Até mesmo as estações abandonadas do extinto VLT (Veículo Leve sobre os Trilhos) estão servindo de abrigo para essas famílias
Com medo de perderem pertences que ficaram na área da ocupação, algumas famílias passaram a noite nas ruas do entorno e ontem voltaram para recolher os seus móveis (Patrícia Domingos/AAN)
As mais de 440 famílias que viviam na ocupação Nelson Mandela, no Jardim Capivari, em Campinas, estão migrando para outros movimentos sociais, como a ocupação Joana D’Arc, no bairro Cidade Jardim, também em Campinas, e para a Vila Soma, e Sumaré. Até mesmo as estações abandonadas do extinto VLT (Veículo Leve sobre os Trilhos) estão servindo de abrigo para essas famílias. O clima de indefinição após a reintegração de posse cumprida pela Polícia Militar (PM) na terça-feira pela manhã, fez com que muita gente continuasse na área por falta de local para levar seus pertences. Muitos dormiram em ruas próximas ao Mandela na noite posterior à reintegração. Segundo o movimento, cerca de 100 pessoas da ocupação ainda não têm um local para ficar — 40 delas, principalmente crianças e mães, foram abrigadas provisoriamente na Paróquia Santa Luzia e na tarde desta quarta-feira ainda estava com os colchões espalhados pelo chão da igreja. Ítalo Reis, de 20 anos, morador do Mandela há alguns meses, estava com a filha Hilary, de 1 ano, aguardando a esposa recuperar algum pertence no local onde estava o barraco do casal. “Perdemos roupinha dela, e muitos outros pertences. Até meu celular perdi na correria, e sem avisar o patrão devo estar desempregado nesse momento. Não tenho como deixar minha esposa e minha filha aqui, sem nada”, lamentou. “Ainda não decidimos para onde vamos, mas talvez para a casa de algum conhecido no Campo Belo.” Muitas famílias improvisaram barracas com os próprios móveis que sobraram da retirada. É o caso da família de Valdir Castro da Silva, de 31 anos. “Devemos nos juntar ao pessoal do Joana D’Arc, mas ainda estamos definindo”, disse. “Disseram que o proprietário do terreno iria alugar contêineres, mas ao invés disso mandaram uma banana para os moradores, como a Prefeitura.” Samuel Amorim, de 34 anos, morava com a esposa e três filhos há aproximadamente dez meses no Mandela. Samuel carregava o pequeno Luis Miguel, de 5 meses, e olhava para ao longe, onde seu barraco ficava, debaixo de uma árvore. “Com a rescisão do último emprego, comprei o material e construí um barraco de três cômodos. Não sobrou nem as roupas das crianças com o fogo que se alastrou pelos barracos”, relatou. A Samuel e a esposa Luana já levaram os poucos pertences para a ocupação Joana D’Arc, e pretendem recomeçar a vida. “Foi a alternativa que nos restou. Não tivemos qualquer auxílio por parte dos governos”, disse. SAIBA MAIS A Ocupação Nelson Mandela teve início há oito meses e chegou a reunir 600 famílias em uma área pertencente à Cerâmica Argitel, no Jardim Capivari. A empresa obteve reintegração de posse na Justiça, que foi cumprida nesta terça-feira pela PM. Foram mobilizados 400 soldados para a retirada dos ocupantes e houve resistência de manifestantes munidos de paus e pedras. A polícia respondeu com bombas de efeito moral. Apesar do confronto, a PM fez a retirada. Prefeitura disponibilizou vagas em abrigos municipais A Prefeitura de Campinas informou que na manhã desta quarta-feira alguns funcionários estiveram na área desocupada pela Polícia Militar para finalizar a operação. Segundo o secretário de Relações Institucionais, Wanderley de Almeida, algumas famílias ficaram com medo de perder os pertences que ainda estavam no local, e acabaram passando a noite na área. “Algumas famílias permaneceram para pegar as próprias coisas e nesta quarta-feira estivemos lá para dar apoio às famílias, porque não conseguimos concluir a remoção das coisas (na terça)”, disse. Segundo o secretário, 11 pessoas que não tinham para onde ir foram encaminhadas para um abrigo municipal e dormiram no local. No final da operação, a PM teria solicitado mais 30 vagas nos abrigos e a Prefeitura informou que foram disponibilizadas, mas que as pessoas desistiram. O secretário não soube informar se as pessoas passaram o dia no abrigo, mas garantiu que o espaço está disponível. Assistentes sociais da Prefeitura e também da Cohab, estiveram no local para orientar as famílias. Questionado sobre a possibilidade de levar todas as famílias para um mesmo lugar, mais uma vez Almeida reforçou o que tinha dito no dia reintegração. Segundo a pasta, a Prefeitura não tem condições de retirar todas as famílias e colocar em um ginásio, como havia sido solicitado por uma comissão de parlamentares que presta apoio aos ocupantes. Ainda segundo o secretário, o próximo passo para resolver a situação é fazer um trabalho de triagem entre as famílias, para saber quais e quantas se enquadram nos projetos habitacionais. Ainda de acordo com Almeida, para as famílias conseguirem ingressar em algum dos programas é preciso que estejam dentro das normas de cada projeto.