Corregedoria da Câmara avalia o documento para decidir sobre a viabilidade de instalação de processo de cassação contra o vereador
Imóvel ocupado na Rua Delfino Cintra, no bairro Botafogo, em Campinas, pelo Movimento de Mulheres Olga Benário para servir de atendimento a mulheres vítimas de violência (Rodrigo Zanotto)
A Câmara de Campinas recebeu no início da tarde de terça-feira (9) um pedido para a abertura de uma Comissão Processante (CP) contra o vereador Paulo Bufalo (PSOL). O pedido foi protocolado por Álvaro César Iglesias. O objetivo, segundo Iglesias, é apurar a conduta de Bufalo no caso da invasão do imóvel de sua propriedade, que fica na Rua Delfino Cintra, no bairro Botafogo, em Campinas. O prédio foi ocupado recentemente pelo Movimento de Mulheres Olga Benário, que pretende utilizar o espaço para acolher mulheres vítimas de violência.
O documento passará por análise técnica da Câmara. Caso os requisitos para pedir uma CP tenham sido cumpridos, o documento será lido no plenário na próxima reunião ordinária, o que pode acontecer nesta quarta-feira (10), a partir das 18h. A Comissão Processante pode indicar apenas dois procedimentos que seriam a aprovação da cassação ou a rejeição ao pedido. A CP é instaurada se houver maioria simples entre os parlamentares presentes na votação.
No pedido, o proprietário diz que o imóvel é destinado à renda e está bem localizado, porém, pontua que a locação tem sido dificultada pela crise econômica que foi agravada pela pandemia de covid-19. O documento afirma que as medidas judiciais foram tomadas, mas que o vereador Paulo Bufalo tem incentivado a ocupação do que ele nomeia como "baderneiros invasores". Álvaro César Iglesias defende que Bufalo cometeu ato de improbidade e que as ações do parlamentar afetam o Legislativo como um todo. No documento, Iglesias alega que enquanto ocorria a tentativa de retirada amigável dos ocupantes, houve a surpresa da presença do vereador “que, utilizando carro oficial dessa Câmara, trazia mais pessoas para a ocupação”.
A afirmação foi rebatida por Bufalo. O vereador explicou que membros da ocupação participariam de uma agenda na Câmara, onde entregariam um documento para que o presidente da Casa, os demais parlamentares e o prefeito (Dário Saadi - Republicanos) tomassem conhecimento do que estava havendo e quais eram as reivindicações. O vereador do PSOL afirmou que ficou esperando a Polícia Militar chegar ao local, após a confusão com o filho do proprietário, o empresário Álvaro César de Camargo Andrade Iglesias, e que as integrantes da ocupação foram à Câmara de outra maneira para não perderem a oportunidade de registrar o documento no Legislativo, enquanto ele aguardava a chegada da PM.
"Há uma distorção dos fatos. Eu não cometi qualquer crime ou quebra de decoro. Saí em pleno exercício do meu mandato para poder fazer uma proteção a um movimento popular que está em uma luta por uma política pública. Fui confrontado por uma pessoa que sequer se identificou e, de forma muito agressiva, e sem autorização, fez filmagens do veículo oficial e tentou filmar lideranças do movimento - que viriam à Câmara Municipal dialogar com a presidência."
Bufalo ainda citou que a ocupação foi alvo de ameaças do empresário e que as as lideranças e ele próprio passaram a receber mensagens com ameaças desde que as imagens foram divulgadas nas redes sociais. Ainda, ele diz que a ocupação passou a observar uma maior circulação de carros com motoristas que buzinam, gritam e fazem acusações contra o movimento.
"A única ação que eu tive foi de proteção das imagens, porque uma coisa sou eu, enquanto figura pública, ter a imagem tomada por ele para depois fazer o que fizeram, uma tentativa de linchamento nas redes sociais. Outra coisa são as militantes que estão no movimento com uma pauta muito precisa - e essa atitude coloca essas pessoas em risco", acrescentou Bufalo, lembrando que o objetivo alardeado pela ocupação é o de justamente oferecer acolhimento às mulheres vítimas de violência.
O vereador do PSOL lembrou que frequenta outras ocupações em Campinas nas quais as pessoas reivindicam escolas, rede de esgoto, água e saúde pública. Sobre a Ocupação de Mulheres Maria Lúcia Petit Vive, do Movimento de Mulheres Olga Benário, Bufalo afirmou que a questão central da discussão é justamente a luta dessas mulheres e reafirmou que o movimento, que não é vinculado ao PSOL, continua sendo legítimo e tendo o seu apoio.
Sobre o que espera em uma possível votação para a abertura de uma Comissão Processante, Bufalo disse que a repercussão em nível nacional, inclusive com figuras públicas tecendo comentários e influenciadores de direita se deslocando até Campinas, mostra que há uma polarização com a extremadireita, mas que a Casa precisa ter equilíbrio na discussão política e que acredita que os demais vereadores têm a capacidade de realizar essa leitura. "O que eu espero é equilíbrio, que os vereadores possam ler, avaliar os fatos e tomar essa decisão de forma consciente."
A Câmara de Campinas confirmou, em nota, o pedido de instauração da Comissão Processante e de outras duas ações paralelas, recebidas pela Corregedoria do Legislativo, que também buscam apurar eventual cometimento de infração de Bufalo.
"A denúncia, assinada por Álvaro César Iglesias, foi encaminhada à Procuradoria da Casa para averiguar se a solicitação atende os requisitos legais necessários do decreto lei número 201/67 para a admissibilidade do processo. Se tiver o aval da Procuradoria, a denúncia será lida e apreciada em plenário por parte dos vereadores na primeira reunião ordinária subsequente à apresentação do protocolo. Para ser efetivamente instaurada, é necessária a concordância por maioria simples dos parlamentares presentes no plenário. Se for recebida, a Comissão Processante será constituída por três vereadores definidos por sorteio. Caso contrário, será arquivada. Paralelamente ao pedido de CP, a Corregedoria da Câmara informa que recebeu uma representação formalizada pelo vereador Nelson Hossri para averiguar os fatos. Também foi encaminhada uma representação à Corregedoria assinada por José Ferreira Campos Filho para apurar eventual desvio de conduta do parlamentar."
Álvaro César Iglesias protocola na Câmara o pedido de abertura de Comissão Processante contra Bufalo (Rodrigo Zanotto)
O imóvel foi ocupado recentemente pelo Movimento de Mulheres Olga Benário, que pretende usar o espaço para acolher mulheres vítimas de violência. Representantes do movimento alegam que a casa estava abandonada há quase 10 anos, com portas e janelas quebradas, por isso, realizaram limpeza e reparos no prédio. Após ser alertado por vizinhos sobre a ocupação, o filho do proprietário foi até o local e acionou a Polícia Militar. Lá ele disse ter encontrado o vereador Paulo Búfalo (PSOL), que apoiava o movimento, usando o carro oficial da Câmara de Campinas. Os dois começaram a discutir. O empresário afirmou em um vídeo, publicado nas redes sociais, que o imóvel está desocupado devido à crise financeira causada pela pandemia, mas os impostos municipais estão pagos e a documentação regularizada.
A primeira confusão aconteceu na quarta-feira, justamente entre o empresário Álvaro César de Camargo Andrade Iglesias e Paulo Bufalo. Iglesias disse que tomou conhecimento da ocupação na quartafeira, dia 3. "Os vizinhos do imóvel me avisaram que ele havia sido invadido. Fui até o local e conversei com dois invasores, um dos quais se identificou como Cadu. Avisei que se tratava de propriedade privada e pedi que se retirassem. Disseram que não iriam desocupar e, então, acionei a PM", explicou.
Bufalo disse que foi abordado por Iglesias que pediu para que ele se identificasse, dizendo que não o conhecia. "O alertei que ele me devia respeito e que poderia estar incorrendo em desacato de autoridade - e mesmo assim ele continuou com xingamentos".
Na sexta-feira, uma nova polêmica no local, desta vez com a aparição do ex-deputado estadual Arthur do Val, também conhecido pela alcunha de “Mamãe, Falei". Ele apareceu de surpresa na Ocupação de Mulheres e causou uma confusão envolvendo também militantes do MBL, integrantes da ocupação e vereadores da Câmara Municipal. A Polícia Militar precisou ser acionada para conter os ânimos e os dois lados informaram que registraram boletim de ocorrência por ameaça.