalizam e tumultuam o centro da cidade

Categoria trocou o discurso por passeata e fechamento do Terminal Central em dia de confusão

Raquel Valli/ Correio Popular
06/03/2021 às 13:59.
Atualizado em 22/03/2022 às 02:58
Empresários vinculados à Associação de Bares, Restaurantes e Similares de Campinas (Abresc) fecham a Avenida Senador Saraiva durante protesto: categoria pede apoio oficial  (Ricardo Lima/ Correio Popular)

Empresários vinculados à Associação de Bares, Restaurantes e Similares de Campinas (Abresc) fecham a Avenida Senador Saraiva durante protesto: categoria pede apoio oficial (Ricardo Lima/ Correio Popular)

Como evitar a quebra generalizada de bares e restaurantes, que ontem voltaram a protestar em Campinas contra o fechamento dos estabelecimentos na fase vermelha, decretada para evitar a propagação da covid-19 e o consequente colapso na sistema de saúde público e particular? A solução apontada por especialistas ouvidos pelo Correio Popular é unânime: apoio financeiro governamental enquanto durar a crise sanitária, uma vez que o setor não tem como atravessá-la sozinho com os juros que existem no crédito privado, e acelerar a vacinação em massa.

"É necessário que sejam retomados os dispositivos de auxílio criados no ano passado - como o auxílio emergencial e programas de defesa do emprego -, que, diante da gravidade da situação, precisam ainda ser mais abrangentes. E é preciso ter clara a ideia que salvar vidas é a prioridade, e a única forma de retornar a algo próximo do normal", afirma o doutor em economia pela Unicamp, Thiago Dallaverde, professor da Facamp.

O especialista prevê futuro dramático caso as medidas necessárias não sejam tomadas. "Há ausência de estímulos da demanda e de sustentação das condições de oferta, e haverá uma quebra generalizada de empresas do setor, em montante ainda maior do que o verificado até o momento". Por isso, segundo Dallaverde, é fundamental cobrar uma melhor gestão das medidas de enfrentamento da pandemia, com o objetivo de reduzir a transmissão o mais rápido possível. "É necessária uma campanha de vacinação em massa e campanhas que estimulem e subsidiem o uso de máscaras mais eficazes e da forma correta", diz.

Ainda de acordo com o economista, o fato é que, neste momento, pouco pode ser feito pelo setor, isoladamente, a fim de evitar uma piora de sua situação. As empresas, ao longo de todo o ano passado, buscaram alternativas para continuarem atendendo, abriram delivery, diversificaram cardápios, e o setor recebeu muitos novos empreendedores que viram nos serviços uma alternativa de renda, diante do alto desemprego gerado pela crise.

"As alternativas estão exauridas, sobretudo em contexto de ausência do auxílio emergencial e redução da demanda. Ademais, a inflação de alimentos e a desvalorização cambial exerceram uma pressão de custos no setor, impossível de não ser repassada ao consumidor final", declara.

O mestre e doutor em economia pela Unicamp, Izaias de Carvalho Borges, diretor da Faculdade de Ciências Econômicas da PUC-Campinas, concorda com Dallaverde. "Em um contexto como este, que você precisa fechar os estabelecimentos, há um problema de falta de receita porque há custos fixos, além de dívidas acumuladas. E o que o governo deve fazer é uma política emergencial muito parecida, por exemplo, com o auxilo oferececido às famílias".

Borges lembra que a situação só chegou a esse ponto porque, desde o início, as medidas de isolamento social e as negociações de vacinas não foram levadas a sério. "Essas são a única forma definitiva de resolver o problema", pontua. Quanto à ajuda governamental necessária agora, defende que, caso ela não seja tomada, haverá mais um outro problema a médio prazo: um boom inflacionário gerado pelo aumento da demanda, que aparecerá quando a pandemia passar. Isso porque haverá mais demanda dos serviços oferecidos por bares e restaurantes do que o que o setor conseguirá ofertar. E quando há mais gente procurando por um serviço escasso, o preço desse serviço simplesmente sobe - seguindo premissas econômicas.

Mais protestos

Ontem, a Associação de Bares, Restaurantes e Similares de Campinas (Abresc) voltou a protestar contra o fechamento dos respectivos estabelecimentos. Reivindicou linhas de créditos governamentais para pequenas e médias empresas; isenção de pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e de demais taxas municipais; proibição de corte de serviços essenciais, como água e energia elétrica; e a devolução imediata, por parte do governo estadual, de 200 leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

"Não temos mais condições de nos mantermos em pé. Não recebemos incentivos e não conseguimos mais pagar contas básicas. Se o governo quer que façamos a nossa parte, ele precisa fazer a dele", afirma o presidente da Abresc, Wendel Alves da Silva. "Campinas é a segunda maior arrecadação de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do Estado de São Paulo, e as pessoas lamentam o fechamento da Ford no Brasil. Mas, só aqui em Campinas já demitimos de três a quatro fords".

Ainda de acordo com Silva, a entidade tem ciência de que a doença é grave, mas não credita a explosão de transmissão do vírus à abertura dos estabelecimentos. "Obedecemos todos os protocolos sanitários. Qualquer fiscal pode nos vistoriar, ao contrário de festas e aglomerações clandestinas. Eles cortaram a nossa coberta, mas os ônibus continuam circulando lotados. Temos funcionários antigos, bem treinados, que não estão conseguindo emprego em lugar nenhum", lamenta.

O outro lado

A reportagem entrou em contato com a Prefeitura de Campinas e com o Governo do Estado de São Paulo para ouví-los a respeito das demandas da Abresc e das considerações feitas pelos economistas. Mas, até o fechamento desta edição, não obteve resposta.

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