Número de vítimas supera o de explosão de aeronave em Viracopos em 1961
(Divulgação)
Um avião com 61 pessoas, sendo 57 passageiros e quatro tripulantes, caiu por volta das 13h30 de ontem, dia 9, dentro de um condomínio residencial localizado na região da Capela, em Vinhedo. Não houve nenhum sobrevivente. Trata-se do pior acidente aéreo da história registrado na Região Metropolitana de Campinas (RMC) e o quinto maior do Brasil em número de mortos.
A aeronave, turboélice modelo ATR-72, fazia o trajeto entre os aeroportos Regional do Oeste do Paraná, em Cascavel (PR), e Internacional de Guarulhos (SP), na Grande São Paulo. A companhia aérea responsável é a Voepass Linhas Aéreas, antes conhecida como Passaredo. Dos passageiros, 30 eram homens e 27 eram mulheres. Segundo dados do Registro Aeronáutico Brasileiro (RAB) da Agência Nacional de Avião Civil (Anac), a licença atual para voo do avião era válida até junho de 2026.
O local da queda da aeronave era o quintal de uma casa, no Residencial Recanto Florido. Testemunhas ouvidas pelo Correio Popular contaram que a aeronave perdeu altitude rapidamente, começou a rodopiar e explodiu na sequência ao atingir o solo. Nenhum morador do condomínio se feriu, mas ficaram desesperados.
Os corpos das vítimas serão levados para a unidade do Instituto Médico Legal (IML) de São Paulo, para os processos de identificação. A investigação das causas do acidente será feita em várias frentes, uma pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), da Força Aérea Brasileira (FAB), outra pela Polícia Federal e uma terceira pela Polícia Civil de São Paulo.
MOBILIZAÇÃO
Agentes da Guarda Municipal de Vinhedo e da Polícia Militar de São Paulo fecharam os acessos ao condomínio, que ficaram abertos apenas para os envolvidos no resgate de eventuais sobreviventes, do combate ao incêndio gerado pela explosão da aeronave e moradores do residencial. No entanto, houve a recomendação para que eles se deslocassem para fora do local somente em casos urgentes.
Os prefeitos de Vinhedo, Dario Pacheco (PSD) e Campinas, Dário Saadi (Republicanos), o comandante-geral da PM-SP, coronel Cássio Araujo de Freitas, o secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo, Guilherme Derrite, os governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e do Paraná, Ratinho Junior (PSD), e o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, falaram com os jornalistas que acompanharam os trabalhos de resgate durante a tarde e o início da noite de sexta-feira. Foi decretado luto oficial de três dias pelos governos federal e estaduais de São Paulo e do Paraná.
TRAGÉDIA
Moradora do Residencial Recanto Florido há 15 anos, Ana Lúcia de Lima contou que viu o avião caindo. Imediatamente, ela pensou que isso já poderia ter acontecido antes, pois mora em uma região que faz rota para o Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas. “Parecia que o avião estava caindo em cima da minha casa. A primeira explosão foi forte, com muita fumaça. A primeira coisa que fiz foi ligar para o meu esposo. Nunca vi isso na minha vida, meu sentimento foi de desespero”, disse.
O adolescente Pietro Orszezaruk, de 14 anos, mora no condomínio com a família. Ele contou que estava dormindo instantes antes do acidente e acordou com um “barulho muito alto”. “Vi o avião passar logo acima da minha casa. Depois fui correndo para ver como estava a situação, se tinham muitos feridos, mas não me deixaram entrar no lugar.”
No começo da noite, o dono da propriedade atingida pelo avião, Luiz Augusto Oliveira, falou com os jornalistas que estavam na entrada principal do condomínio, na Rua José de Rezende Meirelles. “Achamos que era um helicóptero, em um primeiro momento, que tinha caído, mas, apesar do que houve, considerando quem estava nesse avião, agradeço a Deus que eu e minha família não ficamos feridos”, desabafou.
AUTORIDADES
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, afirmou que é necessário entender o que aconteceu. Ele destacou que as duas caixas-pretas da aeronave foram resgatadas e serão utilizadas nas investigações pelas autoridades competentes. “O cenário é de muita tristeza. Você vê uma aeronave destruída e fica imaginando um pouco o que aquelas pessoas passaram nos momentos que antecederam a queda”, lamentou.
O governador do Paraná, Ratinho Junior, comentou sobre as primeiras ações em prol das famílias das vítimas. “Nós disponibilizamos, por meio da Secretaria de Saúde do Paraná, uma equipe de psicólogos. Eles foram imediatamente para o aeroporto de Cascavel, onde as famílias já estavam chegando quando a notícia começou a ser divulgada. Começamos a coletar sangue dos familiares para ajudar no trabalho de identificação das vítimas.”
Por fim, o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, informou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) determinou que todo o apoio necessário seja disponibilizado. “A Anac já identificou que todos os tripulantes estavam regulares, o avião também. É importante destacar, até para evitar notícias falsas em torno do tema, que até o momento não foi identificado nenhum contato dos pilotos da aeronave com as torres de controle.”
Considerando os demais acidentes aéreos registrados em todo o Brasil, a queda do avião em Vinhedo teve menos mortos que apenas outras quatro tragédias. A pior delas aconteceu em 17 de julho de 2007. Um avião da TAM, um Airbus A320, colidiu com um prédio da empresa depois de um pouso malsucedido no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo. 199 pessoas morreram, 187 pessoas a bordo e 12 em terra. O trágico acidente aéreo de ontem não é o primeiro registrado na região de Campinas, mas superou o que era até então a pior tragédia da história: o desastre de 1961, que fez 52 vítimas fatais na explosão da aeronave da Aerolíneas Argentinas. Em 23 de novembro daquele ano, um jato Comet 4 de prefixo LVAHR, com destino aos Estados Unidos, caiu logo após decolar do Aeroporto Internacional de Viracopos, onde fez uma parada técnica. Ele transportava 12 tripulantes e 40 passageiros, três deles embarcados na cidade. A aeronave perdeu altitude rapidamente e atingiu o solo a 330 metros do ponto do primeiro impacto nas árvores. Nesse momento se chocou contra obstáculos terrestres e explodiu. Alguns destroços foram encontrados a 120 metros do ponto do contato com o solo e não mos traram sinais de fogo, evidenciando a intensidade da explosão.
A aeronave envolvida era um de Havilland Comet IV, um jato dotado de quatro reatores embutidos nas asas. O equipamento tinha capacidade máxima de 81 ocupantes e estava registrado pela Aerolíneas Argentinas com o prefixo LV-AHR e tinha sido batizada com a denominação "Arco-íris".
A aeronave em questão havia feito seu primeiro voo em 1960, apresentando um total de 5.242 horas de voo na ocasião do acidente. Devido a questões relacionadas à sua autonomia, essa aeronave tinha que fazer constantes paradas para reabastecimento. Assim, o voo realizado entre Buenos Aires e Nova Iorque incluía escalas técnicas em Campinas e na ilha caribenha de Trinidad. A tripulação do voo 322 era composta por 12 pessoas, comandadas pelo piloto Roberto Luis Mosca. O co-piloto era Raul Mário Quesada.
A aeronave que vinha de Buenos Aires fez uma breve escala em Campinas, de onde seguiria para Trinidad e Nova Iorque no voo designado sob o código AR322. Ainda era madrugada na cidade de Campinas quando a aeronave acionou seus motores com objetivo de partir rumo ao seu próximo destino. No procedimento de decolagem, a aeronave ficou descontrolada, perdendo altitude até atingir um eucaliptal situado a 500 metros da cabeceira da pista, que naquela época consistia em parte da zona rural do município de Campinas, mais precisamente em uma localidade fundada por descendentes de alemães, denominada Friburgo.
Com o impacto, o avião abriu uma clareira de 400 metros de extensão entre as árvores e foi se despedaçando até bater contra uma pequena colina. A explosão oriunda do impacto causou a morte de todos os 52 ocupantes, incluindo tripulação e passageiros.
O incêndio decorrente da colisão da aeronave com as árvores foi tão intenso que durante horas as equipes de socorro não conseguiram se aproximar do local do acidente. No local o cenário era catastrófico. Corpos mutilados estavam espalhados por toda a região. O maior pedaço remanescente da aeronave foi a carenagem de um de seus motores.
Imprensa internacional repercute maior acidente aéreo na história da RMC
Jornais e outros veículos da imprensa internacional destacaram a queda do avião que matou 62 pessoas em Vinhedo, interior de São Paulo. Os veículos de mídia dos EUA, Reino Unido e Argentina, para citar alguns exemplos, compartilharam os vídeos difundidos nas redes sociais que mostram o momento exato da queda da aeronave. O avião havia partido de Cascavel, no Paraná, com destino ao Aeroporto Internacional de Guarulhos.
O The Washington Post destacou a queda com uma tarja de "Breaking News" em sua página inicial. "Em uma aparição pública na sexta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu um minuto de silêncio, dizendo que era portador de ‘uma notícia muito ruim’", escreveu.
O jornal britânico The Guardian reportou a tragédia na manchete de sua versão internacional do site e mencionou os vídeos compartilhados nas redes sociais mostrando a queda do avião. "Detritos em chamas e pelo menos um corpo podiam ser vistos espalhados pelos jardins de uma área residencial, enquanto veículos de emergência chegavam."
O francês Le Figaro deu espaço para a queda logo abaixo das principais notícias da Olimpíada. "Imagens divulgadas pela mídia local mostraram o avião caindo em alta velocidade, e outras mostraram uma longa coluna de fumaça subindo acima do que parecia ser uma área residencial", escreveu antes de apresenta relatos de moradores de Vinhedo coletados pela imprensa brasileira.
O argentino La Nación chamou a notícia logo ao lado da manchete sobre o escândalo de violência doméstica envolvendo o ex-presidente Alberto Fernández. O jornal escutou especialistas em aviação brasileiros sobre hipóteses para a queda. Já o concorrente Clarín ilustrou o modelo e informações do avião da Voepass envolvido na tragédia.
O jornal americano The New York Times mencionou que a TV Globo interrompeu a transmissão dos Jogos Olímpicos para mostrar as imagens dos bombeiros contendo as chamas nos destroços da aeronave. BBC, Dw News, ABC News, CNN Fox News, Wall Street Journal e Al Jazeera também deram destaque à tragédia com envio de notificações às suas audiências.
Siga o perfil do Correio Popular no Instagram